quarta-feira, 4 de março de 2009

DIA INTERNACIONAL DA MULHER I


Hoje é moleza ser feminista, segurar o mastro da bandeira nas passeatas com algumas reivindicações justas e legítimas, como o direito amplo e irrestrito ao orgasmo contínuo e múltiplo; algumas reivindicam demandas infundadas e absurdas, como a divisão das tarefas domésticas com os homens. Outras bandeiras denotam certo desprezo pela Criação e desfraldam um radicalismo exacerbado, lembrando os antigos camaradas xiitas do PT, na tentativa de moldar o mundo segundo suas convicções político-dogmáticas: simplesmente querem inverter a posição na cama, e o ativo passa a ser o passivo, seguindo o princípio oracional de São Francisco: é melhor dar do que receber.


Devagar com o andor que o santo é de barro. Voltando aos tempos do poder patriarcal dos senhores de engenho ou dos barões do café, as ditas feministas de hoje vacilariam frente a esses senhores que dominavam a economia, a política, a cultura, a vida e a alma dos brasileiros e que se casavam apenas para ter uma mulher para dar porrada, fazer filhos e tomar conta das mucamas. Eles podiam tudo, inclusive estuprar e matar as metidas a feministas.


Em 1789, tomada pelos ventos libertários, a Assembléia Nacional francesa aprovou a Declaração dos Direitos do Homem. Em 1791, embalada pelo lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” cravado na bandeira do ideário revolucionário, a escritora francesa Marie Olympe Gouze (Olympe de Gouges) lançou também o seu manifesto “Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã”. Pegos de calças-curtas, os nobres revolucionários acharam tal manifesto uma afronta à moral e aos bons costumes. Que significava aquilo? Revolução das calcinhas dentro da grande revolução dos cuecões? Lugar de mulher era na cozinha e assim deveria continuar. Quem lavaria a louça? Quem trataria do javali antes de ir à panela?


Olympe de Gourges, a primeira feminista da história, foi a julgamento em um tribunal predominantemente machista. O circo estava armado e ela foi condenada à pena capital, sob a acusação de “ter querido ser um homem de Estado e ter esquecido as virtudes próprias do seu sexo.” Foi guilhotinada em 1793 sem que nenhuma outra mulher tenha saído em sua defesa.


Desta maneira, ó simpáticas feministas burocráticas enclausuradas em amplas salas refrigeradas deste imenso gigante adormecido, dêem-me notícias das 129 tecelãs de Nova Iorque, vítimas da arrogância e da prepotência do poder econômico! Vós, que colocais o termostato do condicionador de ar no máximo para poder vestir o casaco de vison, talvez não saibais que o 8 de março não foi escolhido aleatoriamente para ser o dia internacional da mulher, apesar de que, neste solo pátrio, todo dia é dia de luta da mulher para ocupar um lugar ao sol. Saibam, ilustres senhoras, que esta data foi escrita com sangue e fogo.


No dia 8 de março de 1857, 129 tecelãs em Nova Iorque se cansaram da exploração patronal e se uniram em um movimento reivindicatório, exigindo redução da jornada diária do trabalho, de 16, para 10 horas. Além de trabalharem mais, ganhavam apenas quarenta por cento do salário dos homens. Quando chegavam a casa, exaustas, encontravam uma pilha de pratos a serem lavados, comida a ser feita, filho para amamentar e beira do rio para lavar roupa, pois lavanderia era coisa a ser inventada. Não era justo tamanha exploração. Cruzaram os braços e saíram à rua a fazer barulho, sendo que encontraram uma forte e violenta repressão policial. Voltaram à fábrica achando ser um abrigo seguro. Os patrões e a polícia trancaram as portas e atearam fogo na fábrica, matando-as na imensa fogueira formada.


Em 1910, na II Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, realizada na Dinamarca, a alemã Clara Zetkin propôs o dia oito de março como o dia Internacional da Mulher, em homenagem àquelas 129 mártires de Nova Iorque. A proposta foi aceita e nesse dia as mulheres do mundo todo se dão as mãos em busca de fortificar o movimento feminista, propondo o fim da hegemonia político-econômico-administrativa masculina, seguindo o lema dos compositores mineiros Beto Guedes e Ronaldo Bastos quando dizem “Vamos precisar de todo mundo / um mais um é sempre mais que dois”, se bem que esses versos foram escritos bem depois, o que não invalida o grito de guerra “Mulheres / unidas / jamais serão vencidas!” que encerrou a II Conferência na Dinamarca.


Proposições justas, por sinal, porém o movimento reivindicatório esbarra na própria instabilidade da vaidade feminina quando passa batom nos lábios frente a um espelho, no dia seguinte, e nos 364 que se sucedem até o próximo 8 de março; elas (as feministas e não as mulheres em si) são incapazes de se olhar fraternalmente como companheiras de luta e seguir um propósito comum; em vez disso, engalfinham-se feito onças-de-unhas-pintadas disputando um território selvagem, inaptas em abraçar a causa libertária e tornar suas reivindicações numa bandeira ideológica permanente.


Fala mais alto a vaidade histórica e cada uma mira-se no espelho com a desconfiança aguda de quem encara uma rival.






Nenhum comentário: