sábado, 7 de maio de 2011

O Desmamado



Conta o anedotário que dentro do ônibus a mãe olhava distraída pela janela enquanto dava mamar ao filho. De repente notou a insistência do olhar de um passageiro, em pé, ao seu lado. Perguntou bruscamente:

– O que foi? Nunca viu uma criança mamar?
– Desculpe, dona, não é por maldade não. É que minha mãe morreu quando eu nasci e toda vez que vejo uma criança mamando fico morrendo de inveja, pois nunca tive o prazer de mamar.

Diante de tão comovente explicação, a mãe aquiesceu. Amoleceu o coração. Tornou-se solidária:

– Olha, vou lhe dar meu endereço e amanhã o senhor passa lá em casa que deixo o senhor mamar um pouquinho pra sentir o gosto, tá certo?

Que coração! Quem, senão uma mãe, para ter tanta bondade?! No outro dia o desmamado chegou cedo. A mãe o mandou entrar e sentar-se no sofá. Ela se aconchegou ao seu lado, suspendeu a blusa e lhe deu o peito cheio de leite. Era uma boa vaca leiteira, como se dizia na minha terra quando a mãe tinha muito leite.

Após dois minutos de mamação, ela começou a se excitar. Com a respiração ofegante, gemeu em sussurros:

– Tem certeza de que não quer mais nada? Se quiser, pode pedir!
– Posso, moça?
– Claro que pode! Qualquer coisa... Qualquer coisa meeesssmo!

Ele pensou, pensou... respirou fundo, criou coragem e pediu:

– A senhora tem aí um biscoitinho Cream Cracker?



sexta-feira, 6 de maio de 2011

Luís Pimentel - Dia das Mães

No ano retrasado ele veio, ano passado não. Este ano, só Deus sabe se vem. Pensam que fico esperando? Espero que nem aquela porta espera, aquela mesa espera, aquela planta ali. Não faz nenhuma diferença ele vir ou não vir, com as tolas recomendações de sempre, as mesmas e falsas preocupações.
Teve um ano que trouxe o filho. E o filho veio com a namorada. Dois jovens abobalhados, olhando para as paredes descascadas com curiosidade mórbida, me encarando com nojo e repulsa. Não aceitaram a água nem o guaraná que ofereci, com certeza por acharem que os copos não são lavados. Meu filho ainda aceitou a cerveja, talvez por saber que o álcool desinfeta tudo.

A mulher não vem nunca com ele. Nenhuma falta me faz. Fico dispensada dos salamaleques, de fingir naturalidade, falando de doenças ou de novelas. Tão bem criado, tão mal casado. A última vez que ela apareceu aqui, veio direto do salão de beleza e manteve os dedos esticados, durante os minutos que durou a visita de médico, para não encostar a unha em nada. Meu filho mostrou o quarto onde vivia quando rapaz solteiro. Ela riu, cínica e sonsa. “Como é que alguém pode viver num buraco desses?”, devia estar pensando.

Barulho no portão, só pode ser ele. Lá vêm flores murchas, presente ordinário, casaco de lã ou meias de nylon, garrafa de vinho de padaria, adocicado e enjoativo, pacotinho de torradas que eu não comia nem no tempo que tinha dentes. Vai se sentar no sofá que está forrado desde cedo e estirar as pernas no banquinho que só sai do quarto quando ele vem aqui. Claro que não vai demorar, pois tem compromisso com o filho ou com a mulher. Pouco se me dá que venha ou não venha, fique ou não fique.

Não era ele no portão. Apenas um vendedor de frutas. Pela hora, duvido que ainda apareça aqui. Melhor dobrar e guardar o lençol novo que coloquei no sofá, não quero que pegue poeira. Melhor devolver para o quarto o banquinho de estirar as pernas. Ano que vem pode precisar.






quarta-feira, 4 de maio de 2011

Cineas Santos - Ecos do Sertão

Faz um tempinho que, por minha conta e risco, venho tentando construir uma ponte cultural entre Teresina e o sertão do Piauí. Foi assim que nasceu o projeto A Cara Alegre do Piauí, em 1977. É ocioso dizer que os resultados alcançados ficaram muito aquém das expectativas. Nada de extraordinário: os sonhos voam; as pernas, quando muito, correm... O certo é, ao longo desses anos, nunca me passou pela cabeça a ideia de desistir da construção do necessário diálogo entre a capital e o interior.

         Agora mesmo, estou chegando do sertão - Canto do Buriti, São Raimundo, Anísio de Abreu e São João do Piauí - com a alegria de quem acredita no que faz. Posso lhes assegurar que, a despeito das dificuldades de toda ordem, há uma enorme efervescência cultural no interior do Piauí. Os pontos de cultura, presentes em toda parte, são pequenas usinas de beleza. Agregam jovens e adultos e evidenciam a importância da cultura como instrumento de resgate da cidadania e elevação da autoestima do povo.

         Das iniciativas culturais que vi, uma me deixou muito entusiasmado e feliz: trata-se do projeto EnCantadores  do Sertão,coordenado pelo prof. Gonçalo Carvalho Filho, em São João do Piauí. Como coordenador da Universidade Aberta do Brasil, Gonçalo resolveu envolver os alunos num projeto de grande alcance pedagógico e social. Em vez de teorias inócuas, experiências vivenciadas. O resultado não poderia ter sido mais feliz. Com poucos recursos, mas com enorme capacidade de trabalho, o grupo vem resgatando práticas culturais prestes a desaparecer. O projeto conta com o apoio da Associação Cidadania Verde, da Rádio e Portal São-joanense. Pelo menos uma vez por mês, o grupo se reúne na casa de um dos artistas da terra e realiza uma espécie de sarau onde cada um mostra o que pode e sabe fazer. Desses encontros, nasceram o CD do mestre Julimar do Pife e o DVD  Batuque do Brás. Trata-se de trabalhos artesanais, de aparência pobre, mas extremamente valiosos por contribuir para manter vivas tradições seculares. Dona Conceição Viana, de 77 anos de idade, traduz o sentimento dos batuqueiros: “A gente nasceu e se criou brincando com o Brás, a gente se considera uma grande família. O batuque do Brás nunca vai acabar porque nós somos muitos. Eu vou embora daqui a uns dias, mas têm os outros aí, os netos, os bisnetos, os tataranetos dele. Se ele fosse vivo,ficaria muito orgulhoso por estarmos dando continuidade ao trabalho dele”.

         Para quem acredita no poder restaurador da cultura, é gratificante ver o brilho nos olhos de figuras do naipe de Jonas, Dió, Dedício, Miltinho, Quibobô, Seu Berto , Xubéu e tantos outros. Gente simples que, com engenho e arte, faz jus ao título de encantadores do sertão. Longa vida a esse projeto luminoso.
        

terça-feira, 3 de maio de 2011

Conversa ao pé do rádio



Dois pintores de parede trabalham no hall do prédio ouvindo um radinho de pilha debaixo da escada. De repente o locutor interrompe a música technobrega para esbravejar contra o aumento da gasolina. Clama o povo a ir às ruas protestar.

– Mermão, a gasolina tá cara mermo. Um absurdo. O locutor tem razão: a gente precisa se unir e protestá.  – disse o pintor de rodapé.
– Se continuar assim, aonde é que a gente vai parar? – resmungou o outro pintor, mexendo o balde de tinta – Temos que ir à rua mesmo, gritar contra esse aumento descarado de preço. Quem já viu isso?!
– A gente temos que fazer faixa e cartaz como aqueles tal de cara-pintada fazia.
– Pode ser. Gritar palavras de ordem contra os donos de posto, tipo “abaixo a ditadura da gasolina!”
– É... Ouvi dizê que o culpado desse aumento é um tal de Cartel. Esse cara deve ser gente muito importante no governo.
– A gente grita contra ele também... Mas me diga uma coisa: quanto é que tá custando um litro de gasolina?
– E eu lá vô sabê! Cumé que vô sabê se só ando de bicicreta?!


domingo, 1 de maio de 2011

Antônio Torres participará de Encontro com Jornalistas Escritores

O baiano Antônio Torres, nascido no arraial do Junco, hoje, cidade de Sátiro Dias, será uma das atrações dos Encontros com Jornalistas Escritores, que será realizado nos dias 25 e 26 de maio, em São Paulo , dentro do Congresso Mega Brasil de Comunicação. O evento tem a curadoria de Audálio Dantas e será integrado por quatro sessões, duas matinais, de 9h30 às 11h30, e duas noturnas, de 19h30 às 21h30. Torres começou ainda menino no jornalismo, como repórter do Jornal da Bahia e aos 20 anos já estava em São Paulo , na Última Hora. Atuou também na publicidade e lançou seu primeiro romance, Um cão uivando para a lua, aos 32 anos, com grande sucesso. O que viria a repetir-se com o lançamento seguinte, Os homens dos pés redondos. Seu maior sucesso, Essa terra, com fortes traços autobiográficos, foi lançado em 1976, ganhando uma edição francesa em 1984, o que lhe abriu o mercado internacional. Hoje tem seus livros publicados em Cuba, Argentina, França, Alemanha, Itália, Inglaterra, Estados Unidos, Israel, Holanda, Espanha e Portugal. São dele, ainda, Balada da infância perdida, Um táxi para Viena d’Áustria, Meu querido canibal, O nobre sequestrador, Pelo fundo da agulha e O cachorro e o lobo. Vive atualmente em Itaipava, Petrópolis, no Rio de Janeiro. Torres participará da quarta e última sessão, na noite do dia 26 de maio, ao lado de José Hamilton Ribeiro (Pantanal amor baguá e Vingança do índio cavaleiro) e de Regina Echeverria (Furacão Elis e Cazuza, preciso dizer que te amo).

Também vão participar do ciclo nas demais sessões Caco Barcellos, Eliane Brum, Juca Kfouri, Laurentino Gomes, Maurício de Sousa, Moacir Japiassu, Ricardo Kotscho, Ziraldo e Zuenir Ventura. Para os participantes do Congresso Mega Brasil o evento é gratuito. Para estudantes o preço de todo o ciclo é R$ 50 (ou R$ 20 se quiser participar de uma única sessão).

Informações sobre o evento podem ser obtidas pelo site www.megabrasil.com.br, telefone (11) 5576-5600, Twitter (twitter.com/megabrasil), Blog (www.congresso3em1.blogspot.com) e Facebook (http://migre.me/3Tdkp).