terça-feira, 30 de julho de 2013

Short story de uma love story

Era para chegar às seis horas da noite, mas, segundo os funcionários da Empresa, a chuva contrariava a previsão. Não havia previsão. "Qualquer hora que chegar, será bem chegado", repetia ela nas infinitas viagens que fez do guichê ao desembarque; e vice-versa.

Às quatro horas da manhã ele chegou. Ela correu feliz e se pendurou no seu pescoço. Ele, sem entender as diversas formas de manifestação do Amor, perguntou:

- Tu me amas?


domingo, 28 de julho de 2013

AS MULHERES NO CANGAÇO E A CIDADE DAS QUATRO TORRES

A vitória agrega, atrai aplausos e adeptos feito formiga no mel; a derrota afasta e repele as pessoas em velocidade e poder de cargas atômicas iguais, sem a mínima chance de atração nucléica.

Foi o que aconteceu com Lampião e o seu bando na malfadada investida a Mossoró, cidade no estado do Rio Grande do Norte, no ano de 1927. Podemos afirmar que essa derrota foi o início da decadência do cangaceirismo a serviço do rei. Moral baixa, sem munição, bandoleiros em debandada, outros mortos, a vulnerabilidade do bando tornou-se evidente e os ex-aliados passaram a denunciar seus esconderijos e Lampião passou a ser caçado feito raposa nas florestas inglesas. Só havia uma saída: fugir. Em 1928 atravessou o rio São Francisco e foi se refugiar e semear terror na região de Canudos, nas vizinhanças de Paulo Afonso, Bahia, conhecida como Raso da Catarina.

Em 1930 Maria Bonita, então casada com o sapateiro José Miguel da Silva, conhecido como Zé de Neném, no povoado de Santa Brígida, aproveitou a visita de Lampião à sua casa para fugir do anonimato e entrar nas páginas da história do cangaço, inaugurando uma nova era naquele bando até então composto só de homens.

No cangaço as mulheres não lutavam. Nem havia como mostrar seus dotes culinários. O fogo faz fumaça e a fumaça chama a atenção. Os cangaceiros queriam tudo, menos revelar seu esconderijo. Elas eram apenas objetos sexuais, geralmente faziam parte do butim e poucas eram as que ingressaram na vida bandida por livre e espontânea vontade. Engravidavam, mas era impossível ser mãe. Por acordo entre os homens, eles jamais cantavam a mulher alheia. E aquela que pulasse a cerca era punida sumariamente com a pena de morte.

Volta Seca, o cangaceiro compositor, entrou para o cangaço mal perdeu o cheiro de mijo: onze anos apenas e cuidava dos cavalos. Dois anos depois entrou para o bando armado, porém, hoje, ele é mais conhecido pela poética dos seus versos do que pelas mortes que carregava na consciência. São de sua autoria, conhecida de todos nós: “Se eu soubesse”, “Sabino e Lampião”, “Maria Bonita” e “Mulher rendeira”, sendo esta última o canto de guerra do cangaço. Estas músicas foram gravadas pelo próprio Volta Seca, em 1957.

Mas voltemos ao ataque a Mossoró, que culminou na grande derrota de Lampião e na queda gradativa do seu império.

O ataque à “Cidade das Quatro Torres”, conforme ficou conhecido o episódio, foi articulado ainda no Ceará, na casa do major Isaías Arruda. Outro chefe de cangaceiros, conhecido como Massilon Leite, também incentivou o ataque, justificando ser butim para a vida toda, onde todos ficariam ricos além de ser um feito memorável.

No trajeto para Mossoró, o bando deixou um rastro de destruição e terror, saqueando, seqüestrando e pedindo resgate posteriormente. Destruíram os fios telegráficos e incendiaram algumas fazendas. Perto de Mossoró, onde se tinha uma visão panorâmica da cidade, Lampião, já capitão, estancou temeroso. Havia quatro torres de igreja e bastariam apenas quatro bons atiradores entrincheirados nelas para dar cabo do bando todo. Mas o olhar e os argumentos de cobiça do bando foram maiores do que o bom-senso. Lampião acedeu. Antes de atacar, quis confabular com o prefeito. Enviou um mensageiro, um tal de Formiga, morador das redondezas que teve o azar de passar naquele lugar na hora errada.

Formiga entrou correndo na cidade e procurou o prefeito. Tremia mais do que vara verde. O jornalista Fernando Portela narra assim o acontecido entre o prefeito e o mensageiro de Lampião:

"– Seu prefeito, seu prefeito, ele disse que mi mata se eu num dé esse papé pro sinhô doutô!
–  Deixa de sê froxo, home! Num já tá intregue?
–  Mas ele disse que se eu num vortá cum a resposta ele mi mata!
–  Então tá ruim.
O prefeito lê o bilhete e dita a resposta a um alfabetizado local, o dr. Abel Coelho:
–  Escreve aí, Abé: eu tenho o dinheiro, mas ele tem de vim buscá!”
PORTELA, Fernando.“Encarte do LP As músicas do cangaço”. São Paulo: Estúdio Eldorado, 1984.


Lampião foi. Antes não tivesse ido. Eram cerca de cento e quarenta homens entrincheirados, contra cinqüenta no descampado. O capitão desistiu. Jararaca insistiu. Ele e outro cangaceiro de nome Colchete. Invadiram a cidade atirando. Colchete morreu na entrada. Jararaca foi capturado vivo, com uma bala no peito. Chegou a dar entrevista para a imprensa. Uma semana depois foi enterrado... vivo. Não pediu clemência, porém. Seus algozes, assim como ele, não conheciam esta palavra.  

UM CAPITÃO NO CANGAÇO




Aproveitando o aniversário de morte do famigerado Lampião, hoje contarei, para quem não sabe, como o rei do cangaço se tornou Cavaleiro de Sua Majestade, a Caatinga, ou seja, de como ganhou patente de capitão do Exército e saiu por aí exibindo suas divisas oficiais para uma população temerosa e incrédula com o novo poder investido no chefe do cangaço, senhor Virgulino, de Águas Belas, Pernambuco.

– Virgulino não! Capitão Virgulino Ferreira!

Nos tempos em que as missas eram rezadas em Latim, Padre Cícero Romão Batista, o Padim Ciço de Juazeiro do Norte, além das atividades eclesiásticas, exercia a função de grande latifundiário e de maior líder político do Ceará e das redondezas nordestinas, sendo raro o político de então que não fosse lá pedir a sua bênção e o seu apoio político. Em tempos de comunicações precárias e de vazio de Poder Central, os mais espertos se davam bem e tiravam o máximo proveito da ignorância do povo e da fé totalitária que se tinha nos padres e na Igreja. Padre Cícero, raposa velha, viu na Coluna Prestes uma ameaça ao seu latifúndio e, consequentemente, ao seu reinado; se vitoriosos, os comunistas passariam os padres no facão e distribuiriam os latifúndios com o povo. Era o que se dizia, além de se falar que eles também comiam criancinhas. Só havia um jeito de barrar a Coluna Vermelha: criar um exército paralelo, vez que o oficial nada fazia para conter o avanço dos comunistas.

No dia 4 de março de 1926 o padre Cícero convocou o funcionário federal do Ministério da Agricultura, Pedro Albuquerque Uchoa, e ordenou que o mesmo promovesse Lampião a capitão. Manda quem pode e obedece quem tem juízo e assim ele colocou três cadarços azuis no ombro do emocionado cangaceiro; Sabino, lugar-tenente de Lampião, ganhou dois cadarços: estava promovido, oficialmente, a tenente. Só não cantaram o Hino Nacional porque, naquela época, (como hoje também) pouca gente sabia a letra e o Hino Nacional não era tão nacional assim.

Lampião, agora travestido de Capitão Virgulino Ferreira, saiu por aí exibindo orgulhosamente suas divisas de oficial da Pátria Amada e saqueando cidades para comemorar o feito. O funcionário do Ministério da Agricultura, Pedro Albuquerque, foi chamado ao QG do Exército, em Recife, onde enfrentou um general pra lá de furibundo:

– Por que vossa mercê deu patente de capitão a um bandido?
– Foi porque ele não me pediu de general. Se tivesse pedido, eu teria dado!