“Deus
existe, mesmo quando não há.”
Riobaldo,
in Grande Sertão, Veredas - Guimarães Rosa
Deus
existe, porém, para se chegar a Ele, é preciso ter fé. A fé é que religa o
homem a Deus, o humano ao sagrado, através da oração, música, arte ou até mesmo
pelo silêncio meditativo. A esse canal transcendente da Fé foi dado o nome de
Religião.
Cada
povo com seu deus, seu santo, seu mito. Cada religião com seu padre, seu
rabino, seu xamã, os guias espirituais entre o plano cósmico e o plano terreno,
entre matéria e espírito, e assim, seja branco, seja preto, seja índio, seja
oriental ou mongol, todos traçam seu código de conduta ética, moral e
espiritual baseado em seus livros sagrados. Apesar de divergentes entre si, todas
as religiões convergem para um mesmo fim: Deus, um Ser Supremo, Onisciente e
Transcendente.
Foi
assim há milênios. É assim hoje. E sempre será assim porque o homem necessita
de um deus para preencher seu vazio interior. Mas não será assim, num repente de
palavras, que iremos compreender ou praticar alguma das muitas religiões
africanas que por aqui aportaram. Os orixás que vieram nos tumbeiros não vieram
com as mesmas regalias e prerrogativas dos santos católicos. Aqui, eles foram
oprimidos e humilhados pela intolerância do Deus conquistador e manifestar-se
aos seus seguidores era infligir-lhes cruéis castigos no pelourinho.
Ao
desembarcarem em terras brasilis, os
orixás foram metidos numa torre de Babel doutrinária e encontraram grande
dificuldade de comunicação com seus seguidores. Os negros eram separados dos
seus e colocados nas senzalas onde não havia afinidades culturais, muito menos
religiosas. Sequer falavam a mesma língua, pois na África continental havia
milhões de falares nas múltiplas nações tribais e várias eram as culturas e
religiões praticadas pelo seu povo. Por analogia, a Europa é um continente, mas
cada país europeu tem a sua língua e a sua própria cultura.
Quando
os brancos, e depois os negros, aqui chegaram, encontraram uma cultura
dominante do Tupi, Guarani e Tupinambás. Essas nações indígenas formavam
sociedades organizadas nos princípios da solidariedade e da partilha e
totalmente harmonizadas com a Natureza. Os tupis e os guaranis, nações
ocupantes do litoral à época da colonização e que tiveram os primeiros contatos
com os europeus, acreditavam em um mundo espiritual e povoado de divindades.
Eram os espíritos dos seus ancestrais, da floresta, das ervas medicinais, e
também adoravam a um deus Transcendente, Tupã, e reconheciam a Trindade
manifestadora do poder divino, Guaracy, Yacy e Rudá. Havia também Yurupari, o
Messias, filho da virgem Chiucy. Essas divindades, análogas à Trindade do Novo
Testamento, serviram de plugues na catequese dos índios pelos jesuítas, que os
cristianizavam a ferro e a fogo.
Os
pajés (ou xamãs) eram os mediadores entre a comunidade e os espíritos, em
ritual de transe mediúnica, conhecido como pajelança. Exerciam a função de
sacerdotes, médicos, adivinhos e também era o responsável por transmitir oralmente
às gerações futuras a cultura, a história e as tradições do seu povo, pois não
havia escrita nas tribos. Os índios acreditavam que eles, os pajés, detinham o
poder de entrar em contato com os espíritos dos mortos, dos animais ou objetos
que promoviam a cura.
Da
imposição religiosa dos portugueses, principalmente dos jesuítas, originou-se o
culto dos Caboclos Encantados, ou Encantaria, que eram espíritos mestiços e
cristianizados. O transe era alcançado pela ingestão de infusão da raiz da
jurema, árvore considerada sagrada pelos indígenas muito antes da chegada do
europeu, por causa do seu alto poder medicinal e, principalmente, por suas
propriedades psicoativas.
Os
escravos fugitivos de suas senzalas adentravam o interior e encontravam proteção
nas diversas nações indígenas. Quando tiveram contato com os rituais da
pajelança e do encantamento, encontraram afinidades cerimoniais com os orixás
nesses dois cultos místicos indígenas e desse modo surgiu um novo culto
sincrético afro-ameríndio e impregnado de santos católicos, chamado Catimbó.
O
Catimbó foi a primeira religião híbrida do Brasil, onde se misturavam as
crenças indígenas, a religiosidade africana, a magia europeia e os santos
católicos. Foi a base dogmática da maioria das religiões afro-brasileiras e
precursora da Umbanda.
Um comentário:
Estou adorando!! Muito bom!!
Parabéns, Tom!
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