terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Luís Pimentel - Carnaval, desenganos


     Manhãzinha do sábado de Carnaval/Cena externa/Cinelândia.

     A freirinha de bigodes puxou uma cadeira no boteco da Evaristo da Veiga. O garçom pegou o espírito da coisa e chegou junto:

     – Bom dia, irmã. O que deseja?

     O folião descera de Santa Teresa na véspera, depois de se esbaldar no bloco das Carmelitas. Fizera o caminho via Copacabana, deixando os últimos pedaços no quase-bloco do Bip-Bip. Estava um caco:

     – Me vê um pastel.
     – Queijo, camarão ou carne seca?
     – Qualquer um. É só pra ter o que estômago mandar de volta.
     – Vai no de carne seca. Tem mais volume.
     O marmanjo de hábito e touca negros riu e pediu uma dose dupla.
     – De quê?
     – Qualquer coisa – e abraçou o garçom, que àquela altura já era um amigo de infância:
     – Vou te contar uma história triste.
     – Já sei. Esqueceu a carteira no convento.
     – Pior. Perdi um amor aqui, ano passado, no começo do desfile.
     O garçom puxou a outra cadeira:
     – Conta mais.
  – Linda. Vestido de seda branca, transparente, uma bolinha preta em cada seio, homenageando o Cordão. Olhava nos meus olhos e repetia “lugar quente é na cama...”
     – Vou chorar – gemeu o garçom.
     – Deixa de viadagem.

     O Bola Preta inchava em direção à Araújo Porto Alegre. O garçom pediu um tempo ao patrão e resolveu ajuda-lo na busca. O dono do bar diz que não voltou até hoje.