sábado, 20 de março de 2010
sexta-feira, 19 de março de 2010
O que tem de ser, será
Por Cineas Santos
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De O poeta Da Costa e Silva |
Foto: http://dacostaesilva.vilabol.uol.com.br/index.htm

Sem a fortuna de Mindlin, mas movido pela mesma paixão e com ardente paciência, venho gastando minha vida na labuta diária de ler, editar, vender e doar livros a mancheias, como queria o Poeta. Curiosamente, só li meu primeiro romance aos 17 anos de idade, quando já poderia ter lido os clássicos da literatura universal. É que na minha aldeia os livros eram tão raros quanto as chuvas. A água que não bebi já não me faz falta; quanto aos livros... Mas vamos ao que ensejou esse arremedo de crônica. Embora não seja um bibliófilo, tenho um punhado de livros raros. Um deles, uma verdadeira preciosidade. Vejamos como este livro chegou-me às mãos.
Em 1982, em parceria com M. Paulo Nunes, editei a Antologia Poética de Da Costa e Silva, organizada pelo próprio autor, pouco antes do seu silêncio. Por incrível que pareça, foi o primeiro livro do nosso poeta maior editado no Piauí. Alberto da Costa e Silva, filho de Da Costa, ficou felicíssimo e veio prestigiar o lançamento da antologia em Teresina. Acresce que, pouco tempo depois, denunciei, na televisão, o furto de algumas peças raras na Casa Anísio Brito, onde funcionavam o arquivo e a biblioteca pública. O então secretário de cultura, em vez de mandar apurar os fatos, limitou-se a tentar desqualificar-me. Como a denúncia procedia, o cidadão resolveu vingar-se de mim da forma mais abjeta e rasteira: proibiu-me de participar da organização das festas alusivas ao centenário de nascimento do poeta, em 1985. Fiquei quieto no meu canto.
Para comemorar a efeméride, o governo do Piauí mandou editar 200 exemplares da obra completa de Da Costa e Silva, em papel vergé, com capa dura e fino acabamento. Os exemplares autografados pelos editores e numerados de 001 a 200, destinavam-se, naturalmente, às altas autoridades da República. Pois sem sair do meu canto, o exemplar 001 veio cair em minhas mãos sem que eu movesse uma palha. Como sói acontecer em tais circunstâncias, no açodamento, alguns exemplares da obra acabaram esquecidos numa caixa nos porões da secretaria de cultura. Com a mudança de governo, os livros, como entulho descartável, foram atirados às traças. Eram apenas cinco exemplares e o mais raro deles, o nº 1, foi-me doado por um servidor humilde, que não tinha a menor ideia do valor do presente. Ao abrir o livro, limitei-me a dizer: Obrigado, meu Poeta. O cidadão sorriu e disse: “O professor tem cada uma” e retirou-se sorrindo. Não faltará quem diga: “ pura coincidência”. Eu e o Poeta sabemos que não.
quarta-feira, 17 de março de 2010
Amor em Paris - Cláudia Magalhães
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De Paris |
É meia-noite. Há horas, ela permanece imóvel em sua cama, lugar onde dormiu por seis anos com um amor que, por ingratidão e egoísmo, há uma semana não está mais ali. Algo difícil demais para se compreender e que tornam loucos os que andam pela terra.
Ela leva a sua mão em forma de concha até o sexo, pois é assim que rezamos para o amor, e sonhando com os míseros segundos em que tocaria as estrelas, tenta acariciar sua lua úmida até ela tornar-se, novamente, seca, fazendo girar mais rápido o mundo, mas as lembranças do passado estrangulam seus dedos, enchendo-os de verrugas e vergonha.
A enorme vontade de tê-lo, de possuí-lo, a faz perder o juízo. Vou à Paris. Vou em busca de Vinícius!, pensa. Segundos depois, ela enfrenta descalça as ruas desertas e o frio da madrugada, usando apenas seu vestido longo, florido e que, por vezes, usava como camisola. Seus gritos entram pelas frestas das portas e das janelas quebrando o silêncio que comanda a decência. Quando um ou outro a pergunta, O que aconteceu, mulher?, ela responde, Vou à paris. Vou em busca de Vinícius!, e segue andando pelas ruas do outro lado do mundo como se fosse a dona delas. Pergunta à todos os que cruzam seu caminho por um homem alto, barbudo e grisalho e diante do silêncio ela responde, Ele está em Paris! Ele está me esperando em Paris! E segue falando da importância das mãos, pois nelas moram as vontades mais urgentes, falando da imensidão do mundo e do desejo que tinha com o homem amado de morar na Cidade dos Sonhos, para novamente, falar das mãos e do desejo, repetindo, incansavelmente, as mesmas palavras. Tenta, por vezes, se calar e escutar as histórias sem pé nem cabeça dos homens, mas ela tem pressa em se livrar dos sofrimentos da vida e segue sem escolher o caminho e sem saber ao certo quem ela é, molhando os pés na lama acreditando que é o mar, vivendo de esmolas, bebendo cachaça ou conhaque, pedindo a benção a Deus que segurando-lhe o juízo não precisa fingir que lhe deu, até adormecer nos bancos das praças ou nas portas das igrejas e sonhar voando.
Uma hora depois que ela partiu, Vinícius, arrependido de mais uma vez tê-la abandonado, entra no apartamento. Vou pedir perdão e milhões vezes milhões de vezes direi que a amo e nunca mais a farei chorar!, pensa procurando-a com o peito sufocado pela saudade, mas é tarde demais.
Ele a encontra no quarto com a alma liberta. Ora caminhando como uma rainha, ora curvando-se e implorando coisas ao vento. Minha carne foi criada do pó impuro. Meu cérebro, uma grande duna, com a memória e os desejos dos ventos, encheu com o mel do mundo e com os ferrões das abelhas o meu sangue, que de tanto morrer, gerou em meu peito um enorme coágulo chamado coração. Uso salto, quero meus pés com gosto de rua na direção dos abismos. Há muito tempo, o amor me ensinou a cair, agora quero aprender a voar, diz olhando para ele, mas nada vê. A sua carne está acorrentada pelas vontades de sua alma, que cansada de sofrer liberta-se de si mesma, vai à todas as partes do mundo e confunde-se com outras. Desatenta e livre, muda de vontade de uma hora para outra, se reinventa a todo instante. Suas pernas encontram becos escuros, lama, sargaço, o mar e a imensidão das águas, enquanto sua cabeça de lua abraça o Cruzeiro do Sul, a Ursa Maior, as Três Marias, e não somente elas, mas toda a constelação. Múltipla, infinda, ela é a dama, a mendiga, a poeta, a vítima, a algoz, a que ri e chora ao mesmo tempo. Ela é Clara, a sua Clara! Ele observa a mulher que ama, que partiu sem volta para a cidade dos sonhos, deixando em seu peito uma chuva que nunca vai parar e os seus olhos enchem-se de lágrimas.
segunda-feira, 15 de março de 2010
O Centro das nossas desatenções
Por Edna Lopes
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De Centro de Maceió |

E o mais grave: se a “aventura” for à noite, colocará sua vida em risco, pois, como um cenário de filme de terror, a Maceió central é a imagem do abandono, do descaso. Além dos problemas já citados, trechos completamente às escuras e nenhum tipo de segurança. Enfim, um lugar que desestimula o convívio. Deseduca.
Esta semana, saindo de uma atividade de trabalho, quase ás 18h, tive a infeliz ideia de voltar para casa de ônibus, como o faz boa parte da população que trabalha e estuda naquela área. Confesso que o trajeto de menos de 500 metros se multiplicou por mil e tive que falar sério com o meu Anjo da Guarda.
Confesso também que, mais do que assustada, fiquei indignada com o quadro lamentável de desrespeito aos moradores e comerciantes daquele bairro. Francamente, nem cenário de filme de quinta categoria é de tanta decadência. E os que certamente vão querer me lembrar que aquela área está assim por conta da obra do VLT (veículo leve sobre trilhos), não perca seu tempo, pois há dois anos vivi situação semelhante vindo da Rua das Árvores até o Teatro Deodoro, no mesmo horário.
Os bairros centrais de todas as cidades são recheados de historia, de memórias afetivas. O traçado das ruas, os monumentos, os tipos populares e Maceió não é diferente, porém a desatenção é tão gritante que a gente custa a acreditar que os órgãos competentes para cuidarem dessa e de qualquer situação relativa à infraestrutura da cidade sejam tão incompetentes.
E, pensando em educação, em espaços que educam, o que pode oferecer como espaço educativo um bairro que é um escombro? Como as escolas poderão se utilizar pedagogicamente de lugares assim, tão deseducados, tão sem infraestrutura, tão feios e tristes?
A quem interessar possa, em especial as autoridades, Maceió não é só praia, que não são lá essas coisas de bem cuidadas. Certamente os moradores que suportam esse estado de desatenção e desrespeito recebem em suas casas o CARNÊ DO IPTU e pagam suas taxas e outros impostos.
Nota da Autora: O CENTRO DAS NOSSAS DESATENÇÕES (cantos do Rio) é título de um livro do escritor Antonio Torres sobre o Centro do Rio de Janeiro, pela editora Relume Dumará, 1996. Autor premiado, com várias edições no Brasil e traduções em muitos países, Antônio Torres é um dos nomes mais importantes da sua geração, com um obra expressiva que abrange 11 romances, um livro de contos, um livro para crianças, um livro de crônicas, perfis e memórias, além de dois projetos especiais (O centro das nossas desatenções, sobre o centro do Rio de Janeiro - e que rendeu um documentário para a TV Cultura, São Paulo -, e O circo no Brasil, da série História Visual, da Funarte, Fundação Nacional de Arte)
“O que é uma cidade educadora?
É aquela que converte o seu espaço urbano em uma escola. Imagine uma escola sem paredes e sem teto. Nesse espaço, todos os lugares são salas de aula: rua, parque, praça, praia, rio, favela, shopping e também as escolas e as universidades. Há espaços para a educação formal, em que se aplicam conhecimentos sistematizados, e a informal, em que cabe todo tipo de conhecimento. Ela integra esses tipos de educação, ensinando todos os cidadãos, do bebê ao avô, por toda a vida.”
Resposta de Alicia Cabezudo – Educadora argentina para a SINAPSE da Folha
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