No arraial do Junco primitivo o negro foi mero figurante na geografia sócio-cultural, sem nenhuma importância no desenvolvimento econômico. Ou seja, não houve o elemento negro na preparação da terra nem movimentando as engrenagens urbanas.

Quem assistiu ao filme “Narradores de Javé”, viu o quanto o povo puxa a brasa para a sua sardinha na hora de narrar os fatos históricos. Javé era uma cidade do tamanho do Junco, que ia ser inundada pela barragem. Disseram que, se a cidade tivesse um fato histórico, a inundação seria barrada. E a população tratou de escrever a história da cidade, cada um enaltecendo ao seu modo os feitos heróicos do fundador de Javé. Assim como os narradores de Javé, os narradores do Junco deram um negro escravo a João da Cruz para enaltecer sua qualidade econômica à luz da História.
Quando pesquisava para o livro “arraial do Junco”, alguns depoentes se orgulhavam de sua porção nobre d’além-mar, propositadamente esquecidos de que o nosso DNA branco se esvaíra ao longo das eras, diluído nos constantes cruzamentos do caboclo com o índio. Ou melhor: com a índia. Não se sabe de nenhuma cabocla se deitando com o índio. Estas, se casavam com os primos, gente de nome e sobrenome. Principalmente sobrenome. Quando não havia primo para se casar, fugiam na garupa do cavalo do primeiro curiboca que aparecia.

Fujo do arraial do Junco para a corrida final de Fórmula 1, em São Paulo, no último domingo, onde todo mundo aplaudiu um branco, mas teve que se curvar reverente a um jovem negro que mostrou ao mundo a igualdade da cor. No meio da semana, outro negro entrou pela porta na frente nos anais da História ao eleger-se presidente dos Estados Unidos e, por extensão, Imperador Supremo do Resto do Mundo. Meu finado avô, que era extremamente racista, só não está a afligir-se no túmulo porque não sabe da real importância de um negro governar a América. Obama chega à Casa Branca levado pela mesma utopia que colocou Lula no Planalto, aliás, usando o mesmo mote de campanha que emocionou multidões: “sem medo de ser feliz”.

A minha avó já dizia que canja de galinha e precaução não faz mal a ninguém. A frustração pode ser grande e geral para os que habitam fora das divisas americanas. Cogitar-se que Barack Obama será um imperialista amigo do terceiro mundo só por causa de sua cor, é presumir que um papa afro-descendente tornará a Umbanda a religião oficial do Vaticano.
Alea jacta est.