segunda-feira, 4 de setembro de 2023

Enquanto a chaleira não chia

Eu queria desvendar o segredo

De gravar os versos que não te fiz,

De sentir o gosto do teu batom

Nas palavras que não se diz.


Consumir o oxigênio ardente

Da tua boca que não beijei

Provocar o rubor pálido

Na ponta aguda do teu nariz.


Procurei os alquimistas. Otimista

Com suas fórmulas universais...

Vieram os druidas e seus caldeirões

De  porções mágicas e segredos vegetais.

Vieram até as bruxas do amor

(no meu poema há bruxas, não deusas)

E suas verdades quânticas...


Nada me revelaram e ainda surrupiaram cem!


E os versos que não te fiz,

As palavras que não te falei,

O beijo que não te dei,

O rubor pálido de teu nariz

Foram arrastados pela enxurrada

Das lágrimas que não chorei.

De pai pra filho

 

Um momento de ternura entre pai e filho que não se repetirá mais. Certa vez perguntei ao meu pai o que ele falava nesse instante. Ele me disse:
- Indaguei ao seu irmão: "Meu filho, que bom que você se tornou alguém na vida!"
- E o que ele respondeu? - perguntei.
- Ele me respondeu: "Devo tudo isso ao meu irmão Toninho. Se não fosse ele, eu não seria ninguém". Como assim? E ele me disse: "Papai, toda vez que olhava para aquele moleque correndo atrás das cabras eu dizia a mim mesmo: quero ser qualquer coisa na vida, menos igual a esse coisa ruim!"

De pai pra filho

Ele dizia:
"Um homem sem seu chapéu
É um homem sem cabeça.
Um homem com seu chapéu,
É simplesmente um homem."

Não necessariamente assim.
Mas era como se fosse.

Nem ia mais à missa
Apesar de toda a devoção,
Porque na igreja era obrigado
A entrar sem seu chapéu.

Como cantava Nelson Gonçalves:
"Naquela mesa está faltando ele
E a saudade dele está doendo em mim."


Mainha sem mim

Hoje é dia de mainha.

Mas mainha, sem mim, 

seria apenas ela sem mim

e até agradeceria a Deus

ou ao santo de sua devoção,

nunca ter me tido

numa noite primaveril

e acabado com seus sonhos de Verão.


Mas a dúvida que a atormentaria

seria nunca saber o que ela fez

na Primavera passada e engomada

de séculos pretéritos.


E, como o dito acima,

Mainha sem mim,

Seria apenas ela sem mim,

porque os outros dez irmãos,

teimosos como são, 

teriam nascido de qualquer jeito

e lamentariam eu não ter nascido

numa noite de Verão.


Mainha sem mim,

seria apenas uma mãe

sem ter histórias a contar.


A fada

Era uma vez uma bruxinha

Sem o caldeirão das maldades,

Sem vassoura a diesel,

Sem asas para voar.


Mas voava.


O céu era o limite, 

Mas seus sonhos eram etéreos.

domingo, 3 de setembro de 2023

A arte da sedução

Ele vê uma mulher perfeita desfilando pela calçada: corpo escultural, sensualidade de ninfa e, quando ela deixa cair o lenço dois passos adiante, ele diz:

- Ei... fofinha!

Ela se abaixa bruscamente, recolhe o lenço à bolsa, vira para trás e diz:

- Fofinha é a puta que lhe pariu!

E segue em frente com seu andar provocante em busca de uma alma que saiba a diferença entre um corpo de mulher e uma almofada.