domingo, 23 de setembro de 2012

Luís Pimentel - A incrível arte da cantada



     A cantada é uma instituição nacional. Adoro ouvir histórias de paqueras, sejam bem ou mal sucedidas, sobretudo aquelas que trazem em seu conteúdo alguma dose de humor, ou de inteligência, ou de delicadeza. Amigo meu resolveu cantar uma colega de trabalho, por quem arrastava uma asa. Moça fina, inteligente e charmosa, mas dona de um nariz que não era dos mais bonitos. Humor, inteligência e delicadeza se juntaram nesta frase, sussurrada pelo marmanjo ao pé do ouvido:

      – Vou te operar o nariz, te levar a Paris e te fazer feliz.

     Óbvio que conquistou e levou. Mas o mesmo não aconteceu com o mecânico mineiro, que palitava os dentes na porta da oficina em Belo Horizonte e comentou com o colega de trabalho, quando a amiga do Nani, já entrada nos anos, passava rebolativa e animada em frente ao estabelecimento:

– Gosto de mulher assim, ó: feia e velha.

     Que maldade. Grosseria pura. Mas às vezes a mulher reage à cantada, e aí a cena cresce. Na mesa do Lamas, o conquistador se aproximou da jovem atriz com aquela conversinha de “conheço você não sei onde”. A moça, na bucha: “Deve ser de lá mesmo!” Nota dez. Ou a bonitinha de blusa bem decotada, no ponto do ônibus, e o motorista investindo: “Que belos mamões!” A resposta foi tão pesada quanto o comentário:

     – Gosta de frutas? Pinta lá em casa. Você vai adorar a banana do meu pai.

    O doce figura de Copacabana Alfredo Melo, Alfredinho do Bip-Bip, combatia o reumatismo no calçadão da Avenida Atlântica, quando viu aproximando-se na direção contrária um daqueles representantes da espécie feminina que o vulgo apelidou de “toda boa”. Nosso galã botou a barriga pra dentro e respirou fundo:

      – Tem boa memória?

     A moça se assustou e arregalou os olhos, diante de tanta pretensão. Mas conseguiu responder que sim, tinha memória privilegiada.

     O canalha aproveitou: 

     – Então, decora aí: 2267-9696, Alfredo, sempre no turno da noite.

     Meu queridíssimo amigo e parceiro Chico Genu começou a freqüentar cursinho de línguas (bom lugar para se paquerar, só perde para porta de creche). Na hora do cafezinho, turma reunida, Chico bateu os olhos no que chamou para os seus botões de “mulher perfeita”, daquelas de fazer qualquer abestado perder o rumo de casa.

     Amor à primeira vista. Durante meses meu amigo ficou de olho na moça, até o dia em que criou coragem e se aproximou, com a perguntinha manjada?

     – Não conheço você de algum lugar?

     A deusa, sem sequer olhar:

     – Deve ser da televisão.

     Um dia depois, em casa, na hora da novela, Chico reconheceu no vídeo o motivo de suas angústias: Miriam Rios.