sexta-feira, 4 de maio de 2012

Sérgio Ricardo na ABL



‘MPB NA ABL’ APRESENTA SÉRGIO RICARDO NO ESPETÁCULO ‘FÚRIA E PAIXÃO’, UMA HOMENAGEM AOS  SEUS 80 ANOS

O espetáculo terá a intermediação do musicólogo Ricardo Cravo Albin, também produtor do show, e a participação dos filhos do homenageado, Marina Lutfi (voz) e João Gurgel (violão)

A Academia Brasileira de Letras (ABL) dá prosseguimento à temporada de 2012 da série “MPB na ABL” com a apresentação do cantor compositor, cineasta e artista plástico Sérgio Ricardo, uma homenagem, aos seus 80 anos de nascimento. O show, denominado Fúria e Paixão, será conduzido em cena pelo musicólogo Ricardo Cravo Albin e passará em revista a vida e a obra do homenageado, que terá no palco a companhia de seus filhos, Marina Lutfi (cantora) e João Gurgel (violão). O evento está programado para o dia 09 de maio, quarta-feira, às 12h30min, no Teatro R. Magalhães Jr., 280 lugares, na sede da ABL – Avenida Presidente Wilson, 203, Castelo. Entrada franca.

De acordo com o apresentador Ricardo Cravo Albin, Sérgio Ricardo se fará acompanhar ao piano e também falará de sua histórica passagem, aos 80 anos, pela MPB, pelo cinema e pelas ideias políticas: “Entre tantas recordações, Sérgio Ricardo abordará seu começo no Rio de Janeiro nos anos 50; sua música Zelão, que nos melhores tempos da Bossa Nova chamava atenção para os problemas sociais do país; seus filmes, sobretudo Juliana do amor perdido, mais reconhecido no exterior do que no Brasil; e suas trilhas sonoras, sobretudo cantando o “Se entrega, Corisco”, sua parceria com o amigo Glauber Rocha para o clássico “Deus e o diabo na terra do sol”.

Ainda segundo Ricardo Cravo Albin, Sérgio Ricardo falará também sobre sua polêmica participação no célebre Festival de 1967, em que arremessou o violão para a plateia, ao ser impedido de cantar Beto bom de bola, “mote para se referir aos horrores da censura política sobre as obras de arte”.

Serviço:

ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS
MPB na ABL
(homenagem aos 80 anos do cantor, compositor e cineasta Sérgio Ricardo)
Espetáculo: “Fúria e paixão”
Músicos: Sérgio Ricardo, Marina Lutfi (voz) e João Gurgel (violão)
Apresentação do musicólogo Ricardo Cravo Albin, também produtor do show
Patrocínio Petrobras
Data: 09 de maio de 2012, quarta-feira, às 12h30min
Teatro R. Magalhães Jr., 280 lugares
Avenida Presidente Wilson 203 – Castelo
Entrada franca
www.academia.org.br/
Telefone: 3974-2500

terça-feira, 1 de maio de 2012

Cineas Santos - Olhares desconfiados

Há coisa de dez anos, conheci um casal carioca que, ao visitar o Piauí, perdeu-se de amores por Teresina e aqui fincou raízes.  Ele, ex-funcionário da Petrobrás; ela, professora aposentada. Filhos crescidos, situação financeira confortável, os dois podiam dar-se ao luxo de morar em qualquer lugar do país. Optaram pela Chapada do Corisco.

            Certa feita, o cidadão me disse: “Professor, a paisagem humana do Rio de Janeiro estava me fazendo muito mal. A tão decantada cordialidade do carioca tornou-se uma falácia. Todos olham a todos com muita desconfiança. Pelo menos para mim, é impossível viver num lugar assim. O que mais me fascina em Teresina é a hospitalidade dos teresinenses, o jeito sossegado de agir e o olhar de quem confia”. A ex-professora encantava-se com a cadeira de espaguete na calçada: “Que cena mais bonita! Gente sentada na porta das casas, conversando, olhando a vida. Isso reforça os laços que caracterizam uma comunidade”, afirmava.

            O tempo e os contratempos nos separaram: perdi o casal de vista. Na semana passada, encontrei-me com o cidadão. Ao me ver,  não se conteve: “Professor, o que fizeram com a nossa cidade? Foram necessários mais de 40 anos para que se desconstruísse o tecido comunitário do Rio de Janeiro. Aqui, isto se fez em menos de dez...” Indescritível o ar de desencanto do cidadão. A mulher, segundo ele, voltara ao Rio no início do ano. Impossível convencê-la a permanecer em Teresina. “Se é para viver ‘protegida’ por cercas elétricas, enfrentando engarrafamentos, olhando as pessoas com medo e desconfiança, volto para a minha cidade onde, pelo menos, a paisagem física continua linda”, sentenciou. Meu amigo está vendendo o que construiu aqui e pretende voltar também.

            Sem saber o que dizer, brinquei:  feliz de vocês que têm a opção de voltar para sua cidade de origem. Eu também faria o mesmo não fosse o meu Campo Formoso apenas uma metáfora boiando na memória. Gostando ou não, estou condenado a viver na Chapada. Já não tenho idade nem disposição para começar nenhum projeto de monta. Abracei-o e desejei-lhe boa sorte.

            Minhas irmãs, meus irmãos, permitam-me o desabafo: decididamente, não aprendemos nada com os erros cometidos pelos outros. Teresina segue, impávida, copiando o que há de pior nas grandes cidades brasileiras. Exemplos? Os dois rios que abraçam a cidade foram transformados em escoadouros dos efluentes que produzimos; quintais são engolidos por supermercados; casarões seculares transformam-se em estacionamentos, e os automóveis disputam cada polegada de chão com a fúria de mil demônios. Poluição, violência, medo e olhares desconfiados. Sem querer ser pessimista além da conta, fecho com o poeta: “Tenho pena dos que vão nascer”.
           

           
           

domingo, 29 de abril de 2012

Por que hoje é domingo...


Hoje é domingo, do pede cachimbo, mas com tanta lei antifumo vigorando por aí, fui obrigado a parar de fumar. Isso faz muito tempo, ainda quando se recitava essa cantilena domingueira para as crianças e os maços de cigarro não estampavam aquelas fotos horrorosas que têm hoje. Para mim, a pior delas é aquela advertência de que "fumar causa impotência sexual". Terrível! Que graça tem a vida aos olhos de um impotente? Ver a fruta e não poder sentir o sabor deve ser a pior das torturas. E não pode nem dar a desculpa da raposa na fábula da raposa e as uvas: “Estão verdes!” 

Ainda bem que deixei de fumar a tempo.

O primeiro morto que eu vi, não fumava, mas tinha algo a ver com a tal mensagem do Ministério da Saúde nos maços de cigarro. A princípio era só um morto estirado no caixão e os bochichos no velório. Menino, onde eu chegava os adultos silenciavam. Depois de muito indagar, fiquei sabendo que o defunto exposto na sala e que servia de burburinhos havia prometido se enforcar no dia que broxasse. Pelo visto, cumprira a promessa.

Fico pensando com meus botões no dia em que entrarmos num boteco, pedirmos uma cerveja, e vermos no rótulo um fígado cirrótico. Ou entrarmos todo prosa num motel e encontrarmos a cama forrada com lençol bordado de doenças venéreas e a advertência de que transar sem camisinha faz mal à saúde.  

Deus do Céu, seu moço, me dá um maço de cigarro que causa câncer de pulmão!

Mas hoje é domingo, e quando eu era criança lá no arraial do Junco, o povo recitava parlenda para as crianças:

Hoje é domingo do pede cachimbo
O cachimbo é de ouro e dá no besouro
O besouro é valente e dá no tenente
O tenente é mofino e dá no menino
E o menino é chorão e arrasta a bunda no chão!

Para variar, sobrava para o menino. E eu, menino, não sabia o que era um tenente. Lá no Junco, cidade esquecida por Deus e pelos governantes, só havia um velho soldado, conhecido como “Quarenta”. Ganhou esse apelido por causa da sua mania de chamar polenta de “quarenta”. No início ele não gostou, achou ser um desrespeito à sua autoridade, mas quando viu que teria que prender toda a população, resolveu se fazer de mouco. O tempo foi passando, ele se acostumando até o dia que incorporou de vez o apelido ao nome e passou a se apresentar como “soldado Quarenta”.

O soldado Quarenta era o terceiro homem na hierarquia social do arraial do Junco. O primeiro era o motorista do ônibus. O segundo, o cobrador do ônibus. Mas como os dois primeiros só viviam viajando, o velho soldado era o bambambã da cidade. Desfilava garbosamente com sua farda rota, exibindo uma velha pistola de dois canos, chamada de “dois tiros e uma carreira”.

Um dia o rei do cangaço resolveu tomar a cidade de assalto. Reuniu a cabroeira na entrada da cidade para traçar um plano de invasão. Antes, porém, tinha que saber quantos soldados havia à sua espera. Capturaram um morador desavisado que passava na estrada.

– Tem quantos “macacos” na cidade? – perguntou Lampião, apertando a goela do junquês.
– Tem muitos não, meu capitão! – respondeu num fio de voz – Só tem Quarenta!

Lampião resolveu contar seus homens. Dezoito! Empurrou o “informante” para o lado, pegou seu embornal, colocou a espingarda em bandoleira e ordenou:

– Vamos embora que estamos em desvantagem numérica! Também, roubar pobre é pedir esmola pra dois!

E assim, quando o “informante” entrou na cidade contando o acontecido, só não foi ovacionado porque estava borrado e mijado e o mal cheiro recendia a léguas. E o soldado Quarenta foi enterrado como herói anônimo, anos depois, porque ninguém se lembrava mais do seu nome de batismo.