domingo, 12 de maio de 2024

Ai de mim, Copacabana!

 


Porque Copacabana vai além de sua calçada e do seu mar revolto. Eu, quando ainda menino besta do interior, conheci o calçadão na capa de um livro de crônica de Rubem Braga; gemi meus ais de mim, e ai de ti se não te conhecesse logo, Copacabana! Mas, entre a cidade e a roça, existia um oceano de distância.

O meu irmão mais velho, e velho de morar em Copacabana que até incorporara o linguajar carioca, sabendo dos meus sonhos de menino descalço pelas ruas do sertão, me deu uma passagem de presente por ter passado no Exame de Admissão ao Ginásio.
Assim, como Rubem Braga redesenhou a crônica na minha vida, vi Burle Marx redesenhar as ondas nas pedras portuguesas do calçadão de Copacabana.





Das aranhas que não se deve ver

A minha mãe nasceu mais para conselheira do que para ouvidora. Quando alguma amiga dizia ter medo de aranha, ela aconselhava:

- Se não quiser ver uma aranha, não se desnude diante do espelho.
Como eu não tinha medo de aranha, tirei a roupa diante do espelho e o bicho que vi era outro. Corri assustado para a sala e interrompi as inconfidências femininas:
- Mamãe, tem uma pulga atrás da minha orelha!
Ela me atendeu com a devida presteza e solicitude de todas as mães e me disse carinhosamente que não era pulga; era piolho. Em seguida, após matar o piolho a unha, pediu licença às amigas e raspou a minha cabeça e depois me deu uma surra de chinelo de couro de boi que era para aprender a não andar nu dentro de casa, principalmente no dia que ela recebia visitas para o chá das cinco.

Mãe das antigas

Uns velsos malamanhados que fiz para o dia das mães e acabei esquecendo por aí.

Ser mãe das antigas
É padecer no paraíso.
Ganhar panela de pressão,
Conjunto de prato e mesa
E um jogo americano.
Casa cheia de gente.
Parentes e aderentes,
E os convidados para o churrasco.
Isso, todos os anos.
Ser mãe da modernidade mais moderna
É ganhar almoço em restaurante
Porque as escravas folgam aos domingos
E ninguém quer lavar pratos.
A ladainha é a mesma do ano passado.
E do atrasado. E do atrasadíssimo:
- Mamãe, você não pode comer isso!
- Mamãe, você não pode comer aquilo!
- Não é a quilo! É rodízio! - explode a mãe
De olho na sobremesa que não pode comer.
- Por que vocês não me dão
Uma panela de pressão
E vão comer na puta que pariu!?
- Calma mamãe! Quem nos pariu
foi a senhora.
- Então vamos comer em casa!
Quando os ânimos se acalmam
E ela arrota cebola com açafrão
E engole um palavrão apimentado,
Finge satisfação do prato
Que não escolheu.
Vai para casa de Uber, Ou até
Vai a pé. "Isso é bom pra saúde",
Dizem os filhos zelosos.
E entram nos seus carrões e
Vão arrotar suas fotos com as mamas
Nos sites sociais.

DIA DAS MÃES VIRTUAIS

Todo mundo homenageando as mães por aqui e elas, as mães, coitadas! a maioria não sabe nem o que é Facebook, WhatsApp ou Instagran! Algumas preparam um almoço especial, chamam os filhos, e eles respondem, com a bunda pregada na cadeira do computador:

- Peraí, mãe, que estou fazendo uma homenagem a senhora aqui!
E a mãe belisca qualquer coisa, abre uma Coca-Cola, senta no sofá, liga a televisão e fica esperando começar o Domingão do Faustão, não se cabendo de felicidade com a mensagem que o filho ou a filha está escrevendo a qual ela nunca ficará sabendo.

Mainha sem mim

Hoje é dia de mainha.
Mas mainha, sem mim,
seria apenas ela sem mim
e até agradeceria a Deus
ou ao santo de sua devoção,
nunca ter me tido
numa noite primaveril
e acabado com seus sonhos de Verão.
Mas a dúvida que a atormentaria
seria nunca saber o que ela fez
na Primavera passada e engomada
de séculos pretéritos.
E, como o dito acima,
Mainha sem mim,
Seria apenas ela sem mim,
porque os outros dez irmãos,
teimosos como são,
teriam nascido de qualquer jeito
e lamentariam eu não ter nascido
numa noite de Verão.
Mainha sem mim,
seria apenas uma mãe
sem ter histórias a contar.