Fogo morto,
romance vivo
Por Antonio Torres
romance vivo
Por Antonio Torres
De Fogo Morto - José Lins do Rego |
São raras as obras literárias comparáveis aos diamantes, cujo brilho nunca se apaga. Fogo morto é, sem dúvida alguma, uma dessas raridades. Publicado originalmente em 1943, foi logo aclamado como uma obra-prima, assegurando a seu autor, o paraibano José Lins do Rego, um lugar inarredável na galeria dos maiores prosadores do século XX. Lido (ou relido) agora, entende-se perfeitamente o impacto que ele provocou logo no seu lançamento, quando foi festejado por críticos exemplares como Otto Maria Carpeaux, Antônio Cândido, Tristão de Athayde, Afonso Arinos, Wilson Martins, e mais e mais, sem esquecermos o entusiasmo que despertou em dois expoentes das letras nacionais, os escritores Mário de Andrade e Gilberto Freyre. Mas a força criadora de José Lins do Rego, que em seu décimo romance – e aos 42 anos de idade - chegara ao apogeu, haverá de ser sempre louvada.
Fogo morto tem por núcleo a pungente história de três personagens trágicos: o mestre José Amaro, homem do povo, de firmes convicções, condenado a um destino brutal; o major Luis César de Holanda Chacon, um citadino instruído e ocioso que, por laços matrimoniais, ascende à nobreza rural, vindo a se tornar um senhor de engenho truculento, cujo destino o condenaria a uma melancólica decadência; o patético capitão Vitorino Carneiro da Cunha, o Papa-Rabo, espécie de Quixote sertanejo, réprobo de suas fantasias de heroísmo – e uma criação literária simplesmente brilhante. Estes protagonistas, somados a um elenco de coadjuvantes igualmente memoráveis, compõem um amplo espectro da sociedade brasileira na transição entre a Escravatura e a Abolição.
Simbolizando o fim de uma era, Fogo morto expõe a vulnerabilidade de todo um ciclo econômico – o da cana-de-açúcar –, dependente do trabalho escravo. Com a Lei Áurea, até os senhores de engenho ficaram sem saber o que fazer de si mesmos. A trama do romance, portanto, envolve complexas tensões entre casa grande x senzala, homens x mulheres, brancos x pretos, cangaço x governo etc. E escancara uma realidade de violência, racismo, machismo e loucura, temas (ainda!) tão contemporâneos. Tudo isso entretela a sua abrangência histórica e alta significação literária.
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