segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Colóquio do Centenário de Nascimento de Eurico Boaventura



Colóquio Internacional Eurico Alves Boaventura


“Cidadezinha esquecida nesse longínquo sertão silencioso,

Não te conheço, mas, certamente, o meu nome sem ruído

Já te apareceu por aí, numa nova notícia.

A estas horas, na tua modesta Praça da Matriz, com certeza,

Já murmuram o meu nome com interrogações na voz (...)”

(Canção Para a Cidadezinha Desconhecida - Eurico Alves Boaventura)


No centenário do poeta, uma miríade de literatos e doutores. Assim foi o Colóquio Internacional do Centenário de Nascimento de Eurico Alves Boaventura, realizado pela Universidade Estadual de Feira de Santana, de 29 a 31 de julho.

Eurico foi o poeta da Feira, o menestrel do Sertão, o visionário apocalíptico da Feira de Santana desvairada dos últimos tempos, onde se semeia desordenadamente a selva de pedra e seus imponentes monumentos de concreto. Amou a sua terra natal mais que ela a ele, e sua paixão revelava-se em líricos versos modernistas com cheiro de curral e gado.

“(...)

Que poeta nada! Sou vaqueiro.

Manuel Bandeira, todo tabaréu traz a manhã nascendo nos olhos

E sabe de um grito atemorizar o sol

Feira de Santana! Alegria!

Alegria nas estradas que são convites para a vida na vaquejada

Alegria nos currais de cheiro sadio

Alegria masculina nas vaquejadas, que levam para a vida

E arrastam também para a morte

(...)”

(Elegia Para Manuel Bandeira – Eurico Alves Boaventura)


Foi poeta da terra, mas de sua poesia não falava nas tertúlias literárias que promovia em sua casa. Preferia recitar os versos de poetas d'alhures, segundo conta o escritor Antonio Torres, um dos frequentadores do seu seleto grupo de ouvintes. Timidez, modéstia, ou os dois juntos? Difícil de se saber.

Juiz de Direito e de tudo, porque naquele tempo era assim, serviu em várias comarcas interioranas, porém foi preterido em Feira de Santana. Sua filha Eugênia não sabe os motivos dessa querela judicante na sua terra natal, mas, devido à retidão do seu caráter, é compreensível que os corruptos detentores do poder político não o queriam por perto. Não nos esqueçamos que ainda é pratica corrente os influentes escolherem quem os irá julgar no futuro.

E foi nessa magistratura itinerante que o juiz Eurico Boaventura foi parar em Alagoinhas e lá fez grandes amigos, porém não deixou de contrariar interesses que culminou com a sua prisão no pipocar da denunciação anônima implantada pelo golpe militar de 1964 e que resultou no caça às bruxas promovido pelos escrotos. Solto, três dias depois sem que houvesse acusação formal ou comprovação de ilícitos, o dano moral foi contundente e não teve mais sossego em sua vida.

Morreu no anonimato literário em 1974 e assim permaneceria se não houvesse gente na Universidade Estadual de Feira de Santana com a coragem quase heróica de arregaçar as mangas e resgatar parte da mnemônica literária – e da própria história da cidade – no século XX.

Outros Euricos há em todo canto e lugar, aguardando que uma boa alma os tire do limbo da História e os conduza ao mundo com suas reais importâncias, como fizeram os autores do Colóquio Eurico Alves Boaventura. Justiça que se fez ao vate feirense; justiça que se faça à legião dos condenados à omissão eterna que nos observam com seus olhos erodidos pela ação dos séculos.

Parabéns aos realizadores pelo sucesso da empreitada feirense.





domingo, 9 de agosto de 2009

O Escritor, O Poeta e o Blogueiro




O escritor de um lado, o compositor do outro, e eu no meio. Assim foi o grande encontro no saguão do Hotel Kalilândia, em Feira de Santana, Bahia, para o Colóquio Internacional Eurico Alves Boaventura, realizado pela Universidade Estadual de Feira de Santana.

Antonio Torres, o escritor, não conhecia Carlos Pitta, o compositor. Nem suas músicas. Por outro lado, Carlos Pitta conhecia Antonio Torres através da mídia e dos livros. E eu, o blogueiro, espremido entre eles, conhecia os dois. O primeiro por ser meu irmão mais velho, o exemplo a ser seguido segundo a minha mãe quando me pegava na traquinagem; o segundo, músico, poeta, compositor e produtor musical Carlos Pitta, responsável pela música Cometa Mambembe, em parceria com Edmundo Carôso. Esta música, mistura de frevo, baião e galope, era e continua sendo uma das músicas mais executadas nos carnavais onde imperam o frevo e as marchinhas, sendo gravada, também, por forrozeiros famosos e tocada nos rala-buchos e bate-barriga.

Foram três dias de convivência com Carlos Pitta, tempo suficiente para descobrir que por trás de sua alma poeta se esconde um grande contador de causos e anedotas. Carismático, por onde passa recebe o carinho do público feirense, sua terra natal, que o saúda com o refrão “tenha fé no azul que está no frevo/que o azul é a cor da alegria...” para deleite do mesmo. Também curou a rouquidão de Antonio Torres, que desembarcou na Bahia completamente afônico. Sem a feliz intervenção homeopática de quem sobrevive da voz, o escritor teria que pedir a alguém para ler o seu discurso de encerramento do Colóquio.

Na sexta-feira, dia 31 de julho, apesar de termos farreado até meia-noite, ele acordou às seis da manhã para gravar estes dois vídeos abaixo, falando do seu novo cd e da sua obra-prima, Cometa Mambembe. A nossa intenção era ter a sinfonia matinal da Praça Kalilândia como música de fundo, porém o concerto urbano em Feira de Santana está começando bem mais cedo do que o despertar dos pássaros.

Mas, felizmente, foi possível harmonizar o homem, o poeta e a natureza.



Carlos Pitta e Seu Novo CD

Carlos Pitta dá entrevista exclusiva ao blog e compara a música de hoje com a de antigamente e fala do seu novo CD




Carlos Pitta Revela os Bastidores de Cometa Mambembe

O cantor e compositor Carlos Pitta fala ao blog do seu grande sucesso em parceria com Edmundo Carôso Cometa Mambembe. Neste mesmo vídeo, um clip com seu novo sucesso "O Homem Que Toca Blues Lá No Mississipi"


sábado, 8 de agosto de 2009

Escritor e Professor Aleilton Fonseca visita a terra e faz doação de livros à Biblioteca Antonio Torres

O escritor - e professor-doutor da UEFS - visita a Biblioteca Antonio Torres no dia 1º de agosto de 2009 e faz doação de livros ao patrono, que repassa ao responsável pela mesma. Na oportunidade, estavam presentes os professores-doutores Rosana Patrício, Rita Godet, Lícia Soares, Hélvya Pereira, além do Sr. Luiz Eudes, José Geraldo, Raimundo Torres e este que vos fala.



quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Escritores e Professores Visitam o arraial do Junco

Visita do escritor Antônio Torres e do professor e escritor Aleilton Fonseca e dos professores doutores Rosana Patrício, Rita Godet, Lícia Soares, Hélvya Pereira, ao arraial do Junco, no dia 1º de agosto de 2009. Anfitriões: Luiz Eudes Cruz de Andrade e José Geraldo Torres. Fotógrafo: Tom do Junco.



segunda-feira, 27 de julho de 2009

O Jogo do Contente



Por Mislene Lopes



“És precária e veloz, Felicidade. Custa a vir, e quando vens, não te demoras. Foste tu que ensinaste aos homens que havia tempo, e para te medir, se inventaram as horas.

Felicidade és coisa estranha e dolorosa:

Fizeste para sempre a vida ficar triste.

Porque um dia se vê que as horas todas passam e um tempo despovoado e profundo persiste

(Cecília Meireles)


Entre os poucos livros que li na minha infância e adolescência posso dizer que “Pollyanna” foi uns dos meus preferidos. Trata-se da história de uma menina de onze anos, filha de um missionário pobre que, após ficar órfã, vai morar em outra cidade com uma tia rica e severa. Pollyanna ensina às pessoas na nova comunidade o jogo do contente, que havia aprendido com seu pai no dia em que esperava ganhar uma boneca e recebeu um par de muletinhas. Seu pai lhe explicou que não existia nada que não pudesse ter dentro qualquer coisa capaz de nos fazer contentes, e ela então ficou contente por não precisar das muletinhas. E depois desse dia criou o jogo de procurar em tudo que há ou acontece, alguma coisa que a faça contente, e o ensina sempre que encontra alguém triste, aborrecido ou mal-humorado.

Estar contente, estar feliz, é sentimentos que vão e vem sem pedir licença. Durante o tempo que vivi na pequena cidade de Sátiro Dias, passava os dias fazendo o jogo do contente, assim teria motivos para sorrir. Mergulhava a cara nos livros. A leitura não era um hobby e sim uma necessidade, eu precisava ocupar minha mente, dar um novo sentido para minha vida. Em poucos dias eu lia um livro e graças a Deus na cidade existia uma biblioteca publica, cujo nome homenageava um dos grandes escritores da terra: Antonio Torres.

Queria ter tempo para sentir tristezas. Durante o dia eu estudava e à noite eu lia à luz de candeeiro, forçando meus olhos, o que resultou num problema de visão. Os sons das cigarras faziam a trilha sonora. Meu lado imaginário me fazia esquecer a solidão. No período de seca e dificuldades, os livros eram meus companheiros de cabeceira. Meu pai não gostava muito, achava que eu lia livros de sacanagem ou que me colocaria em perdição. Por varias vezes me proibiu de ler, ameaçou destruir qualquer livro que eu levasse para casa. Acreditava que quanto mais eu me aprofundasse nas leituras, maiores seriam as chances de me tornar uma “mundana”. Porém eu lia escondido. Os livros eram meus melhores amigos em momentos de solidão e tristeza. Neles, dava asas à imaginação, viajava, conhecia outros mundos.

Solucei quando li “Meu pé de laranja-lima” uma obra juvenil de José Mauro de Vasconcelos. A pobreza, a solidão e o desajuste social visto pelos olhos ingênuos de uma criança de 6 anos. Nascido em uma família pobre, Zezé era um menino especial, que envolve o leitor ao revelar seus sonhos e desejos, por meio de conversas com o seu pé de laranja-lima, encontrando na fantasia a alegria de viver. Nenhum outro livro me fez chorar tanto. Ele me marcou com sua história comovente e emocionante, como a retratar a minha infância.

A cada três dias eu ia à Biblioteca Antonio Torres pegar um novo livro. As funcionarias se admiravam por eu ler um livro em tão pouco tempo, recorde para os padrões de leitura da terra. O ultimo livro que li da pequena biblioteca do Junco foi “Dança com lobos”, de Michael Blake. Meu pai já não morava mais conosco, tinha viajado para São Paulo em busca de trabalho. Quando isso aconteceu pude ler com mais calma, sem pressa, degustando as páginas dos livros.

Pela manhã eu acordava com meu pequeno nariz cheio de pó preto. Certo dia minha mãe me perguntou: “O que é isso em seu nariz? Está preto de tanto inalar fumaça de candeeiro. Você e seus livros! Pelo menos enquanto ler não pensa em namorar tão cedo”.

Namorar?! Quem iria querer namorar uma caipira como eu?

Eu era a leitora mais fiel, a mais freqüentadora da Biblioteca Antonio Torres. Busquei nos livros refúgio de anos difíceis. Venci minha timidez, pena que não dei continuidade depois que vim morar em São Paulo.

Em um dos livros que li na Biblioteca, não recordo o nome, mas na contra-capa dizia assim: “Felicidade é utopia, ela existe, não como prêmio, mas como conquista, não é uma estação aonde chegamos, é uma maneira de se viajar”. Pesquisei no Google e não obtive grande sucesso. Parece ser uma intertextualidade de Alzira Lopes e Roque Schneider. Nessas mesmas pesquisas no mundo virtual li uma citação de Cesar Romão que dizia o seguinte: “Felicidade não é algo que se conquista: é algo que acontece em nossa vida como prêmio pela maneira que vivemos”. Não é da maneira que vivemos que conquistamos a felicidade? Felicidade está longe de ser um prêmio, mas uma conseqüência, da mesma forma que o sofrimento jamais é um castigo e sim um resultado.

Voltaire disse que “A felicidade é a única coisa que podemos dar sem possuir”. Charles Chaplin disse que “Nosso cérebro é o melhor brinquedo já criado: nele se encontra todos os segredos inclusive o da felicidade”.

Cada ser humano com seu ponto de vista resume o que pensa e o que acha a respeito da vida. Cada um é feliz ao seu modo, à sua maneira. Eu acredito que a felicidade é algo que se busca dentro de si. Às vezes ela vem como um orgasmo: intenso, porém curto, gostoso, porém passageiro.

Até hoje nunca encontrei nenhum livro que ensine alguém a ser feliz. Que fale sobre felicidade, sim. Para ser feliz só depende de nós mesmos, mas se para alguns ainda é difícil sentir tamanho sentimento, recomendo “o jogo do contente”. Pode dar certo.





sábado, 25 de julho de 2009

Antônio Torres escreve tratados de delicadeza





Eu nem vou me atrever a dizer que esse texto é uma resenha, porque não é. Ou que é uma biografia porque também não é. É só meu jeito arrevesado de partilhar achares e pensares, partilhar sabores e saberes. Só meu jeito de dizer o quanto gostei de ler e o quanto gosto de reler SOBRE PESSOAS, última publicação escrita de Antônio Torres.


Escrever sobre pessoas, sejam elas do meu afeto, das relações de trabalho ou sobre quem simplesmente admiro e respeito em determinado campo de atuação, embora goste de fazê-lo não é tarefa das mais simples. Causa-me certo acanhamento, certo temor, pois me exige um conhecer, uma capacidade de observação e perspicácia que estou longe de ter. Daí o meu encanto com o livro, por ser esse mergulho na alma humana, por ser esse tratado de gentileza e amorosidade ao ser humano. Encanto-me tanto que, volta e meia, venho re-visitar um ou outro personagem tão bem retratado pela alma generosa e carinhosa do autor.


Na primeira leitura que fiz em 2007, me emocionei muito com vários textos. Todos impecáveis, poéticos, sensíveis, mas como não chorar com a lembrança do querido João Saldanha após sua maravilhosa FOI BOM TE OUVIR, JOÃO? Confesso minha predileção pelo texto sobre Alexandre O' Neill e por A MÃE, AS PROFESSORAS E OS DIAS DE UM ESCRITOR, por motivos óbvios: Um é poesia da melhor qualidade e o outro é um memorial impecável sobre o ato de ler.


Totinho - É assim o tratamento carinhoso de sua mãe e irmãos e de tantos que lhe são caros - não disse antes, mas digo agora: SOBRE PESSOAS é o tipo do livro para se carregar pela vida afora. Digo também que lembro com carinho do primeiro livro seu que li, em 1978. ESSA TERRA, além da beleza poética, é também um tratado de delicadeza e humanidade. Seus personagens são tão humanos que reconheci neles pessoas caras, do meu mundo de menina da roça. Quando li, pensei no Mestre Graça e compreendi ainda mais a angústia e o fascínio desse universo tão presente em minha constituição de ser.


Minha admiração por sua escrita inteligente e intensa permaneceu ao longo de tantas coisas boas que li e quando, muitos anos depois a vida nos juntou, autor/leitora, cunhado/cunhada já éramos amigos. Aprendi e aprendo muito com o jeito humano com que trata seus personagens. Não os julga, não os demoniza, apenas expõe suas emoções com o filtro de sua sensibilidade e isso me encanta.


Tenho, confessadamente, o vicio das releituras. Mas não releio qualquer livro. Os que escolho para reler são os especiais, os raros, os que me tocaram o coração e alma por motivos dos mais diversos. Portanto meu caro, sempre que volto a SOBRE PESSOAS ou a qualquer dos seus livros, ou mesmo quando te leio na rede, reafirmo o quanto aprendo, o quanto gosto da escrita de Antônio Torres.


Abraço afetuoso extensivo a Sônia.



Saiba mais


Antônio Torres (Sátiro Dias, 13 de setembro de 1940) é um escritor brasileiro. Nasceu em 1940, num povoado chamado Junco (hoje a cidade de Sátiro Dias), no sertão da Bahia. Descobriu a vocação literária na escola rural de sua terra, incentivado pela professora. Logo começou a escrever as cartas dos moradores da cidade, a recitar poemas de Castro Alves na pracinha da cidade, a ajudar o padre a rezar missa em Latim. Estudou em Alagoinhas e Salvador, onde se tornou repórter do Jornal da Bahia. Foi jornalista e publicitário em São Paulo e em Portugal. Depois de muitas andanças pelo país e pelo mundo, radicou-se no Rio de janeiro onde reside em Itaipava (Petrópolis). Hoje é um dos escritores mais conhecidos de sua geração, com livros traduzidos na Itália, Argentina, México, Estados Unidos, Alemanha, Inglaterra, Portugal, Bélgica, Holanda, Israel, Bulgária, entre outros.


Prêmios

Romance do Ano - 1996

Concedido pelo Pen Clube do Brasil.

Prêmio Hors Concours - 1998

União Brasileira dos Escritores

Chevalier des Arts et des Lettres - 1998

Condecorado pelo governo francês.

Prêmio Machado de Assis - 2000

Concedido pela Academia Brasileira de Letras.

Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura - 2001

Na 9ª Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo - RS.

Publicações

Um Cão Uivando para a Lua (romance). Rio de Janeiro, Edições Gernasa, 1972; 3a ed., São Paulo, Ática, 1979.

Os Homens dos Pés Redondos (romance). Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1973; 3a ed., Rio de Janeiro, Record, 1999.

Essa Terra (romance) São Paulo, Ática, 1976; 15a ed., Rio de Janeiro, Record, 2001.

Carta ao Bispo (romance). São Paulo, Ática, 1979; 2a ed., São Paulo, Ática, 1983.

Adeus, Velho (romance). São Paulo, Ática, 1981; 4a ed., São Paulo, Ática, 1994.

Balada da Infância Perdida (romance). Prêmio em 1987, Pen Clube do Brasil, categoria "Romance". Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1986; 2a ed., Rio de Janeiro, Record, 1999.

m Táxi para Viena D’Áustria por ter este livro e Essa Terra traduzidos na França, recebe, do governo francês, o título de "Cavaleiro das Artes e das Letras" em 1999. São Paulo, Companhia das Letras, 1991; 4a ed., Rio de Janeiro, Altaya/Record - Coleção Mestres da Literatura Portuguesa e Brasileira, 1999; 5a ed., Record, 2001.

Centro das Nossas Desatenções (crônica). Rio de Janeiro, RioArte/Relume-Dumará, 1996.

O Cachorro e o Lobo em 1999 ganha o Prêmio "Hors-concours de Romance" (para obra publicada) da União Brasileira de Escritores. Rio de Janeiro, Record, 1997; 2a ed., Rio de Janeiro, Record, 1998.

O Circo no Brasil (crônica). Rio de Janeiro/São Paulo, Funarte/Atração, 1998.

Meninos, Eu Conto (literatura para jovens). Rio de Janeiro, Record, 1999; 3a ed., Record, 2001.

Meu Querido Canibal (crônica). Rio de Janeiro, Record, 2000; 2a ed., Record, 2001.

O Nobre Sequestrador (romance). Rio de Janeiro, Record, 2003.

Pelo Fundo da Agulha (Romance). 2006, Rio de Janeiro, Record.

Minu, O Gato Azul (infantil) Rio de Janeiro, 2007.

Sobre Pessoas (Crônicas), Editora Leitura, Belo Horizonte, 2007.


Sobre o autor, fonte: Wikipédia




quinta-feira, 16 de julho de 2009

A CHEGADA DO HOMEM À LUA

De A chegada do homem a Lua


Quarenta anos atrás fiquei com o meu pescoço doendo de tanto olhar para o céu, tentando ver a Apolo XI pousar na Lua. A Rede Tupy de Televisão transmitia a façanha via Intelsat e o ato heróico dos três astronautas americanos causou uma revolução em nossas vidas. No dia seguinte, e nos outros que se seguiram por mais de um mês, só se falava nisso e nas escolas era obrigatório saber o nome dos três heróis espaciais e dizer as palavras históricas do comandante Armstrong no momento em que ele pisou o solo lunar na noite de 20 de julho de 1969: “É um pequeno passo para o homem, mas um gigantesco para a humanidade”. Tinha apenas treze anos e, de repente, palavras como “órbita”, “módulo lunar”, “estágio” e “reentrada na atmosfera terrestre” passaram a ter uso corrente e obrigatório.


Eu era apaixonado por Sandra, que era apaixonada por Gilberto, que era apaixonado por Maria. Para chamar a sua atenção comecei a fumar um cigarro de marca Continental, que depois troquei por Capri, com filtro, por Minister e depois Hollywood, porém o tiro saiu pela culatra, pois ela não gostava de cigarro, muito menos de pirralho fumante.


Comprei brilhantina Glostora, sapato cavalo de aço, perfume Príncipe Negro, bicicleta Monareta, um relógio de pulso banhado a ouro de marca Seiko e um disco de Roberto Carlos que tinha a música que dizia assim: “Ana / Estou tão triste/ Vieram me dizer / Que posso até morrer / Pra você...” Aprendi a letra, treinei a voz, fiz uma serenata em uma noite de lua cheia, e ela, depois de me jogar um balde d’água, quebrou o disco de Roberto Carlos na minha cabeça, desmanchando o penteado brilhantinado, e fui obrigado a fugir na Monareta o mais rápido que pude. Cego de vergonha pela fuga desonrosa, bati a bicicleta no meio fio da calçada, caí desajeitado, quebrei o braço e, de lambuja, espatifou o relógio que me custara o preço de uma vaquinha, presente de minha madrinha. Depois entendi a violência da minha Julieta: seu nome era Sandra, e não, Ana. Lastimável engano!


Sem a bicicleta, a vaquinha e o relógio, tratei de esquecer a desalmada Sandra. Apaixonei-me pela professora estagiária da escola, que também me chamou de pirralho e não quis nada comigo. E ainda me deu zero em redação, só porque lhe escrevi uma carta de amor. Assim, de paixão em paixão, algumas correspondidas, outras não, consegui chegar até aqui para contar estes dois dedos de prosa. No entanto, mesmo largando a Sandra ao seu próprio destino, não consegui largar o maldito vício do cigarro e ele me acompanhou por mais de vinte anos como meu único e verdadeiro amigo do peito.


No dia 20 de julho de 1969, e nos outros dias que se sucederam até nove anos atrás, o meu pai dizia que a Lua era coisa de Deus e que jamais o homem poria os pés por lá. A audácia humana não chegaria a tanto, dizia, entre uma filosofada e outra, para uma platéia de ouvintes atentos, homens rudes, acostumados a dormir no pôr-do-sol e a acordar no raiar do dia. Irineu de Lolô de Febrônio tinha filho professor, filho jornalista, filho escritor, e o que ele dizia devia ter um embasamento técnico, devidamente assessorado pelos filhos, que cedo ganharam o mundo para divulgar as coisas do arraial do Junco e também mandar notícias das terras civilizadas.


De nada adiantava explicar os avanços da ciência para o velho, que tinha lá os seus próprios conceitos a respeito das coisas e do mundo. Como o desmentir diante de uma legião de seguidores que o chamava de “compadre” e lhe devotava o maior respeito? Uma vez ele ousou contar, um a um, e se assustou com o resultado: chegava perto de mil o numero de afilhados. Ninguém batizaria tantos se não fosse considerada uma pessoa importante. Já nós, filhos desorbitados, debitávamos seus argumentos à força do atraso cultural a que estava relegada a terra em que ele teimava em não abandonar, isolada de Deus e do mundo, cujas notícias da civilização chegavam em lombo de animal.


Em 1999, por ocasião da comemoração dos trinta anos da chegada do homem à Lua, foi divulgada uma pesquisa em que dizia que boa parcela dos americanos também não acreditava que o homem tinha chegado lá e que tinha sido pura invenção do Governo e da NASA para engabelar os eleitores, desviar a atenção da guerra do Vietnã e se impor na corrida espacial contra os russos.


Foi uma pena que nesse dia o meu pai, chegando perto dos seus noventa anos, não mais ligasse as notícias aos fatos e, dois anos depois dessa pesquisa, tivesse partido em sua viagem intergaláctica para hastear, ele próprio, a sua bandeira em todas as luas do universo, sob o testemunho espectral dos amigos que formavam a platéia para ouvir as suas ponderações sobre a impossibilidade do homem encarnado pisar nas invenções divinas ou fazer xixi nas estrelas.

A Chegada do Homem à Lua



Em 1974 o Globo Repórter exibiu reportagem sobre o dia 20 de julho de 1969. Vale a pena rever esse momento histórico.



ATENÇÃO:

Antes de clicar no play do vídeo, dar pausa no player do blog, que fica abaixo da mensagem de boas vindas, canto direito superior.