Uma homenagem ao amigo Ibys Maceioh (camisa azul, na foto)
Com entrada franca, roda de choro encerra 5º Festival Nacional de Choro
As nuvens choravam, mas a aproximação da sala na Unip onde iniciava a oficina em Brasília do 5º Festival Nacional de Choro não suscitava uma amplificação da melancolia. A sonoridade alegre da polca lundu Ora veja, do filho de Pirenópolis Antonio da Costa Nascimento (1837-1903), o Tonico do Padre, iluminava o dia nublado nos acordes do piano, bandolim, violão, cavaquinho, pandeiro e da flauta. “A polca é a mãe do choro, casou com o lundu”, ensina em tom jocoso o professor deste último instrumento da Escola Portátil de Música, Toninho Carrasqueira.
Embora alguns pesquisadores justifiquem o nome do gênero a um tom choroso, para Luciana Rabello, que ensina cavaquinho, a explicação de Luís da Câmara Cascudo é a mais provável: o termo teria surgido do “xolo”, baile típico dos escravos nas fazendas. O fato demonstra a origem mestiça do choro, que em si promove misturas entre vários tipos de valsa, o schottisch, a habanera, o maxixe e o tango brasileiro, entre outros.
Fortemente ligado à “cidade dos pianos”, epíteto para a capital do país na época da sua disseminação em meados do século 19, o gênero agregou mais tarde bandolim e pandeiro. Mas, “toca-se com o instrumento que se tem”, enfatiza Luciana, primeira mulher a participar de conjunto regional e gravações profissionais em um que fosse de “base instrumental” e não essencialmente solista. A musicista garante: “O choro é patrimônio do Rio de Janeiro e de todo o Brasil, e em breve será da humanidade”.
“História mágica que só tem som”, de acordo com Carrasqueira, a música não foge à métrica das quatro frases de quatro compassos em que a terceira é o clímax e a última apenas “termina para concluir”, num vaivém gradual que desvela um efeito de crescendo acumulado. E, após a conclusão, cabe “a vírgula”, a breve respiração silenciosa que deixa tudo em suspenso por um instante.
O aluno Luciano Marques, violonista em bares de Rio Verde (GO), onde mora, conta que o aspecto mais “dançado e balançado” faz de Ora Veja, de Tonico do Padre, composição mais fácil de se interpretar e afirma ser o terceiro festival seguido de que participa — só não veio no ano passado porque não houve, devido à falta de patrocínio.
Iniciativa da Escola Portátil, que há 10 anos vem, entre outras atividades, ministrando oficinas pelo Brasil com o intuito de divulgar e preservar o choro, o festival chega à sua quinta edição neste ano com abrangência inédita e realizações simultâneas aqui, em Porto Alegre e Belo Horizonte. Hoje, às 15h, haverá um concerto de encerramento com a participação de alunos e professores na Unip.
5º FESTIVAL NACIONAL DE CHORO
Roda de choro de encerramento da oficina, com a participação de professores alunos do evento, na Unip (SGAS 913, Cj. B). Entrada franca. Classificação indicativa livre.
A cidadã, bastante judiada pelo tempo, aproximou-se de mim, olhou-me como se estivesse vendo um animal empalhado e disparou: - Quando o senhor vai se aposentar, professor? Engatilhei a resposta que a Dercy Gonçalves trazia, na ponta da língua, para esse tipo de pergunta: “Estou te incomodando?”. Segurei o freio de mão e recorri ao Bandeira: Quando a indesejada das gentes chegar... Pela cara que fez, não entendeu patavina. Como eu não estava disposto a cevar aquela prosa insossa, fiquei quieto. Se bem entendi, teria sido minha aluna, num desses cursinhos da vida, no milênio passado. Falou dos cursos feitos, dos casamentos desfeitos, dos filhos bem-sucedidos, da netinha “linda”, que já balbucia “bobó”... Ossos do ofício.
Quando a cidadã se foi, me dei conta de que talvez ela tenha razão: acho que já está na hora de eu sair de cena. Fiz as conta e espantei-me: são 41 anos de errâncias, sem direito a um descanso na loucura. Ao longo desse tempo, ministrei milhares de aulas, proferi centenas de conferências, editei todos os autores piauienses de expressão e promovi eventos culturais com a compulsão de quem só sabe fazer, fazer, fazer...É certo que, às vezes, bate uma tristeza, um desencanto e a sensação de que se eu não tivesse feito nada, o resultado seria o mesmo. Pra não morrer de vez, digo a mim mesmo: não posso ser maior do que sou. Respiro fundo e começo a engendrar novos projetos. Um exemplar temporão do homo faber. Nada além.
Aonde quero chegar? A lugar nenhum: eu já estou voltando. É que na semana passada, li o livro 1822, de Laurentino Gomes, o historiador de maior sucesso no Brasil. Laurentino, para quem não se lembra, é o autor de 1808, um best-seller brasileiro. A convite do Salipi, o pesquisador esteve no Piauí, visitou Campo Maior, conversou com intelectuais piauienses e recebeu de presente a Coleção Independência (cinco volumes – Ed. Fundapi)), editada pelo venerável prof. Santana, com a minha modesta colaboração. A estratégia deu certo: em 1822, há um capítulo dedicado à Batalha do Jenipapo. Lá pelas tantas, afirma o autor: “Ignoradas pelos brasileiros das outras regiões, as tumbas dos heróis anônimos do Jenipapo contêm uma lição. É um erro acreditar que as regiões Norte e Nordeste apenas ‘aderiram’ ao império do Brasil depois que a independência já estava assegurada no sul do país. Por essa interpretação equivocada, a decisão teria se tornado inevitável diante da consolidação do poder de D. Pedro no Rio de Janeiro e do enfraquecimento da metrópole portuguesa às voltas com dificuldades políticas e financeiras. Na verdade, a independência nessas regiões foi conquistada palmo a palmo ao custo de muito sangue e sofrimento”(p.188).
Finalmente, um historiador sério, depois de ler as obras que editamos, resolveu mostrar ao país o papel do Piauí nas lutas pela independência do Brasil. Pode parecer pouco, mas já é o primeiro passo. Eis por que vamos continuar fazendo, fazendo, fazendo, até que a indesejada das gentes nos convoque para a viagem do esquecimento. Assim seja.
No Hospital do Andaraí, onde, segundo o Aldir Blanc, “tu entra cajá e sai caqui”:
Depois de dois dias na fila, a paciente consegue falar com a recepcionista e recebe uma senha, para ser atendida daí a seis meses.
– Seis meses?! Até lá eu já morri!!! – esbraveja.
E a recepcionista, bem prática:
– Neste caso, peça a alguém para telefonar desmarcando.
***
– Me dá um autógrafo! – diz o guri pro galã global, em frente ao Rio Sul.
– Pois não. Me dê um papel – diz o artista.
– Não tenho. Dá aqui mesmo, nesse papel de pão.
– Nesse papel, Moleque? Todo sujo?!
– Faz mal não. Quando chegar em casa eu passo a limpo.
***
Duas peruas emergentes, no aniversário de uma cadela:
– Acabei de chegar de Minas, visitei todas as cidades históricas.
– Viu as obras do Aleijadinho?
– Menina, o que é aquilo?! Que gênio! Aleijadinho é pouco, aquele homem é aleijadérrimo!
***
Alfredinho, dono do Bip-Bip, templo da música brasileira e do alto astral em Copacabana, é conhecido pelo mau humor e pela tolerância quase zero. Dia desses estava lá tomando o seu vinho, meio de saco cheio das aporrinhações, quando chegou um freguês que tem fama de chato.
– Tá doente, Alfredo? – foi logo perguntando.
– Claro que não! Por quê?
– Porque vi você saindo da farmácia.
E o Alfredinho, de trivela:
– Ah, é? Se eu estivesse saindo do cemitério estaria morto?
***
Foi ali num ponto de ônibus do Humaitá, onde espero o buzum diariamente. Sujeito misto de mendigo e guardador de carro, conhecidíssimo dos moradores do bairro, se aproximou de um engravatado e pediu um dinheirinho:
– O senhor não tem vergonha? Um homem tão jovem, tão forte, tão disposto... por que não vai arranjar um emprego? – berrou o sujeito.
E o mendigo, tranqüilão:
– Peraí, meu amigo. Estou pedindo esmolas, e não conselho.
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Amiga minha, dentista com consultório no Flamengo, é uma tremenda gozadora. Dia desses recebeu um sujeito que queria porque queria arrancar um dente. Perguntou o preço.
– Trezentas pratas – ela respondeu.
O paciente chiou:
– O que é isso, doutora? A senhora não leva nem dez minutos para arrancar um dente.
E a gozadora, alisando o boticão:
– Se o senhor fizer questão, posso arrancá-lo bem devagarinho.
***
Fotografei o tipo saindo do Metrô no Largo do Machado. Jornal debaixo do braço, dobrado no Romance Policial do Cláudio Vieira, bigodinho aparado à la personagem do Dalton Trevisan, olhando pros lados como se estivesse procurando vítimas. Encostou na mocinha que esperava no ponto final do 569 e disparou:
Ao me deparar com algumas manchetes de jornais e periódicos, ao ver e ouvir alguns canais de TV, ao ler só o assunto de e-mails (insistem em me mandar!) de postes de alguns sites ou blogs, a impressão que tenho é de que, ao invés de presidente para o país, escolheremos um líder religioso... No disse-não-disse eleitoral não vislumbro nenhuma chance de qualificar o debate... Aliás, querer que acreditemos que todos os nossos problemas como nação se resumem a que candidato A ou B assuma tal ou qual postura, que qualquer questão se resolva através do viés religioso é, no mínimo, subestimar nossa capacidade de pensar, seriamente, cada problema desse país. Não deixo de me perguntar que tempos são esses em que o que seria valor intrínseco, inerente a cada cidadão ou cidadã (honestidade, seriedade, caráter, hombridade...) seja critério definidor de votos... Não deixo de me perguntar que tempos são esses em que os que se dizem religiosos são os que se utilizam de valores e princípios como moeda de troca, como reles cabos eleitorais... Não deixo de me perguntar que tempos são esses em que preconceito e intolerância, venham de onde vier, ao invés de serem combatidos, buscam a tutela midiática e do poder constituído e o que é pior, encontram eco, apoio... Não deixo de me perguntar que tipos de líderes são esses...
Apesar de o cansaço deixar seus músculos relaxados e o corpo pedindo cama desde cedo, o coronel Limoeiro não conseguia pregar os olhos, por mais carneirinho que contasse. Não bastasse os grilos escolherem sua janela para fazer sinfonia e os rasga-mortalhas piarem em prenúncio de noite de agonia, o som da zabumba no pé-de-serra chegava até seu quarto como se o zabumbeiro tocasse seu instrumento dentro de sua própria sala. Só havia um jeito de se conciliar com Morfeu:
– Zé da Bixiga! – Inhô, patrão? – Vá lá na casa do meu compadre Zé da Burrega e diga a ele pra parar a zabumba! – É pra já, meu coroné!
Zé da “Bixiga” vestiu-se apressado, calçou as alpercatas de couro cru, pegou o facão, a garruncha, se benzeu e saiu em direção do forró. Uma hora depois retornou descabriado, contrariado. A zabumba continuava a toda altura.
– E aí, sêo José, o que foi que houve? – Sabe, meu coroné, a festa tava tão boa qui tive pena de mandá pará! – Tu não é de nada, cabra! De manhã a gente conversa. Chico Bala! – Sinhô, coroné? – Vá lá e dê cumprimento do mandado que esse molenga teve medo! – Sim sinhô, coroné!
Chico Bala vestiu sua indumentária de pistoleiro, calçou as botas, colocou duas cartucheiras atravessadas nos ombros, pegou uma pistola, um punhal e uma espingarda, fez o sinal da cruz, abriu a porta e desapareceu na escuridão. Voltou mais rápido do que Zé da “Bixiga”. A zabumba continuava a ecoar caatinga adentro.
– O que é que houve, homem? – Coroné, a festa tava tão animada qui fiquei cum pena de acabá cum ela.
– Vocês são um bando de covardes! Vou eu mesmo lá e quero ver quem vai me impedir de parar a zoada!
O coronel se vestiu a caráter, sob os protestos da mulher que temia uma rixa com seus compadres ou um tiroteio de última hora, ocasionando um mata-mata de lado a lado. Fazia anos que as famílias da região viviam em paz e o seu marido estava prestes a acender o estopim da discórdia.
Acompanhado de três capangas, o coronel desapareceu na escuridão, decidido a acabar a festa do compadre. Hora e meia depois retornou, cabisbaixo, cara de derrotado. A zabumba continuava mais alta ainda, como em provocação.
– Ôxente, home, tu num disse que ia pará a zabumba? Óia ela aí tocano... – Mulher, tu sabe quem é o zabumbeiro? – Num faço a menó idéa! – É o capitão Virgulino Lampião!
“Fazer o desprezível ser prezado é coisa que me apraz”
Manoel de Barros
Certa feita, um cidadão que carregava um rei, digo, um reino na barriga me fez um elogio desmedido: “Você nunca chegará a lugar nenhum porque pensa pequeno”. Errou por pouco. Tivesse dito: você só pensa sandices e só faz coisinhas, teria acertado em cheio. Essa minha vocação por nadinha é anterior ao que a vida me acrescentou em matéria de ignorância e presunção. Não por acaso, quando publiquei um punhado de poemas cometidos ao longo da vida, pus na coletânea o título de Miudezas em Geral. O título é bem melhor que o livro.
Deixemos, porém, de filosofices, que o objeto dessa arenga é outro. Faz um tempinho que venho cevando o sonho de publicar um livro sobre as flores de Teresina. Cheguei até a pensar o título Teresina em flor. O projeto não contemplaria as flores “domesticadas”, menos ainda as importadas de outras plagas, flores transgênicas, belas e frias como peixes congelados. Eu queria (quero) um livro com as flores da Chapada, quentes, vibrantes, adaptadas à rusticidade do meio. Convidei alguns fotógrafos para a empreitada, mas não os seduzi. Um deles, com veleidades poéticas, perguntou-me: “Por que perder tempo com vaga-lumes se temos a Via Látea ao alcance das lentes?”. Respondi de bate-pronto: Porque os vaga-lumes estão à mão e eu ainda não descobri o mecanismo que os acende. Percebi que não seria fácil encontrar um parceiro. Tarefa de tal monta requer equipamento adequado, tempo, paciência e, acima de tudo, competência. Só me faltam as quatro. Pensei seriamente em desistir da empreitada.
Vai que este ano, ganhei uma máquina Sony, compacta, automática, operável por qualquer criança. É tão pequena, prática e eficiente, que poderia se fazer acompanhar do famoso reclamo das Pílulas de Vida do Dr. Rossi: “Pequeninas, mas resolvem”. Decidi testá-la nos monturos de Teresina. Ao longo de seis meses, sem me afastar mais de 10 km do centro da cidade, fotografei uma centena de flores de monturo, algumas de estonteante beleza. Com ardente paciência, saí garimpando aquelas inúteis preciosidades, com a alegria de quem descobre ouro, ainda que ouro de tolo. O Resultado aí está: a exposição Flores de Monturo – a educação do olhar. É escusado dizer que qualquer aprendiz de fotógrafo encontrará uma trezena de “defeitos” nas fotos expostas: enquadramento, foco, luz e o escambau. Isso não me tira o sono: como diria o poeta, “sou apenas um pobre amador”. O objetivo da exposição é tão somente propor uma reflexão sobre olhar e ver, realidades que, não raro, andam divorciadas. Quando nos limitamos apenas a olhar, estamos nos privando da fruição da insólita e instigante beleza dos monturos. E eu vos asseguro: o monturo é fértil.
Era muita falta de sacanagem, desinsorte infeliz, muita falta de azar! Primeiro, passou a manhã com as mãos dentro da água gelada tentando enrijecer os nervos. Êta dor atroz! À tarde haveria revisão da junta médica do INSS e ganharia mais uns seis meses de lambança. Na primeira vez o truque da água de gelo deu certo, por que agora não haveria de dar? De seis em seis meses no benefício acabaria se aposentando de vez, com salário integral. Aí era só correr pro abraço!
Segundo, no horário marcado ela estava lá, de prontidão, mãos disfarçadas numa luva térmica para manter a frieza. Nem banho tomara, para não desfazer seu intento. Os exames eram nas mãos e não ginecológico. Podia feder à vontade que os médicos não iriam sentir. Mas, e se de repente pintasse um clima com algum deles? E se houvesse algum tarado entre eles e a mandasse tirar a roupa? Deus do céu, quanta tentação! Estava numa secura de anos, será que resistiria? Sim. Primeiro a obrigação, a aposentadoria; depois a devoção, os prazeres da carne e do espírito! Lembrou-se de um casal de portugueses que queria levar um gambá para Portugal. Mas como embarcar bicho tão fedorento sem que fosse pego pela alfândega? Maria deu a ideia:
– Resolvido o problema, Joaquim! Escondo o gambá na minha calcinha!
– E o fedor?
– Ora pois! O gambá que se cuide!
Não era o seu caso, claro, mas teve a sensação de estar pior que gambá. O calor era terrível, agravado pela quebra do ar condicionado. A suadeira era geral. Colocaram um ventilador dos tempos do arco da velha e parecia querer sair do lugar. Mas ventilava forte. Vento? Não, por favor, não! Vai derreter o gelo!
Duas horas depois foi atendida e o chefe da equipe médica achou que ela não tinha mais nada. Sua tendinite havia sarado. Os outros médicos sequer olharam para ela. A decisão já estava tomada: teria que retornar ao trabalho, dois dias depois. Maldito calor!
De retorno a casa, decidiu passar no banco. Era melhor avisar ao chefe que estava de volta. Seus colegas, quando a viram adentrar pela porta principal, esconderam a carteira pensando que ela fora ao banco atrás de mais dinheiro emprestado. Era useira e vezeiro em aplicar a facada nos colegas e, pior, não pagava a ninguém. Era muita cara-de-pau retornar para pedir mais dinheiro emprestado.
Dois dias depois se sentia radiante voltar para o batente. Parecia até o primeiro emprego, de tanta felicidade que irradiava. Sentiria falta de alguns amigos virtuais, mas isso depois ela se acostumava. Sua função no banco era caixa da gerência, só atendia os mangangões da cidade, e tomara que voltasse no mesmo posto. Era gostoso lidar com gente endinheirada. Que imenso prazer sentiria ao pegar em uma nota de cem reais! Êta tartaruguinha difícil! Quanto tempo fazia que não pegava em uma nota de cem? Isso mesmo, dois anos!
Chegou ao banco exatamente às nove horas da manhã. Bateu o ponto, beijou os colegas e procurou a gerência para saber qual caixa estava reservado a ela.
– Caixa?! Dona Vera, depois de passar o calote em todos os seus colegas, a senhora acha que somos doidos de deixar a senhora tomando conta do dinheiro dos clientes?! A senhora já viu lobo tomar conta de galinha? A sua nova função aqui dentro é servir cafezinho à gerência, bem longe dos caixas. E trate de ir logo à cozinha fazer café que estou com vontade de tomar um!
“Sei que estou no último degrau da vida, meu amor”
Nelson Cavaquinho
A noite ainda discutia se ia ou não embora, mas os negociantes de frutas, legumes, peixes, frangos e bugigangas da feira da Glória já armavam as barracas, entre risadas e assovios, cantos de galo, restinho de neblina virando poeira em direção ao aterro. O homem de cabeça branca e violão no ombro escorregou pelas cordilheiras de paralelepípedos da Rua Hermenegildo de Barros e se deixou levar ladeira abaixo pela Cândido Mendes, até desembocar na Augusto Severo. Encostou o violão no poste e pegou uma talhada de melancia na barraca de Genaro, amigo desde a infância na Praça da Bandeira.
– Melancia à essa hora, meu velho?
– Combate a ressaca, Genaro.
– Sai dessa vida.
– Já tentei. Essa vida é que não quer sair de mim.
Os cabelos branquinhos, poeira da idade, estão meio desarrumados. Passa a mão e observa que também estão bastante engordurados, purpurinas da madrugada. Lembra de uma criatura a quem amou, que o chamava de cabelos de prata. Fartos e ondulados, reluziam diante do espelho, na luz esfumaçada do cabaré de bandidos do Largo do Estácio. Mas nem tudo que reluz é ouro e a criatura o trocou um dia por um moço requintado, de bigodinho desenhado e cabelos pretos, feito as asas da graúna, tratados na brilhantina Glostora.
– Me senti um palhaço, Genaro.
Se já não bebesse bastante, teria começado a beber naquele momento. Doses de angústia depois, fez um samba que dizia assim:
"Sei que é doloroso um palhaço
Se afastar do palco por alguém
Volta, que a platéia te reclama
Sei que choras, palhaço
Por alguém que não te ama...”
– Fiz? Fiz. E esse eu sei que não vendi a filho da puta nenhum.
A vendedora de flores também é amiga. Ela escolhe uma rosa, das mais rosas e mais bonitas, corta o talo e enfia no bolso do compositor. Troca de sorrisos e carinhos, vida que segue, apruma novamente o passo e pega o caminho que não é de casa.
Ia esquecendo o violão dormindo no poste, mas a florista o chama. Guarda a rosa na barriga do instrumento e toma o rumo da Lapa. Pouco depois está de prosa com o jovem jornalista metido a escritor que bebericava a última no pé sujo da Riachuelo, no fim de uma noitada de fechamento do jornal e das boates da Men de Sá.
– Eu era muito jovem ainda, assim que nem você. Não tinha respeito pela vida. Nem tinha medo da morte. Foi antes de virar o disco, de virar a mesa, de virar polícia. Fui o pior soldado da história da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Comecei a vida na farda no Batalhão de Cavalaria da PM, onde fiquei sete anos. Metade em cima do cavalo, metade na prisão. Abandonava a diligência e o animal, picava a mula para o Morro de Mangueira. Jogar conversa fora e cerveja para dentro com Cartola, Carlos Cachaça, Geraldo Pereira, Zé Com Fome, Padeirinho. Para eles, eu fiz um samba assim:
“Quando eu piso em folhas secas
Caídas de uma mangueira
Penso na minha escola
E nos poetas da minha Estação Primeira
Nem sei quantas vezes subi o morro cantando...”
Fui o hóspede mais assíduo do xadrez do quartel da Rua Evaristo da Veiga. Mas era bom pegar cana, você sabia? Se não fosse o xadrez do batalhão, eu não teria feito muito samba de sucesso. Às vezes ficava um mês confinado. Então aproveitava a tranqüilidade para compor.
– Começou a vida?
– Maneira de dizer. Na verdade, antes de encarar o batalhão eu já havia enfrentado outros batentes para ajudar no orçamento da família. Trabalhei em fábrica de tecidos, em Deodoro, na função de ajudante de tirador de resíduos, e como auxiliar de eletricista no centro da cidade. Meu pai era tocador de tuba da Banda da PM. Que coisa, hein?! Tocador de tuba.
– Ainda existe tocador de tuba?
– Não existe mais tuba. Nem tocador.
A prostituta de decote farto esparrama os peitos em seu ombro e beija sua testa, os lábios cheios de batom aplicado de qualquer jeito:
– Paga um conhaque, índio?
Nem espera pela resposta, sabe qual é. Pede o conhaque no balcão, entorna de uma vez e volta para a calçada.
– Conhece a moça?
– A moça me conhece.
Nem pegou o violão, apenas sussurrou, marcando com as pontas dos dedos na mesa:
“Não faça vontade a essa mulher
Não deixe ela fazer o que quer
Deve-se ter amizade
Mas não se deve dar liberdade...”
– Que história é essa de índio?
– Minha mãe era paraguaia, índia guarani. Olha os meus traços. Ainda consegue enxergar? Índia guerreira, que areou muita panela nas cozinhas dos outros, como empregada doméstica em casas de família. Acho que está na hora de ir dormir.
– Vai, poeta.
– Sou cantador. Poeta é o Guilherme.
– Então canta uma das suas com ele. Pode ser Quando eu me Chamar Saudade, aquela que diz “me dê a flores em vida”?
– Só se você prometer que não pede mais nenhuma.
– Prometo. Mas dessa vez, com o violão.
Além dos bares, sapatarias, papelarias e lanchonetes começavam a abrir as portas. A mesa já recebera outros notívagos e alguns madrugadores (diúvagos?) para ouvir o índio:
“Sei que amanhã quando eu morrer
Os meus amigos vão dizer
Que eu tinha um bom coração
Alguns até irão chorar...”
Para, enjoado e cansado. Toma ar, toma mais um gole e canta mais uns versos:
“Por isso é que eu penso assim:
Se alguém quiser fazer por mim
Que faça agora
Me dê as flores em vida...”
– Me dê as flores em vida. Essa é uma obra-prima.
– Bobagem. Obra-prima é aquela morena ali.
Pouco depois desce a 21 de Abril, de braços dados com a morena obra-prima, na direção da Central do Brasil.
Mas o caminho é longo, e pode ser feito via Praça Tiradentes. Curtos são os degraus da vida. Outros bares, novos amigos, tantas lembranças. Os trocados mastigados no bolso da calça, junto com o maço de cigarros, estão guardados para o ônibus que vai finalizar o trajeto até em casa, quando as pernas pedirem clemência.
É quase meio-dia e alguém sugere uma rabada, com polenta e agrião, numa pensão da Rua Barão de São Félix. Dessas que permitem violão e cantoria nas mesas. A obra-prima das madrugadas na Rua Riachuelo carrega o instrumento, com a promessa de um amor vespertino no hotelzinho da Rua do Livramento. Ela está sorridente. Ele continua hospedando a tristeza que parece não ter cura. Recorre aos versos do parceiro Guilherme, para casar com sua melodia cheia de flechas sorrateiras:
Tire o seu sorriso do caminho
Que eu quero passar com a minha dor
Hoje pra você eu sou espinho
Espinho não machuca a flor
Eu sou errei quando juntei minha alma à sua...”
Amigo tem mania de pedir música, por mais que o artista esteja indisposto. Começa o falatório: “Canta aquela que diz vou abrir a porta para você só porque é dia das mães”. “Não, não, aquela que fala fui bom pra ela, dei meu nome a ela sem saber que estava sendo traído”. A obra-prima tem um bom humor:
– Vocês só gostam de música de corno?
O índio velho tem a visão nublada e a memória bastante combalida. Mas no meio da noite ainda lembrava que o resto da tarde foi nos braços dela. Só não lembrava quando nem como chegou em casa, o que não tinha muita importância. A mulher de fé e paciência, companheira das horas difíceis, fez beicinho por conta do longo sumiço. Mas mesmo assim, ao sair para trabalhar, deixou café coado sobre o fogão e um prato de carne assada com batatas dentro do forno. Ao retornar, no fim do dia, o encontrou ainda na cama, estirado, ao lado do violão. A flor atirada sobre o travesseiro, também sem vida.
Botou no velho toca disco um 78 rotações, meio arranhado, com um samba-canção dos mais antigos:
“Quando eu morrer, deixarei minha fama
Deixarei no mundo quem me ama
As lágrimas que rolam em meu rosto
Não sabem dizer qual é o meu desgosto...”
Que diabo de desgosto era esse? A companheira nunca soube. Pena que ele não estivesse mais ali, talvez pudesse contar para ela.
Dedicado à memória de Nelson Antônio da Silva, o Nelson Cavaquinho (1910-1986). As canções citadas são todas de sua autoria.
Irmãos e irmãzinhas, confesso - um tantinho envergonhado - que não tenho tido a necessária saúde cívica para acompanhar o horário eleitoral gratuito na TV. Eu até tento, mas são tantas as bocas dizendo as mesmas obviedades que parecem apenas vozes à procura de uma ideia. É certo que há muitos jovens, mas já parecem contaminados com os vírus da mesmice e dos clichês mastigados. Alguns apresentam como “plataforma política” nada mais que o fato de serem jovens como se juventude fosse uma conquista e não uma contingência. Pode-se argumentar, em defesa deles, que o tempo na TV é exíguo e os candidatos muitos. É verdade: dependendo da legenda, alguns mal conseguem declinar o próprio nome. Quando tentam dizer alguma coisa, comportam-se como louco comendo milho assado: mastigam nas palavras e expelem perdigotos. Um martírio.
Mas há coisas muito estranhas acontecendo. Dia desses, estava lendo um jornal quando tive a impressão de ter visto um fantasma na TV. Pensei comigo: devo ter surtado. Não é possível! Mas a figura do fantasma teimava em permanecer em minha mente. No dia seguinte, resolvi conferir. Assisti ao programa inteiro e descobri, aliviado, que não estava enlouquecendo. Lá pelas tantas, o morto apareceu e, com a voz típica dos fantasmas, fez um elogio patético a um candidato vivo, vivíssimo! Meu Deus, a quantas chegamos! À cata de votos, os políticos são capazes de tudo. Bons tempos aqueles em que um candidato afirmava que, para alcançar a vitória, seu adversário seria capaz de “pisar no pescoço da mãe”. O adversário retrucava: “Da tua”!
O tempo passa, o tempo voa, como naquela propaganda de um banco que faliu, e os vícios e as práticas antigas se repetem. Este ano, pelo país afora, há uma profusão de “ex-celebridades” tentando uma boquinha no Congresso Nacional. Há opções para todos os gostos: de boxeadores nocauteados pelo tempo a humoristas desengraçados, sem falar, naturalmente, nas mocinhas que, à falta de marido, querem ser sustentadas pelo povo brasileiro. Só de “ mulher-fruta” temos um pomar inteiro. Uma delas, a Mulher Chuchu, tem o melhor slogan da temporada: “ dá o ano inteiro”. Genial.
Entre nós, o fato novo é a presença marcante de mulheres disputando vagas na Assembleia Legislativa do Piauí. A melhor parte: mulheres bonitas, muito bonitas. Como o voto ideológico está fora de moda e o voto útil tornou-se uma excrescência, vou fazer minha opção pelo voto estético. Votarei na mais bonita, mesmo correndo o risco de encontrá-la na rua e não a reconhecer. Afinal de contas, não há beleza que não possa ser melhorada com o recurso do photoshop. Pago pra ver.
Dona Maria lava a roupa todo dia. Além da rima, é uma agonia. Não foi ela a musa de Luiz Melodia, pois dispensa a quebrada da soleira. Arranja-se no fundo do quintal, entre a sombra preguiçosa da goiabeira, onde está a lavanderia de cimento, e a cozinha, onde uma vitrola em cima da mesa cantarola em hispano. Faz dueto, desafinado e incompreensível. A Língua de Cervantes não era o seu forte.
– Tango!
– Não. Júlio Iglesias – responde contrariada com a brusca interrupção.
– Tango!
– Não. Júlio Iglesias, já disse! (êta argentino burro! Além de gago, burro!) – concluiu em seus pensamentos.
– Tan golpeando la puerta! – gritou o argentino, fazendo um esforço incomum para se comunicar sem tropeçar nas palavras.
– Ah! bão! Por que não disse logo?! - lembrou-se da gagueira do argentino – Deixa pra lá!
Enquanto se dirigia à porta, dona Maria fazia suas conjecturações. Existe coisa mais incompreensível do que conversa de argentino gago? Existe. Uma assembléia internacional de gagos. Em Buenos Ayres. Será que existe assembléia de gagos? Deve existir. Hoje há fóruns, palestras, simpósios, encontros de tudo o que é classe, categoria, clube, ong, partido político e o escambau. Quem não se lembra do recente encontro dos surdos-mudos no Planalto Central? Nem no panelaço reprimido pelo general Nini Mussolini, às vésperas da votação do Diretas-Já, se viu tanto barulho. Deu nos jornais que o Presidente da República, orador oficial desse evento dos filhos do silêncio, não ouvindo nenhuma vaia da platéia, se empolgou, fez um discurso inflamado e, no final, foi calorosamente aplaudido. De pé.
Finalmente, a porta. Do lado de fora, sua vizinha, Noélia, a fofoqueira do bairro. Sabia da vida de todo mudo. Língua mais ferina ainda estava para existir. Quando morresse o corpo iria numa caixa de fósforo e a língua numa carreta. Que queria?
– Maria, me empresta meia xícara de café!
– Você quer meia xícara cheia ou meia xícara vazia?
– Sabe que eu não tinha pensado nisso. Por via das dúvidas, me dê meia xícara cheia.
Há certas coisas que não podem ser meio nem meia. Uma xícara poderia conter a metade de açúcar, de sal ou de café, a depender da precisão do vizinho, que nunca diz “me dê”, mas “me empreste”, mesmo sabendo que jamais vai devolver. Mas como se admitir ser “meio” corno? Isso não existe. Vão dizer que foi coisa que botaram na cabeça, mal-entendido, fofoca da vizinhança e coisas que tais. Mas a verdade é única e simples: ninguém pode ser meio corno, do mesmo jeito que não pode ser meio bicha, meio tarado, meio morto de fome ou meio morto empanturrado. Ou estamos com fome, ou estamos saciados.
Às vezes dizemos inverdades e cometemos injustiças quando afirmamos que “os políticos são meio desonestos”. Não. Não são. São desonestos por completo, porque essas coisas a gente é ou não é, não pode ser apenas a metade. É como se admitir que existe meio-virgem.
Dona Maria é invocada com esse negócio de “meio”, “meia”, o numeral fracionário, a metade. É uma incongruência, um meio para a embromação, principalmente quando se diz que “fulano tá meio ruim”. Fulano tá lá, pé na cova, e ficam arranjando eufemismos.
Essa bronca de dona Maria não é de agora. Vem dos tempos de cabaré, quando dançava à meia-luz dos spots coloridos, embaçada de fumaça de cigarro, no compasso de ritmos eróticos. Era dançarina e faturava relativamente bem, sem ter que ralar a periquita para sobreviver. Trepava com alguns clientes, mas a ela cabia o direito de escolher com quem se acasalar. E cobrava alto.
Não entendia esse negócio de meia-luz. Se a luz está acesa, é claro; se está apagada, é escuro; se fica no meio-termo, é penumbra. Onde está a meia-luz? Por que não “meia-escuridão”?
Arranjou confusão por causa de Meio Quilo, o anão que fazia o serviço de quarto no puteiro. Não concordava com a cáften quando chamava o anão de “Meia Foda”. Não por preconizar o preconceito, mas por conter uma sentença falsa: não existe meia foda. Trepa-se por completo ou fica-se na saudade. A não ser quando se é pego de surpresa por um corno brabo e a retirada estratégica é obrigatória. Aí é interrupção de coito, o que não classifica como meio-coito. No mais, é paz e amor e pau nas coxas.
A partir dessas ponderações realísticas, o anão perdeu o famoso epíteto de Meia Foda e passou a ser chamado carinhosamente de Tamborete de Puta.
Foi com as reminiscências cabarenianas que dona Maria retornou para a sala, onde Noélia havia se aboletado. Em vez de meia xícara cheia de café, levava a xícara vazando pelo ladrão. Noélia agradeceu e, antes de sair por completo, virou-se e perguntou:
– Maria, como vai aquela sua meia-irmã?
– Meia-irmã?! Você já viu meio-pai? Você conhece meia-mãe? Aquele garoto amarelo que lhe chama de mãe por um acaso é um seu meio-filho da puta? Então vá pra meia-puta que te pariu!
Bateu a porta com força, sem esperar a réplica da vizinha. Deitou-se no sofá para esfriar a cabeça. Esse negócio de meio ou meia enchia a sua paciência.
Na cozinha, o toca CD injetou no laser outro CD. Mecanicamente Julio Iglesias cedeu lugar ao tango, das lembranças lascivas de dona Maria. Lentamente o ambiente foi preenchido pelo som voluptuoso e forte do bandoneón, acompanhado de Carlos Lombardi, com sua voz calorosa e firme, interpretando Donato e Lenz em apoteótica noite de cabaré argentino: A Media Luz.
Caruá, para quem não conhece, fica em região incerta e não sabida no sertão nordestino. Avessa a badalações, divulgação ou febres turísticas, a população local me pede que jamais dê qualquer pista que identifique a cidade no mapa; até porque, Caruá não está no mapa.
Eis que notório homem de terras caruarenses resolveu eliminar um desafeto, com quem vivia às turras por conta de pendengas rurais. Contratou um matador de aluguel, que atendia pelo sugestivo nome de Trabuco, e encomendou o serviço. Com uma ressalva das mais curiosas:
– Não dê conversa pro Fulano, pois ele é muito camaradeiro. Monte a arapuca, faça o serviço e venha embora, pois se cair na besteira de prosear, você desiste de cumprir a tarefa. Leve metade do dinheiro, depois do trabalho feito venha buscar o restante.
O matador partiu e o fazendeiro foi acender uma vela pela alma do futuro defunto. Depois de aguardar o tempo regulamentar combinado neste tipo de empreitada – uma semana – pelo retorno de Trabuco, que viria trazer a prova do crime e receber a outra parte do pagamento, o fazendeiro resolveu dar uma incerta no local combinado para a tocaia, à procura de algum vestígio do serviço: o corpo, sinais de luta, um cartucho de espingarda, o que fosse.
Lembram do aviso? Não dê conversa pro Fulano, pois ele é muito camaradeiro? Não deu outra. Debaixo de um pé de umbu, curtindo a sombra em volta de uma garrafa de pinga, cigarrinho de palha entre os dedos, estavam o ex-quase-futuro morto e aquele que deveria mandá-lo desta para uma melhor. A prosa parecia das mais animadas, o camaradeiro entregue à sua atividade principal, o exercício da camaradagem, e o (im)provável matador às gargalhadas, embevecido com as histórias deliciosas que ouvia.
Ao ver o contratante, pasmo e incrédulo sobre o cavalo, o contratado pegou o maço recebido com adiantamento e o devolveu, com esta pérola:
– Tome o seu dinheiro de volta, coronel. Um homem alegre desse não se mata!