domingo, 18 de abril de 2010

Rubem Fonseca aos 80 - Antonio Torres



Do livro de crônicas "Sobre Pessoas", do escritor Antonio Torres


De Rubem Fonseca 1



Meninos, consegui realizar uma proeza, certamente almejada por muitos de vocês: entrevistar Rubem Fonseca. Foi uma entrevista-relâmpago, é verdade. E o pior, digo, o melhor, é que demos muitas risadas e acabei esquecendo o que era mesmo que eu queria lhe perguntar. Coisas assim: "Sabeis vós que sois o escritor que mais influência exerce sobre os jovens que estão se iniciando na literatura? Isso vos causa algum incômodo ou é um presente para os vossos oitenta anos? Tendes algum conselho para a rapeize? Como vedes o mundo, depois da queda do Muro de Berlim, o que aliás presenciastes, in loco?"

Não dá para ser pomposo, ou grave, ou pedante com o Rubem Nosso Bem, como o chamamos aqui em casa. Ele não faz o gênero sabichão, sempre a tirar da cartola uma declaração prêt-à-porter, que vá influir nos destinos da humanidade. Quem quiser saber qual é a sua visão desse nosso tempo que leia os seus livros e pronto. A mim, o que mais impressiona em Rubem Fonseca é a poda que ele faz na "última flor do Lácio," extirpando-lhe os caules vocabulares de seus barrocos galhos lusitanos que impregnaram a retórica dos escribas-comendadores. Mas, se um dia me pedirem para apontar apenas uma de suas virtudes, diria, na bucha: "É um homem que sabe rir." Quando lhe perguntei como estava se sentindo ao fazer 80 anos, ele respondeu, ágil como sempre foi: "O segredo é não ligar para isso. Dane-se a idade. Veja o exemplo do Oscar Niemeyer, que já passou dos 90, e está aí, inteirão." Ele também.

Só o vi fora de forma uma vez. Foi em Santiago de Cuba, quando participamos do júri do Prêmio Casa de las Américas, em 1983. Zé Rubem apareceu à mesa do café da manhã de farol baixo, e cheio de olheiras. "Que aconteceu, homem?"

Então soubemos. Um casal, em sua noite de núpcias, hospedara-se numa cabana parede a parede com a dele, fazendo-o perder o sono.

Imaginem o constrangimento de quem teve que ouvir, pela madrugada afora, uma nubente a uivar, sem surdina: "No, no, papito... Si, si, papito... No, no, papito..."

Ele contou isso transformando o seu drama em comédia. Impagável Rubem Fonseca: saúde, sucesso e... risadas! Rir não é o melhor remédio?



Um comentário:

Kathleen Lessa disse...

Pois é, amigo Tom... Há gostos e gostos. Conquanto Zé Rubem tenha amplos méritos, no geral não gosto de seus livros. Atraíram-me raros contos dele. Impessoalidade e secura com que escreve? Talvez. Fiquei surpresa com o que disse seu mano: que Rubem Fonseca influencia os jovens que se interessam por literatura. __Beijos, Kathleen