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De Roseane e a dinheirama |

Como autêntico sertanejo que sou, nunca duvidei da existência do Troncho. Certa feita, ouvi de uma irmã catequista uma advertência que me marcaria profundamente: “O Demônio é um cão raivoso preso a uma corrente de aço. Para não ser mordido por ele, basta manter prudente distância”. A piedosa freirinha só se esqueceu de um detalhe: estipular a extensão exata da corrente. Volta e meia, ainda me pergunto, apavorado: Não estarei muito próximo? Quase sempre estou.
Um exemplo: certa feita, em 1992, fui procurado por um cidadão falante, maneiroso, que, sem motivo aparente, resolveu brindar-me com uma garrafa de “Dom José”, vinho do Porto de boa safra. Puxou conversa, falou de poesia, de música e revelou em mim qualidades que eu nem suspeitava que existissem... Finalmente, exibiu as presas: “Caro mestre, venho lhe fazer uma proposta irrecusável”. Tremi nos tamancos: sempre que me apresentam propostas irrecusáveis, fico alguns centavos mais pobre. Intrépido, prosseguiu: “Como o senhor já deve saber, a governadora Roseana Sarney desponta como o ‘fato novo’ na corrida pela presidência da República. Eis a proposta: sou editor de uma revista política e vou lançá-la, nacionalmente, com a Roseana na capa”. Até aí, nada de extraordinário. O desfecho: “Com essa edição, pretendo faturar, no mínimo, meio milhão de reais”. Diante do meu espanto, arrematou: “Cada inserção de uma mensagem de apoio de um município maranhense custará cinco mil reais. Que prefeito se recusará a participar dessa campanha, levando-se em conta o fato de a governadora ainda ter dois anos de mandato? Venho propor ao senhor uma parceria: racharemos despesas e receitas, meio a meio”. Quando lhe perguntei o porquê de ter sido eu o escolhido, tentou fisgar-me com o anzol da vaidade: “O senhor é um homem sério, tem o respeito de todos”. Atordoado com a possibilidade de enriquecer subitamente, pedi um tempinho para refletir. Ele aquiesceu, com a advertência: “Duas semanas, professor. Lembre-se de que estamos correndo contra o tempo!”. Ao retirar-se, senti no ar um inexplicável cheiro de enxofre.
Antes do prazo que me fora concedido, estourou o escândalo da dinheirama encontrada no escritório da governadora. O balão murchou. Não tive dúvida: aquele moço blandicioso era a reencarnação do Tinhoso. Vade retro, Satanás!
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