terça-feira, 31 de maio de 2011

Cineas Santos - A poesia como passaporte

De O poeta Salgado Maranhão na praia de Cruz das Almas - Maceió AL

Fosse uma história infantil, poderíamos iniciá-la assim: era uma vez um menino negro e pobre que, mesmo sem existência civil, tinha o passaporte para o coração do mundo: a poesia. Como a história é verídica, que fale o poeta: “Até os dezesseis anos de idade, eu praticamente nem tinha existência civil, já que não tinha nem sequer uma certidão de nascimento. A minha desimportância era tamanha que só a poesia poderia me resgatar do nada. Então, ela foi-se achegando a mim e eu a ela, numa simbiose tão profunda que, contrariando a lei da Física, passamos a ocupar, ao mesmo tempo, o mesmo espaço”. Vista pelo prisma da poesia, a trajetória de Salgado Maranhão pode parecer simples e até glamourosa. Eu lhes asseguro que não foi. Nascido no interior do Maranhão, filho de agricultores pobres, Salgado passou a infância “ correndo atrás do sol/pés descalços pelos matagais/ por entre cascavéis e beija-flores”. Aos 16 anos de idade, semianalfabeto, veio para Teresina onde, em pouco mais de três anos, cursou, via supletivo, o primeiro e o segundo graus. Como já trazia a poesia, em estado bruto, no embornal do peito, começou a escrever e a publicar poemas nos jornais da cidade. Mas, entre um poema e outro, era preciso ganhar o sagrado feijão de cada dia. Entre outras atividades, foi vendedor de santos, profissão pouco rentável, mas que lhe propiciou o contato enriquecedor com a população periférica de Teresina. “Rico não precisa comprar santo: já tem o paraíso na terra”, garante.
Em 1973, com a cara e a poesia, mudou-se para o Rio de Janeiro. “Um dia, percebi que, em Teresina, não havia espaço para o que eu queria fazer. Eu precisava radicalizar, romper com os laços e amarras para tentar viabilizar o projeto de me tornar um escritor. Eu precisava de contato com uma realidade que representasse um violento contraste com o mundo que, até então, eu conhecia. O Rio de Janeiro era esse extremo. Seria, para mim, uma espécie de vestibular extremado, até mesmo em matéria de sobrevivência”. O Cristo Redentor, apenas ele, o recebeu de braços abertos... Mas Salgado, curtido na aspereza, não se deixou intimidar. Meteu-se entre os que, como ele, acreditavam no poder da palavra. Tantas fez que, em 1978, à frente de um grupo de jovens poetas, publicou, pela Civilização Brasileira, Ebulição da Escrivatura, uma antologia que marcaria época. Iniciou sua carreira solo com Punhos da Serpente (1989).Depois, vieram: Palávora; O beijo da fera; Mural de ventos; Sol sanguíneo; A pelagem da tigra; Solo de gaveta e, em 2009, a antologia A cor da palavra. A poesia, a quem nunca traiu,abriu-lhe muitas portas. E vieram os prêmios: “Ribeiro Couto” (98), “Jabuti” (2009) e, este ano, “Prêmio Poesia”, da Academia Brasileira de Letras. Lido por muito, estudado nas universidades, traduzido e elogiado pela crítica especializada, Salgado Maranhão já poderia dar-se por satisfeito. Mas, a um poeta com vocação apolínea, é sempre lícito querer mais, muito mais, sempre mais ...

Um comentário:

Toninho disse...

Estou na corrente pelo Torres.Tem que dá certo.
Meu abraço amigo.