sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Cineas Santos - E o Pedro partiu...

Não fosse lugar-comum, eu diria: a vida perdeu Pedro José de Sousa, mais conhecido como Pedro Macaquinho. Direi apenas: os sertanejos do sul do Piauí perdemos muito da nossa alegria com a partida do Pedro. Macaquinho e eu nascemos na mesma aldeia: Lagoa dos Tubis, mais tarde rebatizada com o pomposo nome de Campo Formoso. Ali faltava quase tudo, até o essencial: água. Menino ainda, Pedro descobriu que tinha a alma encharcada de música. Por falta de um instrumento à mão, fez-se “tocador de sovaco”. Onde houvesse plateia, lá estava o garoto entanguido, meio zarolho, mão esquerda sob o braço direito, marcando o ritmo do xote “O Cheiro da Carolina”, de Luiz Gonzaga. Tantas fez que acabou agraciado com o apelido de Macaquinho. Mais tarde, para fugir da fome, da sede e do rabo da enxada, mudou-se para o Canto do Buriti onde se fez zabumbeiro do Mané Vicente. O mais é do conhecimento geral: Pedro Macaquinho tornou-se o showman do sertão. Tocava, cantava, dançava, contava piadas e, principalmente, pedia. Pedia até que lhe pingassem colírio nos olhos. Certa feita, para me comover, engendrou um expediente inimaginável: “Meu bichim, tô sem obrar há três dias”, afirmou. Rebati de bate-pronto: Tome um purgante de óleo de rícino, Macaquinho. É tiro e queda. Pedro voltou à carga: “Meu bichim, tu num tá entendendo nada. Tô sem obrar porque num tô comendo nadinha, nadinha...”. Impossível resistir a um apelo desse naipe.

Há uns três anos, Pedro vinha lutando bravamente contra um câncer de próstata. Já muito doente, encontrou alento para gravar um CD que, de tão popular, chegou a ser pirateado em Canto do Buriti. O título não poderia ser mais adequado: The Best of Pedro Macaquinho. Este ano, fiz questão de trazê-lo para o Salão do Livro do Piauí, no início de junho. Pedro chegou visivelmente abatido, com a respiração sincopada e dor no peito. Mal me avistou, disparou: “Meu bichim, me dá um caché pra dor nos peitos, que eu tô que não me aguento”. Graças à pronta intervenção do Dr. Gisleno Feitosa, Pedro Macaquinho pôde apresentar-se para alegria do público. Em agosto, realizamos o Primeiro Festival de Sanfona de São Raimundo Nonato. O Macaquinho não marcou presença. Desconfiei que alguma coisa estivesse errada: os festejos de agosto, em S. Raimundo Nonato, sem a presença do Macaquinho não têm o mesmo brilho, a mesma alegria.

Na semana passada, recebi a triste notícia: o Macaquinho se fora sem tempo de ver o documentário que estou produzindo com ele e outros sanfoneiros da região. Parafraseando Bandeira, imagino Macaquinho entrando no céu: “- Xarazinho, me arranja aí um tiquinho de comida, que a viagem foi puxada”. E São Pedro, bonachão, “- Entra, Pedro, que isso aqui tá uma leseira só. Trouxe a sanfona?”. E o céu nunca mais será o mesmo...


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