sábado, 28 de janeiro de 2012

COSMOGONIA ACIDENTAL



O Infinito é azul. É lá onde os paralelos se encontram e os numerais têm fim. A metafísica materializa-se e proseamos compreensivelmente com Deus nos intervalos das brincadeiras de esconde-esconde nas galáxias com os anjinhos. Galopamos os cometas como se fossem dóceis cavalinhos de parques de diversão.

O Infinito é translúcido. Passa o som, passa a fúria, passa a luz. Não há ecos ressoantes nem frases repetidas. Não há palavras. Não havendo fala, não há sede. Tudo é transparente, telepático e telecinético. Não há corpo. Não havendo vísceras, não há fome. Vive-se ao léu, feito nômades galácticos em gozo pleno da liberdade.

No início era o Verbo. O Verbo e todo o Universo que ocupava um ínfimo espaço menor que a cabeça de um alfinete. E Deus olhou ao redor e só viu o vazio soberano e o maciço da escuridão. Era a desolação em sua total plenitude. O Princípio original, sem começo, meio e fim. Não existia o Tempo. Não havia ontem nem amanhã. Passado, presente e futuro eram um só tempo. E Deus se sentiu o mais solitário dos imortais. A solidão era a solidez do vazio. A luz não existia porque não existia o amanhecer e a insônia era eterna. Então Deus, consciente da sua imensurável força e do seu poder infinito, disse: “Faça-se a Distância!” O estopim do Universo foi aceso, irradiando uma colossal energia, se expandindo em uma velocidade infinita em todas as direções.

Então Deus disse: “Faça-se a Luz!” Imediatamente o Vazio foi preenchido pelas galáxias, pelos astros e pelas estrelas, vagando em harmonia etérea em volta de sua magnífica solitude, moldando um espelho da Sua paranormalidade existencial, refletindo a grandeza diáfana de Sua Consciência Cósmica.

Deus montou em um cometa e saiu vagando pelos Seus domínios, fiscalizando Sua grande realização. Visitou estrelas, criou novas galáxias, acendeu o Sol e quando o calor da gigantesca fissão nuclear aqueceu a sua pele permeável, Ele disse: “Faça-se o Tempo!” Imediatamente o Sol se pôs atrás do horizonte da Via Láctea e foi o primeiro arrebol do Universo. No outro dia o Sol nasceu pela primeira vez, e Deus, vendo tão belo amanhecer cheio de luz e calor, disse: “Faça-se o Homem!” E o homem foi feito lentamente, quadro a quadro, em conformidade com a teoria da evolução, porque Ele não tinha pressa. A pressa é para quem vive sem tempo, e Ele era o próprio Tempo, Princípio, Meio e Fim, imutável e eterno, e fez o Homem apenas para dar testemunho de Sua criação e admirar o belo sobre todas as coisas, pois tudo era belo, tudo era a manifestação reveladora de Sua presença e a feiúra seria apenas um indício significativo da má fé: somente os homens de espírito inferior conheceriam o feio e dele escarneceriam.

Um dia o homem se aproveitou do seu livre arbítrio, empinou o nariz e quis igualar-se ao seu criador. Então Deus disse, furioso: “Faça-se a Solidão!” E a solidão foi feita e contaminou todo o universo, e o homem sentiu-se angustiado, triste, melancólico.

A solidão devorou como erva daninha. Enraizou-se no coração do homem e se apoderou da sua alma, asfixiando os sentidos. Aprisionou a Razão e libertou a Depressão. Então o Senhor do Universo, condoído com o sofrimento da Sua criação, deu poderes ao Diabo e o incumbiu de pôr a termo o sofrimento humano. O Diabo não se fez de rogado. Sorriu matreiro, sonso, e ordenou:

– Faça-se a Internet! 



Um comentário:

Marcos Freire disse...

Maravilha os seus textos, Tom Torres