Não sem razão, quando querem nos sacanear, os hermanos argentinos nos chamam de “los macaquitos”. Volta e meia, assumimos posturas ou adotamos modismos que nada têm a ver conosco. Não teria maior gravidade se isso não gerasse consequências. Um triste exemplo: adotamos como regra de conduta a imposição do “politicamente correto”, uma das piores pragas disseminadas pelos norte-americanos. O brasileiro, por temperamento e gosto é, naturalmente, espaçoso, folgado. Tira sarro de tudo e faz humor até com a própria desgraça. Como enquadrá-lo na moldura estreita concebida pelos gringos? Hoje, antes de abrir a boca para dizer uma brincadeira, mesmo que seja com alguém da nossa laia, convém ficar atento: a gracinha pode resultar em processos, indenizações e o diabo a quatro. Começa a viger entre nós o lema dos escoteiros: “sempre alerta”.
Vejam a última novidade: “O Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação na Justiça Federal em Uberlândia (MG) para tirar de circulação o dicionário Houaiss, um dos mais conceituados do mercado. Segundo o MPF, a publicação contém expressões ‘pejorativas e preconceituosas’, pratica racismo aos ciganos e não atendeu recomendações de alterar o texto, como fizeram outras duas editoras com seus dicionários”.
“O caso teve início em 2009, quando a Procuradoria da República recebeu representação de uma pessoa de origem cigana afirmando que havia preconceito por parte dos dicionários brasileiros em relação à etnia. No Brasil, há aproximadamente 600 mil ciganos. Desde então, segundo o MPF, foram enviados ‘diversos ofícios e recomendações’ às editoras para que mudassem o verbete. As editoras Globo e Melhoramentos, de acordo com o órgão, atenderam às recomendações” (Agência O Estado).
Como se pode ver, a coisa é mais séria do que parece: se já chegou aos dicionários, logo mais, chegará aos textos de ficção. Ora, não precisa ser filólogo nem linguista para saber que dicionarista não cria vocábulos; limita-se a recolhê-los e catalogá-los de forma a facilitar consultas por parte de quem queira fazê-lo. Antônio Houaiss era um pesquisador sério e cercou-se de uma equipe de alto nível para elaborar seu dicionário que, em curto espaço de tempo, tornou-se uma referência no país. Para manter o dicionário atualizado, o filólogo criou o Instituto Houaiss que tem prestado relevantes serviços ao país. O MPF, além de exigir a “correção” do verbete, impôs multa pesada: “Além da retirada da publicação do mercado, o MPF também pediu que a editora (Objetiva) e o instituto sejam condenados a pagar R$ 200 mil de indenização por danos morais coletivos”. A quem interessar possa, o Dicionário Houaiss traz 8 acepções para o termo cigano, todas elas de uso corrente no país. A que tem caráter pejorativo está assinalada como tal. Caberá à Justiça decidir. O precedente pode ser perigoso.
Voltando ao início desta arenga, a única coisa que devemos imitar dos americanos é a noção do valor do trabalho e sua justa remuneração. O mais é coisa de mico de feira.
Um comentário:
Concordo com você em tudo o que escreveu. É uma coisa horrorosa. Vou começar a lista as palavras que me incomodam e vou fazer o mesmo que o cigano. Você já imaginou se a Sociedade Protetora dos Animais entrar com um processo desse tipo? Será que na Argentina tem Ministério Publico? Será que os dicionários lá nos identificam como macaquitos?
Postar um comentário