A
menina estendeu a mão para o ônibus em Brás de Pina e entrou pela porta
traseira. Gratificou a cobradora e o motorista com uma goiabada para cada um,
desfalcando o estoque. Saltou na Central do Brasil e embarcou no Metrô, direção
Botafogo, mergulhando por baixo da roleta e fazendo um agrado para o moço da segurança.
Desceu na estação que fica ao lado do
cinema e reabriu a caixa de goiabada no sinal. Vendia a vinte centavos, cada;
três por cinquenta, sete por um real. A primeira freguesa comprou três
unidades, disse “meus filhos adoram” e perguntou “que idade você tem, menina
bonita?”. Ela respondeu “tenho doze”, mas a mulher nem ouviu porque já seguia
em frente. Ainda bem, porque ela estava mentindo: tinha apenas dez. Logo depois
um homem comprou também o seu produto e repetiu a pergunta da mulher, “que
idade você tem?”, só que olhando fixamente para os pequeninos seios dela e
comentando “você é bem gostosinha, sabia?”.
A menina colocou a caixa de goiabadas em
baixo do braço e se afastou. Aprendera que nessa hora é sempre melhor se
afastar. A partir daí as coisas começaram a dar errado, porque o guarda que
cuidava do ponto exigiu cinco goiabadas para deixar ela vender no sinal, uma
mulher mal encarada disse que o preço cobrado “era um roubo” e o moleque que
vendia amendoim no mesmo ponto começou a implicar com ela, procurando
intimidade e dando petelecos em sua cabeça.
Quando a tardinha começou a avermelhar a
enseada de Botafogo a menina entendeu que estava na hora de voltar para casa,
pegando novamente o Metrô e o ônibus na Central, tomando o devido cuidado de
guardar um restinho de estoque para gratificar segurança, trocador e motorista.
Chegou a casa antes do pai, que era biscateiro, e da mãe, empregada doméstica.
Pegou no colo a boneca de pano, já um tanto esgarçada e encardida, deitou com ela
entre os braços no colchonete e disse:
-- Lilica, minha filhinha, hoje foi um dia
difícil. Nem queira saber.
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