Depois de assistir ao
constrangimento de Roberto Carlos cantando e dançando “Ai, se eu te pego!” no
seu tão badalado programa, pensei cá com meus botões: “Deus do Céu, a que
vexame vestiram o rei!”
Já não bastava o “segura
peão!” de outros programas. Nem a Banda Apocalipse. Ou Marília Pera interpretar
suas canções. Era preciso chegar ao fundo do mau gosto para provar quem mandava
no pedaço. “Que rei sou eu, afinal?” deve ter pensado Roberto Carlos em algum
momento de lucidez. Era visível o seu mal estar nos gestos obscenos que a
poética da música pedia.
Bebi um gole d’água e
pensei: “No segundo bloco ele se safa.” Mas qual o quê?! Simplesmente ridículo
seu ensaio no camarim das Empreguetes. Diria a minha mãe: “Sem jeito mandou
lembranças!” Ele sorria amarelo, talvez mais surpreso do que eu com a peça que
lhe pregaram. O rei do iê-iê-iê, o rei do ritmo, o rei da jovem guarda, o rei
da juventude, o rei dos reis, de repente mais um título usurpado de Odair José:
o rei das empreguetes.
Triste fim de carreira. Nem
mesmo a pirataria de DVD levou fé nesse especial de fim de ano. Sem mais
coragem para ver o que vinha pela frente, desliguei a televisão. Não há nada
mais constrangedor para um súdito do que ver seu rei com cara de bobo da corte.
“O que é que falta acontecer
agora?”, pensei enquanto contava carneirinhos. Não demorei muito para
saber. “Escola de samba homenageará um
cavalo”, foi a chamada do noticiário do dia seguinte. Deve ser o cavalo de
Tróia, pensei. Engano. É mesmo um presente de grego que a Beija-Flor dará aos
seus passistas e simpatizantes. Em vez de samba no pé, trotes e coices. O tema
é “Amigo Fiel”, que não é o cão, Jesus Cristo e nem Erasmo Carlos. É o cavalo
Manga-larga marchador. Só não sei dizer se o ritmo será em “samba de enredo” ou
em “galope de enredo”.
Depois que o Estado tomou
conta das favelas cariocas, as escolas de samba andam numa pindaíba só. Meio mundo de
bicheiros e traficantes na cadeia, a ordem é “salve-se quem puder!” Das doze
escolas do grupo especial, nove receberam ajuda de governos estaduais, paises
ou de empresas. Vai se cantar a Alemanha, Coreia do Sul, homem do campo,
Revistas de fofocas de famosos, Cuiabá, novelas da Globo e até mesmo o Rock in
Rio virou tema de enredo.
Samba de uma nota só é Moraes
Moreira cantando “Bestetu” com os Novos Baianos. Besta somos nós. Esse “desconjuro”
das escolas de samba cariocas está fazendo Sérgio Porto revolver-se em seu
túmulo tentando reescrever seu samba do crioulo doido.
Fui consolado por um amigo
que me ligou de Salvador para dizer que estava me enviando um cd com as músicas
que iriam “bombar” no carnaval baiano. Coisa boa, nada a ver com a mesmice dos
parangos e parangolés. Abri um sorriso de orelha a orelha. Finalmente uma
notícia venturosa. Deixei de frequentar o carnaval da minha terra por causa da
baixaria musical dos últimos anos. Credita-se a mediocridade musical à axé
music, mas um dia parei para observar e vi que não tem nada a ver. A axé music,
invenção de Luiz Caldas, foi concebida com ritmo, harmonia e letra dentro dos
padrões carnavalescos. Eram melodias trabalhadas, afinadas, dançantes, mas
depois que os próprios artistas passaram a controlar as gravadoras e a mídia,
se esqueceram do que era a música. Qualquer coisa que fizessem, bastava tocar
no rádio, aparecer na tevê, que era sucesso garantido. Foi assim que a bunda da
Karla Perez sobreviveu a tantos carnavais.
Finalmente chegamos aos
finalmentes. Antes do ano novo recebi o cd de música carnavalesca baiana, tão
cantado em prosa e verso. Reuni a família na sala para ouvir o novo ritmo que
estava “bobando”, segundo um amigo. Devo confessar que coloquei o cd no
aparelho sem a curiosidade de olhar a track-list, e, por causa desse pequeno
descuido, os vizinhos chamaram a polícia mal acabara de ouvir a primeira música.
Cito aqui o nome de algumas
músicas que estão bombando na minha terra: “Dança do enfia o dedo”, “largar de
barriga”, “tchu, tchu, baranga”, “aquecimento do bumbum”, “po... po... popozão”,
“as magrinhas que fazem gostoso” e “pegando a tua irmã”.
Fiz planos em passar o
carnaval em Salvador, mas, diante desses clássicos musicais, tive que
desarrumar minha mala das ilusões, agravado também pela beleza que será o
desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro. Pensei alto: “Vou ter que
passar o carnaval fora do Brasil. Vou pra Sergipe!”
– Sergipe é no Brasil, mané!
– disse minha cara metade, que tem o dom de ler meus pensamentos.
– Então vou pra Aracajú!
MORAL DA HISTÓRIA: Nunca
pensei que um dia sentiria saudades de Luiz Caldas no carnaval da Bahia.
4 comentários:
Fantástico! Melhor ficar aí mesmo em Maceió. Do jeito que a coisa anda, a "bundamusic" já se espalhou pelo mundo!
Muito boa Tom, com belo humor e critica como convem ao ver o rei nu.
Musica na Bahia não há,apenas ritmo e mexe bunda.
Nossos cantores estão o Rio,aqui só de passagem para ver familia.
Fica em Maceió ou vai para o interior ali acima de Inhambupe que é melhor.
Um abração amigo e desce mais uma da boa.
Feliz 2013!!!
É, meus queridos, em Maceió, uma semana antes, tem o Jaraguá folia, que termina no domingo, com o Pinto da Madrugada na Pajuçara. Pelo menos ainda é o carnaval dos meus tempos, com todos os efes e erres. Só frevo e marchinhas.
Arrasou, meu mestre. Mais uma vez.
Grande abraço e, no +,MÚSICAEMSUAVIDA!!
Postar um comentário