Reza
a lenda que, durante os treinos dos times onde atuou, o jogador Gerson de
Oliveira Nunes conduzia a bola até uma das laterais do campo, dava uma tragada
no cigarro que um dos auxiliares lhe oferecia e, com precisão milimétrica, fazia
um lançamento para um dos companheiros marcar o gol. Exagero à parte, Gérson
fumava como um alucinado, o que não o impediu de ser um dos mais brilhantes
meios-campos do futebol brasileiro. Na vitoriosa seleção de 70, ficou conhecido
como “o Canhotinha de Ouro”. Além de fazer gols essenciais, fez lançamentos
primorosos. Incensado e festejado pela imprensa, Gerson foi convidado para
fazer propaganda de um cigarro ordinário
cujo nome era Vila Rica. No
comercial, o jogador afirmava: “Leve vantagem você também. Leve Vila Rica”.
Não se sabe exatamente quanto o atleta
faturou com o comercial, mas, ainda hoje, aos 71 anos de idade, Gerson paga um
preço muito alto pela propaganda infeliz. A partir da peça publicitária, que
sugeria ladinice, inventou-se a famigerada “Lei de Gerson”, uma espécie de lei
da malandragem, da esperteza, da falta de escrúpulos. Com a palavra o jogador: “Não me arrependo de ter feito o
comercial do cigarro Vila Rica. Faria
tudo de novo. Fiz uma propaganda para um cigarro novo. Todo mundo sabia que eu
fumava e então fui convidado. Todo cigarro era igual, mas esse era mais barato.
E a vantagem estava somente nisso. Daí um idiota qualquer modificou o sentido e
disse que eu queria levar vantagem em tudo, criando a Lei de
Gerson” (Revista Alfa – março de 2013). Em defesa do jogador, convém
lembrar que, à época, fumar, vício hoje
satanizado, era sinônimo de virilidade. Para
que as mulheres não se sentissem discriminadas,
os mercadores da morte lançaram o cigarro Charme.
Fumar era a regra.
Um pouco tarde, por força de lei, o
cigarro foi expulso do campo da publicidade, e os resultados já se fazem
sentir: o brasileiro está fumando menos e, consequentemente, morrendo menos das
enfermidades provocadas pelo fumo. Mas o esquema de jogo do capitalista não foi
alterado: saiu a nicotina, entrou o álcool com força total. Como diria um
ex-presidente, “nunca antes na história desse país”, se bebeu tanto. A moçada
está começando cada vez mais cedo e bebendo cada vez mais.
E quem é o garoto-propaganda mais ativo
no “mercado etílico”? O rotundo Ronaldo “fenômeno” que, com ar de mafioso,
conclama a moçada a integrar o clube dos consumidores de cerveja, contribuindo
para “melhorar o futebol brasileiro”. O que não entendo, por mais que me
esforce: é o que leva um cidadão que já conquistou tudo – fama, dinheiro, louras
oxigenadas e até travestis – a fazer um comercial desse tipo. Ronaldo, como
ex-jogador, deveria acrescentar: entrando
para o clube dos consumidores de cerveja, não há a menor possibilidade de você
conquistar, em campo, o que conquistei. Em vez disso, limita-se a perguntar
ao Cafu se ele tem um copo. O ex-capitão da seleção brasileira responde: “Só
taça”, abre o paletó e exibe um troféu. Como se o álcool fosse um produto inofensivo, todo mundo ri.
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