domingo, 14 de outubro de 2012

Criança tem cada uma...



Viu o pai dar carona a vizinha e no meio do caminho parar o carro e falar:

- Ou dá ou desce!

Ela não se fez de rogada: deu um safanão na cara dele e saiu a dizer palavrões. Mais tarde, o garoto deu carona a uma coleguinha na sua bicicleta, parou na calçada e disse:

- Ou dá ou desce!

A coleguinha não titubeou:

- Eu dou!
- Então espere aqui que eu vou perguntar ao meu pai o que é que faço agora.

sábado, 13 de outubro de 2012

Luís Pimentel - Ary na aquarela carioca



     Um dos maiores cariocas de todos os tempos não era carioca. Era mineiro, de Ubá, nascido num mês de novembro (dia 7), em 1903. Se vivo estivesse, no próximo ano completaria 110 primaveras musicais.  Homem de mil instrumentos – foi pianista de cinema, cronista, locutor de rádio, jornalista, advogado, vereador na Câmara Municipal do Rio e, sobretudo, compositor, Ary levou a música brasileira para diversas partes do mundo.

     O grande sucesso de Ary Barroso é de 1939. Temperada com “mulato inzoneiro”, “merencória luz da lua”, “fontes murmurantes”, “coqueiro que dá coco”, “Brasil lindo e trigueiro” e outros condimentos exóticos, a famosa Aquarela estourou no Norte. E também no Sul, no Sudeste, no Nordeste e até nos Estados Unidos, graças a um tal Mr. Disney. O desenhista norte-americano Walt Disney veio ao Brasil produzir um desenho animado tropical – Alô, amigos – com o personagem Zé Carioca. Aquarela do Brasil foi escolhida como fundo musical. Depois, Ary conseguiu emplacar, na mesma fita: Você já foi à Bahia?, Os quindins de iaiá e No tabuleiro da baiana. Pouco depois, já bastante famoso, estava nos Estados Unidos, onde musicou diversos filmes em Hollywood, participou de festas memoráveis ao lado de Carmen Miranda e retornou ao Brasil resmungando a ausência do Flamengo, seu time do coração.

     Duas atividades distintas também se encarregaram de fazer o Brasil amar Ary Barroso, além da música: a narração esportiva e a animação dos programas de calouros. Na primeira, ficou famoso entre geraldinos, arquibaldos (o público da geral e das arquibancadas) e radiouvintes pela gaitinha-de-boca usada para os gols e por sua paixão rubro-negra, responsável por desatinos como abandonar o microfone para comemorar as vitórias no gramado, ao lado de dirigentes e jogadores. Da segunda atividade ficaram, nos anais das emissoras de rádio, as broncas homéricas em candidatos a cantores. Muita gente hoje famosa levou espinafração ao vivo de Ary Barroso.

     No carnaval de 1964 a Escola de Samba Império Serrano escolheu como enredo o tema Aquarela Brasileira, cujo samba-enredo, de Silas de Oliveira, começa assim: “Vejam essa maravilha de cenário/É um episódio relicário/Que o artista num sonho genial/Escolheu para este carnaval/E o asfalto, como passarela/Será a tela do Brasil em forma de aquarela”. Pouco antes de a escola pisar na avenida, chegou a notícia: Ary Barroso morreu. Quem assistiu garante que a Império conseguiu, apesar de tudo, fazer um belo carnaval.

      Em 2004 a Império Serrano desfilou com o mesmo samba-enredo, homenageando os vinte anos do Sambódromo.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Antonio Torres em "Conversa com o Autor", na Casa da Leitura

Montagem do blog http://novaspensatas.blogspot.com.br

Nizan Guanaes - A Verdadeira Baianidade



 
Não gosto quando se referem à Baianidade com o estereótipo da preguiça.

Da falta de sofisticação.

Pierre Verger fotografou a Bahia, e os corpos que ele retratou são peitos, troncos e bundas enrijecidas pela história e pela vida dura.

São homens açoitados pela escravidão. A Bahia é graça, prazer, leveza, mas ela é também luta.

O Brasil ficou independente com um grito em 1822. A Bahia teve que lutar, morrer e vencer para expulsar de vez os portugueses em 2 de julho de 1823.

Castro Alves, o maior poeta brasileiro, morreu aos 24 anos, deixando uma obra imensa. Ou seja, trabalhou muito para deixar tanto em um tempo tão curto de sua existência.

Todos os anos o povo da Bahia anda 12 quilômetro com potes de água na cabeça para lavar as escadarias de nosso pai, Oxalá.

No Carnaval baiano, enquanto milhões se divertem, milhares trabalham dia e noite cantando, tocando, vendendo, para que o nosso povo e gente de todo o mundo possam se divertir.

Além disso, quem construiu todas aquelas igrejas, aqueles fortes, monumentos? Nós. Quem colocou cada pedra no Pelourinho? Nós. Quem foi açoitado no tronco que deu ao Pelourinho seu nome? Nós.

Quem escreveu músicas, filmes, encenou, pintou, esculpiu parte significativa da produção artística deste país? Ano após ano, década após década? Nós, os baianos.

Joana Angélica, Maria Quitéria são ruas no Rio de Janeiro, mas na Bahia são sofrimento, luta e heroísmo.

A Bahia é luta, mas ela compreende que a vida não é só isso. E não é.

E é por isso que essa tal Baianidade atrai em todas as férias e feriados estressados de todo o mundo.

Na costa da Bahia, o melhor conjunto de resorts do Brasil foi construído para que você possa experimentar o melhor da vida, e a gente trabalha enquanto você descansa.

O reitor Edgard Santos, baiano de boa cepa, fez uma das significativas obras de produção acadêmica e cultural, com contundente dedicação.

Lamento que a Bahia seja tão amada, tão exaltada e tão pouco compreendida.

Todos aqueles coqueiros e boa parte das frutas e especiarias que a Bahia tem não nasceram ali: vieram de outras índias e foram plantados pelas mãos calejadas do povo da Bahia.

Mas o mundo é de percepção. E, lamentavelmente, as novas gerações, por incompetência nossa, herdaram a parte mais vulgar, mais inculta, mais básica e folclórica desta baianidade.

Cabe a nós, os velhos, passarmos pela tradição oral, que é de fato Baianidade.

E lembrar a quem dança na Bahia que, enquanto ele dança, alguém toca. Que enquanto ele reza, alguém constrói igrejas.

Ou seja, na Bahia o trabalho é voltado para o lazer e encantamento do mundo.

E toda vez que você chegar estressado e branco e sair moreno e feliz, chegar descrente e sair otimista e apaixonado, nosso trabalho, nosso papel no mundo estará sendo cumprido.

Baianidade é enfrentar a dura vida de uma maneira que ela pareça menos dura e mais vida.

E para que exerçamos a plena Baianidade, é preciso que entendamos plenamente do que é que somos orgulhosos.

Sou orgulhoso da Bahia mãe de Menininha, Cleusa, Carmem, Stella, do grande Obarain e de Padre Sadock, Padre Luna e Irmã Dulce.

Sou orgulhoso da Bahia de Ruy Barbosa, Glauber, ACM, Luis Eduardo, Jacques Wagner, Waldir Pires - estilos diversos da mesma paixão baiana que nasceu no 2 de julho.

Sou orgulhoso de Gil, Caetano, Bethânia, Gal, de Jorge, meu amigo amado.

Sou orgulhoso de Caribé, Verger, Lícia Fábio, que não nasceram na Bahia, mas a Bahia nasceu deles.

Sou, enfim, orgulhoso dos filhos da Bahia. E por isso sou tão orgulhoso do Brasil.

O Brasil é o maior filho da Bahia. Ele nasceu lá no dia 22 de Abril de 1500 e é por isso que os brasileiros ficam tão felizes quando vão à Bahia. Porque eles estão, na realidade, visitando os parentes, revendo suas raízes.
Baianidade é enfim o DNA do Brasil, é o genoma do país. Quando o Brasil vai à Bahia, ele volta para casa.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Laçamento de As Duas Guerras de Vlado, de Audálio Dantas

Depois que o Governo reconheceu que puxou o gatilho, ou que apertou a corda, ou que quebrou a cabeça, ou que matou de porrada, só faltava alguém com coragem suficiente para contar essa história escabrosa dos porões da Ditadura. Tenha você a coragem de mergulhar no submundo das masmorras onde um pequeno batalhão de carniceiros decidia, em nome do Estado, quem vivia e quem morria.
Abaixo, carta da Vanira Dantas, esposa do autor, informando dias, locais e horários dos lançamentos do livro.

"Amigos,
37 anos depois, Audálio Dantas relembra os dias de terror de 1975, quando Vladimir Herzog foi assassinado no DOI-Codi de São Paulo.
Seu livro “As duas guerras de Vlado Herzog” será lançado no dia 16 deste mês de outubro (uma terça-feira), a partir das 7 da noite.
Local: Auditório Vladimir Herzog, do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, de onde partiu a denúncia que levou a sociedade a dizer um basta à violência da ditadura militar.
Esperamos por vocês lá!
E no dia 25, no Rio, Livraria da Travessa, Leblon (convite anexo).
Dia 27 em Presidente Prudente (SP) e 30, em Vitória (ES).
Abraços
Vanira Kunc"


domingo, 30 de setembro de 2012

Cineas Santos - Notícias do verde minguante


No início da década de 70, a palavra ecologia ainda não tinha emprego corrente entre nós. Para muitos, era apenas um modismo ou uma seita sem maior importância. Os ecologistas não eram levados a sério. Não passavam de “propagadores de catástrofes”, ruidosos e inconsequentes. Em 1976, no lançamento do livro Ciranda, coletânea de poemas organizada por Paulo Machado, realizamos um show-protesto – Cenas Piauienses: o rio – com a participação de poetas, músicos, atores, fotógrafos e dos professores Dumbra, de saudosa memória, e Waldemar, recém-chegados a Teresina. Professor em vários cursinho, não tive dificuldade para lotar o Theatro 4 de Setembro: meus alunos compareceram em peso. A imprensa graúda não tomou conhecimento do fato, mas a comunidade acadêmica reagiu. Um dos sábios de plantão bateu duro: “Um grupo de Inconsequentes e irresponsáveis tenta transformar o Parnaíba em Tietê”. O tempo se encarregaria de mostrar que, infelizmente, tínhamos razão.  Até onde sei, foi a primeira manifestação ecológica que se realizou em Teresina.

No início da década de 80, fizemos outro protesto, desta feita, na Praça Pedro II com o título Primeiro Manifesto Ecológico do Piauí. Poetas, músicos, artistas plásticos e simples curiosos lotaram a praça. O foco era o verde da cidade. Paulo Machado e Fernando Costa bolaram um cartão bonito com os versos: “Viver-te/ver-te/verde cidade”. A imprensa deu boa cobertura ao evento que alcançou alguma repercussão. A partir de então, a palavra ecologia tornou-se uma espécie de panaceia capaz de “curar” todas as feridas da Terra. Nessa altura dos acontecimentos, entraram em cena os “ecologistas profissionais”, ou seja, os que passaram a ganhar dinheiro para não fazer o que fazíamos de graça.

O mais é sabido: nos últimos 30 anos, a cidade inchou, cercou-se de favelas e foi perdendo a cobertura que lhe dava o título de “Cidade Verde”.  A especulação imobiliária engoliu quintais, chácaras e clubes. Num ritmo frenético, rasgaram-se novas avenidas, construíram pontes e viadutos e os automóveis adonaram-se de cada polegada das ruas. Os rios  que abraçam a cidade converteram-se em escoadouro dos efluentes indesejáveis. Novidadeiro, o teresinense aplaude qualquer intervenção, por mais danosa que seja, desde que venha com a embalagem “moderno”. Estatísticas dão conta de que a cidade já perdeu 40% da sua cobertura vegetal. Falta-me autoridade para confirmar ou contestar.

No dia 21 do mês em curso, Dia da Árvore, fizemos outra manifestação, que se realizou na velha e sofrida Praça do Liceu. Mais uma vez, os poetas estiveram por lá, os músicos (Vagner e o Valor de PI), estudantes e alguns curiosos. A ONG + Vida disponibilizou 200 mudas de árvores regionais, alguns amigos mandaram mais algumas. A imprensa tratou o fato com o necessário respeito.

Curiosamente, as pessoas, com as exceções de praxe, não demonstram maior interesse pelas mudas. Uma senhora resumiu bem a questão: “Isso demora uma vida pra crescer”. Tem razão: para cortar uma árvore, precisa-se de uns dez minutos; para que uma árvore se torne frondosa, serão necessários, no mínimo, dez anos. Deixo aqui uma sugestão: na próxima manifestação, se houver: em vez de árvores, que se distribuam ventiladores e aparelhos de ar condicionado. Sucesso garantido. Enquanto isso, como peixes em lagoa rasa, os teresinenses continuarão queixando-se do “calor insuportável”. Brava gente!