Hoje é moleza ser feminista, segurar o mastro da bandeira nas passeatas com algumas reivindicações justas e legítimas, como o direito amplo e irrestrito ao orgasmo contínuo e múltiplo; algumas reivindicam demandas infundadas e absurdas, como a divisão das tarefas domésticas com os homens. Outras bandeiras denotam certo desprezo pela Criação e desfraldam um radicalismo exacerbado, lembrando os antigos camaradas xiitas do PT, na tentativa de moldar o mundo segundo suas convicções político-dogmáticas: simplesmente querem inverter a posição na cama, e o ativo passa a ser o passivo, seguindo o princípio oracional de São Francisco: é melhor dar do que receber.
Devagar com o andor que o santo é de barro. Voltando aos tempos do poder patriarcal dos senhores de engenho ou dos barões do café, as ditas feministas de hoje vacilariam frente a esses senhores que dominavam a economia, a política, a cultura, a vida e a alma dos brasileiros e que se casavam apenas para ter uma mulher para dar porrada, fazer filhos e tomar conta das mucamas. Eles podiam tudo, inclusive estuprar e matar as metidas a feministas.
Em 1789, tomada pelos ventos libertários, a Assembléia Nacional francesa aprovou a Declaração dos Direitos do Homem. Em 1791, embalada pelo lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” cravado na bandeira do ideário revolucionário, a escritora francesa Marie Olympe Gouze (Olympe de Gouges) lançou também o seu manifesto “Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã”. Pegos de calças-curtas, os nobres revolucionários acharam tal manifesto uma afronta à moral e aos bons costumes. Que significava aquilo? Revolução das calcinhas dentro da grande revolução dos cuecões? Lugar de mulher era na cozinha e assim deveria continuar. Quem lavaria a louça? Quem trataria do javali antes de ir à panela?
Olympe de Gourges, a primeira feminista da história, foi a julgamento em um tribunal predominantemente machista. O circo estava armado e ela foi condenada à pena capital, sob a acusação de “ter querido ser um homem de Estado e ter esquecido as virtudes próprias do seu sexo.” Foi guilhotinada em 1793 sem que nenhuma outra mulher tenha saído em sua defesa.
Desta maneira, ó simpáticas feministas burocráticas enclausuradas em amplas salas refrigeradas deste imenso gigante adormecido, dêem-me notícias das 129 tecelãs de Nova Iorque, vítimas da arrogância e da prepotência do poder econômico! Vós, que colocais o termostato do condicionador de ar no máximo para poder vestir o casaco de vison, talvez não saibais que o 8 de março não foi escolhido aleatoriamente para ser o dia internacional da mulher, apesar de que, neste solo pátrio, todo dia é dia de luta da mulher para ocupar um lugar ao sol. Saibam, ilustres senhoras, que esta data foi escrita com sangue e fogo.
No dia 8 de março de 1857, 129 tecelãs
Em 1910, na II Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, realizada na Dinamarca, a alemã Clara Zetkin propôs o dia oito de março como o dia Internacional da Mulher, em homenagem àquelas 129 mártires de Nova Iorque. A proposta foi aceita e nesse dia as mulheres do mundo todo se dão as mãos em busca de fortificar o movimento feminista, propondo o fim da hegemonia político-econômico-administrativa masculina, seguindo o lema dos compositores mineiros Beto Guedes e Ronaldo Bastos quando dizem “Vamos precisar de todo mundo / um mais um é sempre mais que dois”, se bem que esses versos foram escritos bem depois, o que não invalida o grito de guerra “Mulheres / unidas / jamais serão vencidas!” que encerrou a II Conferência na Dinamarca.
Proposições justas, por sinal, porém o movimento reivindicatório esbarra na própria instabilidade da vaidade feminina quando passa batom nos lábios frente a um espelho, no dia seguinte, e nos 364 que se sucedem até o próximo 8 de março; elas (as feministas e não as mulheres em si) são incapazes de se olhar fraternalmente como companheiras de luta e seguir um propósito comum; em vez disso, engalfinham-se feito onças-de-unhas-pintadas disputando um território selvagem, inaptas em abraçar a causa libertária e tornar suas reivindicações numa bandeira ideológica permanente.
Fala mais alto a vaidade histórica e cada uma mira-se no espelho com a desconfiança aguda de quem encara uma rival.
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