quinta-feira, 8 de abril de 2010

Democracia em farrapos, almas arruinadas - Cláudio Canuto



De Compro voto


Com a celeridade característica dos novos tempos, as eleições se aproximam mais uma vez. Com elas, os dublês mal-ajambrados de cientistas políticos, então submersos em sua faina cotidiana, emergem, proferindo com a experiência de um Nostradamus, seus vaticínios profundos como um pires. Com seus dotes de prestidigitador e cartomante, vociferam os prováveis futuros eleitos de candidaturas ainda não anunciadas, arvoram-se detentores legítimos de segredos doravante revelados pela força de suas profecias e pelas revelações de pesquisas eleitorais não realizadas. São os áulicos do poder, os lambe-solas, os goelas de aluguel.

Enquanto pregam isenção ética com o furor de um Napoleão em guerra, certos jornalistas venais buscam um troco oferecendo suas páginas dentro das conveniências do mercado, chamando de vossas excelências, bandidos comuns que se assenhorearam da fragilidade política de nossas instituições para enriquecimento ilícito.

Quanto aos postulantes eleitorais, é duro vê-los outra vez - imunes, pela força vacilante da lei, do último golpe, da última fraude, do último assalto - legitimados por esta massa ignara e disforme que os idealistas chamam povo. Na verdade, alheia ao processo político que lhes guiará o próprio destino. Estes eleitores, corruptos, vendem-se por dez tostões e entregam prazerosamente a seu algoz o chicote de sua própria sordidez e desonra, transformando-se em uma multidão humilhada, desdenhada, subserviente e sem a menor noção da real importância da titularidade do seu voto.

Alguns teóricos ainda encontram certa nostalgia romântica quando falam do povo, sobretudo como forma de representação política autêntica: “todo poder emana do povo e em seu nome será exercido”, ou como a grande promessa de um devenir histórico grandioso:”O povo unido jamais será vencido!”. Ambas as concepções ruem como um castelo de cartas graças ao poder dos cifrões. Esta multidão vai ofertar sua titularidade de representação eleitoral à escória social, aos insensíveis políticos carreiristas, por alguns tostões momentâneos e novamente mergulhar na miséria do seu cotidiano apenas suportável graças ao peso de décadas de privação e miséria, suas únicas heranças.

É doloroso antecipar que os grandes gatunos locais serão mais uma vez alçados a condição de autoridades incontestes, exercendo uma atividade que se esvaziou completamente, desfilando com soberba sua autoridade arrogante e plena de ignorância orgulhosa, colocados por força das circunstâncias a um palmo acima da lei e dos habitantes desta província condenada a sonolência e a insensibilidade.

A assembléia legislativa de Alagoas, um poder fundamental para o exercício pleno da cidadania, virou um valhacouto de salafrários, completamente desvirtuada de suas verdadeiras funções constitucionais. O judiciário os acoberta – o que os estimula -, e o executivo busca encontrar o seu apoio para o mínimo de governabilidade, em uma troca ilícita. Larápios, comandantes de órgãos estatais ineficientes , burocratas que se comprazem em infernizar os cidadãos.

Nós vivemos em um regime sob a égide do capital, que é avassalador, pois tudo pode comprar: glória, honra, poder, a representação divina, o perdão eclesiástico e, claro, o voto – assim como a fiança, este reconhecimento explícito de que a justiça tem um preço . Falsa pudica e morta de vergonha, esta lady dona de lupanar, vendou os olhos horrorizada com a sua própria transformação, evitando mirar-se no espelho onde, refletida, duplicada, impõe-se, tardia e falha, à prova da sua própria ignomínia.


Nota do Blog: Cláudio Canuto é jornalista e professor de Sociologia da Faculdade Integrada Tiradentes, e é o mais novo colaborador do blog.






2 comentários:

Unknown disse...

Melhor professor que já tive! diexará saudade em meu coração! sentirei falta da sua maravilhosa forma de nos ensinar a Antropologia da Saúde! Vá em paz professor! que Deus o guarde!

Tom Torres disse...

Infelizmente Deus precisou dele lá em cima. Na semana passada, reunidos aqui em casa, fazíamos planos para o futuro.