De zabumbeiro |
Apesar de o cansaço deixar seus músculos relaxados e o corpo pedindo cama desde cedo, o coronel Limoeiro não conseguia pregar os olhos, por mais carneirinho que contasse. Não bastasse os grilos escolherem sua janela para fazer sinfonia e os rasga-mortalhas piarem em prenúncio de noite de agonia, o som da zabumba no pé-de-serra chegava até seu quarto como se o zabumbeiro tocasse seu instrumento dentro de sua própria sala. Só havia um jeito de se conciliar com Morfeu:
– Zé da Bixiga!
– Inhô, patrão?
– Vá lá na casa do meu compadre Zé da Burrega e diga a ele pra parar a zabumba!
– É pra já, meu coroné!
Zé da “Bixiga” vestiu-se apressado, calçou as alpercatas de couro cru, pegou o facão, a garruncha, se benzeu e saiu em direção do forró. Uma hora depois retornou descabriado, contrariado. A zabumba continuava a toda altura.
– E aí, sêo José, o que foi que houve?
– Sabe, meu coroné, a festa tava tão boa qui tive pena de mandá pará!
– Tu não é de nada, cabra! De manhã a gente conversa. Chico Bala!
– Sinhô, coroné?
– Vá lá e dê cumprimento do mandado que esse molenga teve medo!
– Sim sinhô, coroné!
Chico Bala vestiu sua indumentária de pistoleiro, calçou as botas, colocou duas cartucheiras atravessadas nos ombros, pegou uma pistola, um punhal e uma espingarda, fez o sinal da cruz, abriu a porta e desapareceu na escuridão. Voltou mais rápido do que Zé da “Bixiga”. A zabumba continuava a ecoar caatinga adentro.
– O que é que houve, homem?
– Coroné, a festa tava tão animada qui fiquei cum pena de acabá cum ela.
– Vocês são um bando de covardes! Vou eu mesmo lá e quero ver quem vai me impedir de parar a zoada!
O coronel se vestiu a caráter, sob os protestos da mulher que temia uma rixa com seus compadres ou um tiroteio de última hora, ocasionando um mata-mata de lado a lado. Fazia anos que as famílias da região viviam em paz e o seu marido estava prestes a acender o estopim da discórdia.
Acompanhado de três capangas, o coronel desapareceu na escuridão, decidido a acabar a festa do compadre. Hora e meia depois retornou, cabisbaixo, cara de derrotado. A zabumba continuava mais alta ainda, como em provocação.
– Ôxente, home, tu num disse que ia pará a zabumba? Óia ela aí tocano...
– Mulher, tu sabe quem é o zabumbeiro?
– Num faço a menó idéa!
– É o capitão Virgulino Lampião!
Um comentário:
Muito boa,é mais facil mandar,que executar,podemos imaginar o respeito imposto por Lampião na sua caminhada.
Abraço Tom.
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