Começo 2012 – ano que vem à luz carregado de nuvens cinzas e de ameaças nada poéticas de final dos tempos – com uma crônica em versos: homenagem à poesia e àqueles que tem esperanças de que o futuro seja melhorzinho.
O velho está quieto e cansado.
Feito um animal, um burro de carga.
Está triste, está só e mal-amado.
Ninguém lhe redime, nada o absolve.
Nos olhos do velho, uma chuva fina.
No peito, neblina. Mormaço nas costas.
O velho não deve, não teme, não foge.
Mas identifica o calor nas veias:
como um descompasso, uma coisa feia.
O velho já teve a vida no braço.
Quando a luz se apaga, sonha dias antigos.
Uma calça curta, uma estrada inteira,
um carro de bois, certa pasmaceira,
um pai que era duro, um cão que era meigo,
um calor-castigo, porcos e galinhas,
enxada no ombro, espinhos na pele,
um cabrito enjeitado, que o velho-menino
tratava com zelo – mamadeira e carinho no pelo.
Quando o dia se acende, vem tudo de novo:
levanta em silêncio, caminha com modos,
Se lava com métodos, se enxuga com calma,
Se arrasta sem júbilos ao café com leite,
ao remédio certo, ao jornal sem cura,
ao final da fila, ao sinal da espera.
Vai à janela e contempla o céu, ainda o mesmo.
Não faz qualquer pedido de ano novo,
qualquer promessa.
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