“A literatura me levou ao Colégio Militar.
E foi esse colégio que me levou à literatura”, disse outro dia, numa
entrevista, o peruano Mario Vargas Llosa. O grande escritor contava que o pai,
assustado com os seus interesses lúdicos e pouco viris, temia que o filho,
dados às artes e à poesia, se tornasse gay. Resolveu interná-lo em ambiente onde
prevaleciam o excesso de disciplina e a ausência absoluta de liberdade. Para
combatê-los, o hoje Prêmio Nobel escrevia sem parar. O tiro de canhão saiu pela
culatra (ou “culetra”, com o pedido de perdão pelo trocadilho infame).
Lembra-me um pouco a história (ou anedota)
do Serginho, que quando menino vivia desenhando e costurando lindos vestidinhos
de boneca. Os pais não permitiam, porque “desenhar e costurar vestidos era
coisa de gay”. Na adolescência, Serginho queria ser bailarino. “Nem pensar! Isso
é coisa de gay”. O mesmo disseram mais tarde, quando ele falou que queria fazer
um curso para ser cabeleireiro. Resultado, hoje Serginho tem mais de trinta
anos, é gay, e não tem uma profissão sequer para se sustentar.
A razão é simples: Nada é só isto ou só
aquilo, porque como descobriu o inquieto Menino
maluquinho, do inquieto e brilhante Ziraldo, “todo lado tem dois lados”.
Livro infantil que publiquei há algum tempo, chamado História de dois lados, tem um verso que diz: “Esta história tem
dois lados: um que aponta prum lado, outro que aponta pro outro / O lado
direito é destro, o lado esquerdo é canhoto”. Falando para crianças numa escola
que o adotou, ouvi essa pergunta:
– Mas o lado esquerdo também pode ser
destro e o direito o canhoto. Não?
Fiquei olhando para o menininho, que
olhava para mim com a maior cara de sacana, expressão de “agora te peguei”, e
respondi o que me veio à cabeça na hora:
– Acho que sim, cara. Depende do ângulo de
quem está olhando.
Daí, formulei mais uma tese na vida. A de
que tudo no mundo depende do olhar, ou da intenção de quem está olhando (sejam
os pais do Vargas Llosa, do Serginho ou do leitor do Maluquinho). E me lembrei do
bom e velho Guimarães Rosa, em seu Grande
sertão: “pão ou pães, é questão de opiniães...”
Pois e não é?
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