Quando
eu era adolescente e sobrevivia por conta e risco do meu suor juvenil para
poder ter uns trocados para levar a namorada ao cinema, resolvi ser feirante na
feira livre de Alagoinhas. Comprei um megafone fiado, para pagar em
não-sei-quantas prestações semanais, e todos os dias apregoava meus produtos:
-
Ovo e uva boa de Jundiaí! Aqui, mulher bonita não paga!
A
propaganda é alma do negócio, dizia meu tio Edgard, dono de um armazém de secos
e molhados e meu principal (e único) fornecedor de mercadorias. Um dia
qualquer, como em qualquer dia, pisei em rastro de corno no caminho da feira. Mal
comecei a falar no megafone, recebi um safanão no pé do ouvido que fiquei zonzo.
Uma senhora esbravejou feito galo de briga:
-
Seu moleque safado, eu lhe dei essa ousadia de ficar tirando graça comigo?!
-
Eu?!
-
Sim... Você!
-
Mas o que foi que eu fiz?!
-
Me chamando de viúva boa!
-
Eu?! Só estou anunciando meus produtos: ovo e uva.
-
Você não conhece cacófato não, seu moleque! Diga o contrário: uva e ovo!
-
Desculpe moça, mas não conheci seu marido não... como é mesmo o nome dele? Ah!
Cacófato! A senhora deve estar me confundindo com alguém.
-
Deixa pra lá! Já vi que você é burro mesmo! – disse, e escafedeu-se no meio da
multidão de feirantes. E tudo continuou como dantes no quartel de Abrantes:
-
Ovo e uva boa de Jundiaí! Mulher bonita não paga!
-
Ei! Se é assim, eu vou levar a uva – falou uma jovem, caminhando na minha
direção.
-
Assim como, moça?
-
“Mulher bonita não paga”...
Realmente
ela era a “prinspa” que todo marmanjo queria, a nora que a minha mãe precisava,
mas eu não podia ficar no prejuízo. Eu e a minha língua! Pensei rápido:
-
Ah! Mas quem disse que a senhorita é bonita?
-
Meus pais, meus amigos, meus primos, todo mundo que me conhece...
-
E você se convenceu disso?
-
Foi.
-
E se eles estiverem mentindo para lhe agradar?
-
Estão não.
-
Como é que você sabe?
-
Sabendo, ora!
-
Então tá certo. Mas, pelo regulamento da barraca, você tem que provar que
realmente é bonita. Você já ganhou algum concurso de miss?
-
Não.
-
Já saiu pelada na Playboy? Ele & Ela? Penthouse?
-
Não.
-
Então leve esse cacho de uva como prêmio de consolação, porque a simples
palavra de pais e amigos não é o suficiente. Tem que ter documento oficial provando
a beleza.
Ela
fez beicinho de desconsolada, chupou a uva, gostou, comprou uma caixa, e no
outro sábado estava lá para jogar conversa fora. E de sábado em sábado essa
história só não terminou em casamento porque chegou um gaúcho de três facas vendendo
uva mais gostosa do que a minha.
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