domingo, 30 de junho de 2013

Luís Pimentel - Jesus de Nazaré

    Reencontrei Jesus dia desses, num barzinho. O conheci criança pequena e provinciana, no interior da Bahia.  Nascera de sete meses, em um dia 25 de dezembro, e foi um sufoco para escapar das mazelas de uma infância pobre – diarreias constantes e falta absoluta de leite nos peitos mirrados da mãe. O nome sagrado veio da promessa que os pais fizeram, nas preces pela salvação do filho. Como o homônimo famoso, o nosso Jesus também viera ao mundo em um lugar chamado Nazaré. No caso, Nazaré das Farinhas.

     Jesus era um menino atormentado. Pequenino, tinha o hábito de bater com a testa na parede, até sangrar. A quem perguntasse o porquê do autoflagelo, respondia: “Porque quando para é bom demais, é divino”. A mãe do menino também se chamava Maria, que nem a mãe do outro. E o pai era José. Mas não era nenhum carpinteiro pacato, capaz de puxar um burrico na travessia do deserto. O José de Nazaré das Farinhas era motorista de caminhão, gostava muito de uma cachaça e volta e meia dava uns sopapos na mulher. Jesus tomava o partido da mãe, e volta e meia também sobravam uns catiripapos para ele também.

     Jesus era um menino malcriado. Ao contrário do homônimo bíblico, jamais perdoou, só conseguia amar a comida e o dinheiro (que subtraía do pai) e afrontava os 10 Mandamentos também roubando bolas de gudes, desrespeitando pai e mãe e matando passarinho.

     Jesus era um menino surpreendente. A cena que ficou para sempre nas escrituras mundanas da cidade aconteceu numa véspera de Natal. Portanto, véspera do seu aniversário. Jogava bola com os amigos no campinho que tinha nos fundos de sua casa, quando a voz estridente de dona Maria, que não era nenhuma santa, ecoou nos dois travessões:

     – Jesus, capeta! Venha cá!

     Jesus odiava ser chamado de capeta. Também odiava que interrompessem a pelada:

     – Quiquié?! – berrou de volta.
     – Preciso que você vá até a padaria, comprar pão para as rabanadas do Natal e do seu aniversário!

     O capetinha pegou pesado:

     – Vou não! Não está vendo que estou ocupado com o jogo da bola? Por que a senhora mesmo não vai?

    Maria apelou, o que todo mãe faz nessa hora:

     – Ah, ingrato! Ah, mal-agradecido! Maldita hora que te carreguei nove meses no meu bucho.

     A resposta ficou no Alcorão de Nazaré, repetida por professores de história e guias turísticos:

     – Está alegando, minha mãe?! Está alegando?! Entre no meu bucho, que lhe carrego um ano!



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