Marquei minhas lembranças a fogo
No cume da minha memóriaOnde as serras represavam sonhos
E a liberdade batia asas.
Onde está o meu pai agora
Para me contar uma história
E me pôr na cama ao dormir na mesa
Depois de café moído a prosa?
João! Raimundo! Décio!
Acordem para rezar a ladainha
De Nossa Senhora e outros santos!
Kyrie Eleison!
Nininho, encangue os bois
E as meninas façam o café!
Hoje é dia santo,
Hoje é dia de São José!
"E o Anjo do Senhor, em tanta agonia,
veio anunciar-lhe a grande alegria.
Fala o Anjo Santo: Que fazes, José?"
A barra do dia avermelhou
É o sinal de Nosso Senhor:
Preparem a terra para o plantio.
Este ano a safra será boa!
E eu, menino de pés descalços,
Brincando na lama do terreiro:
Limpo de alma, sujo por inteiro.
Vai pegar defruço, menino!
Não peguei defruço,
Mas a safra foi boa.
Hoje não existe mais terreiro;
Meu pai se foi, minha mãe resiste.
Meus irmãos perderam-se pelo mundo
Em busca de água de moringa e de sombra.
Os amigos dissolveram-se nas estações
De um tempo que resiste ao Tempo.
E a liberdade além das serras
Debilitou-se na minha agonia.
Os meus sonhos foram enterrados
ao lado do meu umbigo utópico
No solo sagrado do curral,
Debaixo de sete palmos
Do esterco das vacas profanas
E da lama do leite do terreiro
Que me acolhia nos dias de chuva
E me aquecia nas noites de Verão.
Tom Torres
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