quarta-feira, 10 de março de 2010

TODOS OS SONS DA ALDEIA

Por Cineas Santos






É impossível saber que sonhos aninhavam-se na mente do menino Erisvaldo quando, encarapitado num jegue sestroso, percorria as veredas do Saco do Engano (hoje Santana do Piauí) onde nasceu. É possível que se contentasse em contemplar as aquarelas vivas produzidas pelas borboletas nos charcos d’água. É possível que sonhasse apenas com a fartura que os dedos das chuvas semeariam nos roçados. É possível que quisesse apenas saber o que se escondia depois do azul que se fundia ao cinza da caatinga... Mas um dia, Erisvaldo encontrou uma pequena cabaça de pescoço alongado, fez um furo no bojo e acrescentou uma liga de borracha, dessas de prender dinheiro. Nascia ali uma minúscula e tosca caricatura de violão. O menino fez vibrar as cordas daquele instrumento único e o som débil que produziu fez acordar Euterpe, deusa da música. Num átimo, sem que ele se desse conta, a música inundou-lhe a vida e o “condenou” a ser um dos maiores violonistas do Brasil.

Mas deixemos de literatice, que o objeto dessa arenga é outro: um comentário breve sobre a 6ª edição do Festival Nacional de Violão do Piauí (FENAVIPI), que se realizou em Teresina, entre os dias 25 e 28 de fevereiro do ano em curso. Para começo de conversa, hoje, o FENAVIPI é o maior festival de violão que se realiza no país. Quem o diz é Carlos Barbosa Lima, com a autoridade de quem conhece todos. Durante quatro dias, os amantes da boa música instrumental tiveram a oportunidade de ouvir, conviver e aprender com músicos do quilate de Tommy Emmanuel, Xufei Yang, Paul Galbraight, Fábio Zanon, Carlos Barbosa, Nicolas de Souza Barros, Roberto Corrêa, Henrique Annes, Nonato Luiz, Erisvaldo Borges, Franciel Monteiro, para citar apenas os mais famosos. Ao todo, foram 14 concertos, 8 oficinas e 4 shows, disputadíssimos, no Theatro 4 de Setembro. Acrescente a isso, o 6º Concurso Nacional de Interpretação Violonista, que acontece no decorrer do Festival, cujo vencedor, desta edição, foi o promissor Fábio Lima, de Curitiba.

As sementes do FENAVIPI foram lançadas em 1998 quando inauguramos o prédio da Oficina da Palavra e trouxemos a Teresina o violonista Turíbio Santos para “batizar” a casa. No rastro do mestre Turíbio, vieram Nonato Luiz, Toninho Horta, Hélio Delmiro, Guinga e outras feras. Pareceu-nos que estávamos estruindo talento com plateia pequena. Em 2004, decidimos criar o FENAVIPI, com dois objetivos: formar plateia para o consumo de música de qualidade e melhorar o nível dos músicos do Piauí. Em apenas três meses, organizamos e realizamos a primeira edição do festival, que já nasceu grande. Não falaremos das dificuldades para realizá-lo, por uma razão simples: quem tentou fazer algo parecido já as conhece; quem nunca tentou não vai acreditar. O certo é que, sob a batuta firme do Erisvaldo Borges, chegamos à 6º edição do FENAVIPI, com uma constelação de estrelas de raro brilho. Este ano, exageramos na dose, para alegria do público. Com o patrocínio da Prefeitura de Teresina, e apoio da FUNDAC e Casa do Cantador, fizemos o festival que a cidade merece. Quanto ao Erisvaldo Borges, se parasse agora (e não vai fazê-lo), já teria inscrito o seu nome na galeria dos grandes nomes da cultura brasileira. Não é pouco para o menino do violão de cabaça do Saco do Engano. Mas o garoto cresceu e quer muito mais.

Assim seja.



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