sábado, 16 de junho de 2012

Luís Pimentel - Mãos dadas

Eu tinha verdadeira adoração por ela. Um dia perguntou se eu não sentia vergonha pelo fato de ela ser puta. Eu disse você é feliz assim e isto me faz feliz, ou uma besteira dessas. Na verdade, não me incomodava nem um pouco, estava mesmo era me lixando pros seus draminhas. Ela fingiu acreditar e abriu o quebra-vento, depois balançou o cabelo prum lado e pro outro, como gostava de fazer quando saíamos de carro.

– Mas você tem vergonha de sair de mãos dadas comigo – ela disse.
– Claro que não – respondi.
– Então por que não passeia de mãos dadas comigo por aí?

     Comecei a ficar puto com aquele papo, sempre fico puto com esses papos, mas procurei não demonstrar:

– Sabe o que é? Acho a maior besteira andar por aí de mãos dadas ou de
braços dados. Não ando assim com ninguém, acho que nem sei andar desse jeito, não acerto o passo.
– Nem com a sua mulher você andava?
– Não.

     Eu disse que tinha verdadeira adoração por ela, mas que detestava aquela conversa. Sempre gostei muito de putas, mas detesto conversa de putas. Ou bebem demais e ficam escrachadas, abrindo as pernas fora de hora e dizendo palavrão, ou ficam com essa mania de mulherzinha, querendo andar de mãos dadas e de braços dados, fazer compras com a gente no shopping.

     Ela pegou uma escova enorme na bolsa e começou a ajeitar os cabelos, desarrumados pelo vento. Tinha cabelos bonitos, putas geralmente têm cabelos bonitos porque cuidam bem deles. Depois pegou o batom e começou a avermelhar os lábios.

– E à missa? Você iria à missa comigo? – perguntou.
– Claro que iria.
– Mentiroso.
– Não me chama de mentiroso. Vou à missa com você qualquer dia desses,
você pode até apostar.
– Qualquer dia desses, não. Vamos hoje – e tentou me beijar daquele jeito
que parecia beijo de cachorro, a língua para cima e para baixo, uma luva úmida no meu pescoço.
– Para.
– Tá vendo? Além de vergonha, tem nojo de mim.

     Eu disse que não tinha nojo coisa nenhuma. Ela insistiu que eu tinha nojo dela, por isso não gostava de beijo na boca nem de lambida no pescoço.

– Já disse que não tenho nojo de você, porra! – rosnei, batendo com a mão espalmada no painel do carro.

     Ela se assustou, me olhou até com medo, mas mesmo assim voltou ao lengalenga. Puta é foda mesmo:

– Então passeia de mãos dadas, me leva à missa, ao cinema, ao restaurante, me dá um beijo de novela.
– Não vejo novela.
– Então me dá um beijo de cinema.

Eu disse não enche o saco e ela berrou não fala assim comigo, seu cavalo.
Perdi de vez a paciência, meti o cotovelo nos peitos dela e gritei cala a boca agora, sua puta escrota. Ela disse cala a boca é o cacete e blasfemou que puta era minha mãe. Porra, logo minha mãe, a vaca não sabia mesmo com quem estava se metendo. Se tem uma coisa que não admito é que falem de minha mãe, desde pequeno, quando quebrei a cara de um colega de escola. O merdinha falou que minha mãe ficava na zona enquanto eu dormia.

     Segurei o volante do carro com uma mão e com a outra dei uma bofetada certeira. Ela chorou, xingou e gritou olha para a frente, seu débil mental. E quando olhei para a frente já estava enfiando o carro em cima do poste.

     Não foi por querer que direcionei para o poste o lado do carona. Não foi por cafajestada que salvei a minha pele e acabei com a vida da única mulher que talvez tenha amado na vida. Eu tinha, mesmo, verdadeira adoração por ela. Juro que se ainda desse tempo eu iria de mãos dadas com ela até para o inferno.

 

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