sábado, 11 de agosto de 2012

Cineas Santos - As múltiplas belezas do Poti


            Fazia um tempinho  que eu planejava ir a Buriti dos Montes, a 240 km de Teresina, para conhecer o Cânion do Poti, notável por sua insólita beleza. No final da semana passada, na companhia do cinegrafista Ezequiel Sá, resolvi encarar a árdua empreitada. Até Buriti, nenhum problema: “a estrada está um tapete”, como afirmam, orgulhosos, os nativos. Da sede do município a Conceição dos Marreiros, onde se encontram as famosas gravuras rupestres, as coisas se complicam. São pouco mais de 60 km de  carreiros, para usar a expressão adequada. Buracos, ladeiras, poeira e desolação. Sem um veículo 4X4 e um guia experiente, o aventureiro não chegará a lugar algum.

            Na empreitada, contamos com o apoio da Secretaria de Turismo de Buriti do Montes e com a experiência de Benedito Rubens, coordenador de turismo do município, que conhece cada palmo dos 180 km do cânion. Conhece mais: na década de 80, a pé e em botes infláveis, fez o percurso do Poti, das nascentes, no Ceará, à foz, em Teresina. Gastou exatos 65 dias. A aventura lhe rendeu centenas de fotos e um arsenal de histórias inacreditáveis. Pouco antes de Chegar a Conceição, Rubens nos advertiu: “Para onde vamos, não há energia elétrica, telefone, computador nem pousada com um mínimo de conforto. Ficaremos alojados no prédio da escolinha da comunidade”. Imediatamente me veio à mente o verso de Riacho do Navio: “sem rádio e sem notícias da terra civilizada”. Nosso guia não exagerou: Conceição dos Marreiros é um punhado de casas no meio do nada. Mas, para meu desespero, por volta das 21h, logo após nossa chegada, apareceu um cidadão numa caminhonete Hilux ,com uma caixa de som maior que a caçamba do veículo. E tome “ Ai! Ai! Ai!, assim você mata  o papai” e outras pérolas  da  canalhice musical que assola o país.  Para descansar o juízo, tivemos de pedir abrigo na casa de um dos moradores do povoado. A noite seguinte foi um pouco pior: alugaram um gerador, contrataram uma banda de forró de plástico e  consumiram rios de cerveja. Fugimos para outra casinha na periferia do arruado. Dormimos ( na verdade, passamos a noite ) sob uma latada,  curtindo  música brega, num frio de doer as articulações. Desolado, descobri que, hoje, estamos condenados ao emburrecimento compulsório onde quer que estejamos.

            A despeito disso, foi a aventura mais fascinante de que participei. Rubens, atencioso, competente e solícito, nos levou a sítios ainda pouco conhecidos onde existem as mais belas gravuras que já vi. Estima-se que aquelas inscrições tenham algo em torno de cinco mil anos de existência. Não são desenhos; são gravuras esculpidas nas rochas de arenito. Um laboratório de arqueologia a céu aberto. Independentemente da importância arqueológica dos sítios, o Cânion do Poti é magnífico, para dizer o mínimo.

            Ao contrário do que afirmou o poeta Dobal em “Apontamentos para um poema do rio Poty”, o sofrido “rio dos camarões” tem história, memória e, principalmente, belezas indescritíveis. É triste afirmar isso, mas é verdade: o Piauí não faz por merecer o que a Natureza nos deu de graça.

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