sábado, 10 de maio de 2014

Dia das Mães - Luís Pimentel



     No ano retrasado ele veio, ano passado não. Este ano, só Deus sabe se vem. Pensam que fico esperando? Espero que nem aquela porta espera, aquela mesa espera, aquela planta ali. Não faz nenhuma diferença ele vir ou não vir, com as tolas recomendações de sempre, as mesmas e falsas preocupações.

     Teve um ano que trouxe o filho. E o filho veio com a namorada. Dois jovens abobalhados, olhando para as paredes descascadas com curiosidade mórbida, me encarando com nojo e repulsa. Não aceitaram a água nem o guaraná que ofereci, com certeza por acharem que os copos não são lavados. Meu filho ainda aceitou a cerveja, talvez por saber que o álcool desinfeta tudo.

     A mulher não vem nunca com ele. Nenhuma falta me faz. Fico dispensada dos salamaleques, de fingir naturalidade, falando de doenças ou de novelas. Tão bem criado, tão mal casado. A última vez que ela apareceu aqui, veio direto do salão de beleza e manteve os dedos esticados, durante os minutos que durou a visita de médico, para não encostar a unha em nada. Meu filho mostrou o quarto onde vivia quando rapaz solteiro. Ela riu, cínica e sonsa. “Como é que alguém pode viver num buraco desses?”, devia estar pensando.

     Barulho no portão, só pode ser ele. Lá vêm flores murchas, presente ordinário, casaco de lã ou meias de nylon, garrafa de vinho de padaria, adocicado e enjoativo, pacotinho de torradas que eu não comia nem no tempo que tinha dentes. Vai se sentar no sofá que está forrado desde cedo e estirar as pernas no banquinho que só sai do quarto quando ele vem aqui. Claro que não vai demorar, pois tem compromisso com o filho ou com a mulher. Pouco se me dá que venha ou não venha, fique ou não fique.

     Não era ele no portão. Apenas um vendedor de frutas. Pela hora, duvido que ainda apareça aqui. Melhor dobrar e guardar o lençol novo que coloquei no sofá, não quero que pegue poeira. Melhor devolver para o quarto o banquinho de estirar as pernas. Ano que vem pode precisar.




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