quinta-feira, 10 de maio de 2012

Luís Pimentel - Ciro Monteiro, um carioca em tempo integral

Ele faria 99 anos neste maio de 2012. Ano que vem tem centenário, e esperamos que as comemorações sejam mesmo de primeira linha, como merece este artista que foi um dos maiores cantores brasileiros – no gênero samba, foi seguramente o melhor entre os melhores, aí destacando-se Roberto Silva, Jorge Veiga, Blecaute e Noite Ilustrada. 

Ciro Monteiro, conhecido no meio artístico e entre os amigos como Formigão, foi um carioca em tempo integral, nascido no bairro do Rocha, no Rio de Janeiro, cidade onde morreu 60 anos depois. Virou cantor por influência de um tio, o maestro Nonô, e o primeiro sucesso pipocou em 1938, quando gravou Se acaso você chegasse (que ele chamava de “meu hino nacional”), criação imortal de um compositor gaúcho também iniciante chamado Lupicínio Rodrigues. 

A voz suave e encorpada, cheia de ginga, bailando na síncope musical, caiu feito uma luva para os compositores de sambas. Daí para frente, vieram gravações espetaculares de obras de Roberto Martins, Mário Rossi, Ary Monteiro e Wilson Batista, fazendo com que Ciro conquistasse definitivamente o Brasil em 1942, com a gravação do samba Falsa baiana, do mangueirense Geraldo Pereira. Tornou-se quase que intérprete oficial de Geraldo, gravando também o grande sucesso Escurinho. 

Flamenguista dos mais apaixonados, o Formigão tinha o hábito de presentear com uma camisetinha do clube do coração cada filho de amigo que nascia. E sentia prazer especial no gesto quando o pai torcia por outro time do Rio de Janeiro, como foi o caso do compositor Chico Buarque. Torcedor fanático do Fluminense, Chico foi presenteado com o manto sagrado do Mengão quando nasceu sua primeira filha e devolveu o mimo a Ciro com um samba lindo, chamado Receita para virar casaca de neném (“Amigo Ciro/Muito te admiro/Meu chapéu te tiro/Muito humildemente. Minha petiza/Agradece a camisa/Que lhe deste à guisa/De gentil presente/Mas, caro nego/Um pano rubro-negro/É presente de grego/Não de um bom irmão...”).

Ciro Monteiro gravou ainda obras-primas como Beija-me (Roberto Martins e Mário Rossi, 1943), Botões de laranjeira (Pedro Caetano), Meu pandeiro (Luiz Gonzaga e Ary Monteiro), Rosa Morena (Dorival Caymmi), O amor e a rosa (Pernambuco e Antonio Maria), A mesma rosa amarela (Capiba e Carlos Pena Filho), Emília (Wilson Batista e Haroldo Lobo), Filosofia (Noel Rosa), Izaura (Herivelto Martins e Roberto Roberti), Jura (Sinhô) e Rugas (Nelson Cavaquinho, Augusto Garcez e Ary Monteiro. 


quarta-feira, 9 de maio de 2012

Caiu a máscara de certos jornalistas éticos

Vai dia, vem dia, e a Editora Abril não se cansa de me mandar cartas ou de telefonar na tentativa de me fazer voltar a assinar a Revista Veja, cancelada na primeira eleição de Lula, em 1988. Hoje mesmo recebi uma, com abatimento de 50% no preço da assinatura. Apelam para o sentimental, lembram que desde os anos 70 eu era assinante e patati e patatá.

A Veja era uma revista que merecia confiança, mas quando se meteu na política partidária deixou a ética de lado e passou a usar do sectarismo partidário. Agora ficou comprovado que eu tive meus motivos para desconfiar da neutralidade de suas manchetes. Os grampos do Carlinhos Cachoeira mostram que era o mafioso goiano quem fazia a pauta semanal da revista. Vejam esta reportagem de Afonso Mônaco para o Domingo Espetacular, da Record. É de arrepiar a relação da revista com o homem que está causando o maior escândalo nas hostes políticas e deixando o Brasil boquiaberto com as relações perigosas do crime organizado com os três poderes da República e agora, com a imprensa. Não deixe de assistir.




terça-feira, 8 de maio de 2012

As duplas de dois de nossa música

A minha ignorância musical virou tema em mesa de boteco. Os meus amigos não me perdoam por eu não saber, até a semana passada, da existência de uma dupla sertaneja chamada Pedro Leonardo. Agora, depois do acidente com o garoto que não sei se é o Pedro ou se é o Leonardo (seria apenas mais um acidente automobilístico se não fosse ele uma dupla sertaneja), confesso que fiquei expert nessa modalidade musical, porém continuo sem conhecer a rica discografia de tão afamada dupla.

Não se trata de preconceito tipo a do DEM que queria embranquecer as universidades. Para a extrema direita brasileira, o voto do branco vale dois votos do preto, porque, apesar de ser a maioria, o preto não vota no branco. Nem em branco. E no DEM só tem sangue azul. Demóstenes Torres é o seu maior exemplo.

Em matéria de música sertaneja, sou ignorante mesmo. Tão ignorante que somente no ano passado fiquei sabendo que Sandy é uma garota e Júnior é um garoto. Uma dupla de dois. Tinha certeza de que era um nome só: Sandy Jr. Conheci apenas a primeira dupla, os pais, Chitãozinho e Xororó, porque, quando eles começaram a cantar, Sílvio Santos lhes deu uma canja em um programa aos sábados na TVS, chamado “Sertanejo”, e não havia como escapar do chororô, dos trêmulos e vibratos da dupla: o sábado era o dia de almoçar com uma tia e ela só sentava à mesa assistindo a esse programa. A opção para não assistir era ficar com fome, mas quem se arriscava?

Enquanto o rádio nos legou gente da estirpe de Ary Barroso, Orlando Silva, Almirante, Noel Rosa e tudo de bom que aconteceu na chamada música popular brasileira, o mesmo não podemos dizer da popularização da televisão, principalmente nas últimas décadas. Até as duplas de dois da era do rádio eram coisas decentes, como Tonico e Tinoco, Jararaca e Ratinho, Irmãs Galvão, Duo Ciriema e até a dupla chinesa Milionário e José Rico. Essa dupla era um sucesso na China, mas como na China de Mao Tsé Tung o capital não mandava, o cachê era pago com um “Deus lhe pague”. Por pouco eles não mudaram o nome da dupla para Miserê e Pé Rapado.

No início da era das micro-ondas da televisão até tivemos ótimos festivais de música, de onde saíram a maior parte do que se salva hoje, embora os milicos tenham deixado muitas gargantas em silêncio. Com o passar das décadas, a televisão passou a usar o processo de idiotização do povo e a vender jabá para as gravadoras e com isso enterrou de vez a música popular brasileira e em seu lugar surgiram as joelmas, psiricos e michéis telós no nosso dia a dia.

Antigamente até as novelas ordinárias se esmeravam para apresentar uma trilha sonora de qualidade. Hoje, além da indiscutível falta de conteúdo no enredo, a banalização do mau gosto musical contamina a nossa parca erudição no intervalo entre o entretenimento e o noticiário.

Até na novela das oito, o chamado “horário nobre”, o refinamento foi para o espaço e a excentricidade musical dos novos dramaturgos deixa-nos a suspirar de saudades de Janete Clair e Dias Gomes.

Mas, voltando ao acidente no começo da conversa, no mesmo dia que a dupla Pedro Leonardo se acidentou, um juiz alagoano decretou a prisão, entre outros, de dois coronéis da PM, um capitão, um delegado tido como incorruptível, e – pasmem! – um General de Exército, todos eles acusados de corrupção e improbidade administrativa na Secretaria de Segurança Pública das Alagoas. Diante de tantos peixes graúdos detrás das grades, a imprensa nacional não deu um pio a respeito, nem mesmo notícia de rodapé. Mostrar o povo rezando ou garoto entregando bilhete aos parentes do acidentado tem mais a ver com a cor da nossa imprensa. O governo alagoano é do PSDB e o general em questão um filiado do DEM baiano, onde serviu fielmente aos interesses escusos do carlismo e onde colecionou uma longa lista de processos do Ministério Público da Bahia. Tanto lá quanto cá, ele foi secretário de Segurança Pública e baixou o índice de criminalidade escondendo os corpos debaixo do tapete, mas isso é coisa sem importância para uma imprensa que usa pena de tucano como caneta-tinteiro. 


Ibys Maceioh no Sr. Brasil

Demorou, mas saiu. É que, ao contrário do que afirmou Fernando Henrique Cardoso, o trabalhador brasileiro trabalha mais quando pendura as chuteiras do que quando está na ativa. Se há uma conta a pagar... chama o aposentado. Se não tem ninguém pra dirigir... chama o aposentado. Se a fila tá grande... chama o aposentado. Pra levar o filho na escola... chama o aposentado. Pra levar alguém da família ao médico... chama o aposentado. Finalmente hoje pude sentar sem pressa ao computador e editar o programa Sr. Brasil, de Rolando Boldrin, onde o amigo Ibys Maceioh fez uma excelente apresentação. Agora, se você viu na tevê, reveja. Se não viu, eis a oportunidade de ver.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Sérgio Ricardo na ABL



‘MPB NA ABL’ APRESENTA SÉRGIO RICARDO NO ESPETÁCULO ‘FÚRIA E PAIXÃO’, UMA HOMENAGEM AOS  SEUS 80 ANOS

O espetáculo terá a intermediação do musicólogo Ricardo Cravo Albin, também produtor do show, e a participação dos filhos do homenageado, Marina Lutfi (voz) e João Gurgel (violão)

A Academia Brasileira de Letras (ABL) dá prosseguimento à temporada de 2012 da série “MPB na ABL” com a apresentação do cantor compositor, cineasta e artista plástico Sérgio Ricardo, uma homenagem, aos seus 80 anos de nascimento. O show, denominado Fúria e Paixão, será conduzido em cena pelo musicólogo Ricardo Cravo Albin e passará em revista a vida e a obra do homenageado, que terá no palco a companhia de seus filhos, Marina Lutfi (cantora) e João Gurgel (violão). O evento está programado para o dia 09 de maio, quarta-feira, às 12h30min, no Teatro R. Magalhães Jr., 280 lugares, na sede da ABL – Avenida Presidente Wilson, 203, Castelo. Entrada franca.

De acordo com o apresentador Ricardo Cravo Albin, Sérgio Ricardo se fará acompanhar ao piano e também falará de sua histórica passagem, aos 80 anos, pela MPB, pelo cinema e pelas ideias políticas: “Entre tantas recordações, Sérgio Ricardo abordará seu começo no Rio de Janeiro nos anos 50; sua música Zelão, que nos melhores tempos da Bossa Nova chamava atenção para os problemas sociais do país; seus filmes, sobretudo Juliana do amor perdido, mais reconhecido no exterior do que no Brasil; e suas trilhas sonoras, sobretudo cantando o “Se entrega, Corisco”, sua parceria com o amigo Glauber Rocha para o clássico “Deus e o diabo na terra do sol”.

Ainda segundo Ricardo Cravo Albin, Sérgio Ricardo falará também sobre sua polêmica participação no célebre Festival de 1967, em que arremessou o violão para a plateia, ao ser impedido de cantar Beto bom de bola, “mote para se referir aos horrores da censura política sobre as obras de arte”.

Serviço:

ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS
MPB na ABL
(homenagem aos 80 anos do cantor, compositor e cineasta Sérgio Ricardo)
Espetáculo: “Fúria e paixão”
Músicos: Sérgio Ricardo, Marina Lutfi (voz) e João Gurgel (violão)
Apresentação do musicólogo Ricardo Cravo Albin, também produtor do show
Patrocínio Petrobras
Data: 09 de maio de 2012, quarta-feira, às 12h30min
Teatro R. Magalhães Jr., 280 lugares
Avenida Presidente Wilson 203 – Castelo
Entrada franca
www.academia.org.br/
Telefone: 3974-2500

terça-feira, 1 de maio de 2012

Cineas Santos - Olhares desconfiados

Há coisa de dez anos, conheci um casal carioca que, ao visitar o Piauí, perdeu-se de amores por Teresina e aqui fincou raízes.  Ele, ex-funcionário da Petrobrás; ela, professora aposentada. Filhos crescidos, situação financeira confortável, os dois podiam dar-se ao luxo de morar em qualquer lugar do país. Optaram pela Chapada do Corisco.

            Certa feita, o cidadão me disse: “Professor, a paisagem humana do Rio de Janeiro estava me fazendo muito mal. A tão decantada cordialidade do carioca tornou-se uma falácia. Todos olham a todos com muita desconfiança. Pelo menos para mim, é impossível viver num lugar assim. O que mais me fascina em Teresina é a hospitalidade dos teresinenses, o jeito sossegado de agir e o olhar de quem confia”. A ex-professora encantava-se com a cadeira de espaguete na calçada: “Que cena mais bonita! Gente sentada na porta das casas, conversando, olhando a vida. Isso reforça os laços que caracterizam uma comunidade”, afirmava.

            O tempo e os contratempos nos separaram: perdi o casal de vista. Na semana passada, encontrei-me com o cidadão. Ao me ver,  não se conteve: “Professor, o que fizeram com a nossa cidade? Foram necessários mais de 40 anos para que se desconstruísse o tecido comunitário do Rio de Janeiro. Aqui, isto se fez em menos de dez...” Indescritível o ar de desencanto do cidadão. A mulher, segundo ele, voltara ao Rio no início do ano. Impossível convencê-la a permanecer em Teresina. “Se é para viver ‘protegida’ por cercas elétricas, enfrentando engarrafamentos, olhando as pessoas com medo e desconfiança, volto para a minha cidade onde, pelo menos, a paisagem física continua linda”, sentenciou. Meu amigo está vendendo o que construiu aqui e pretende voltar também.

            Sem saber o que dizer, brinquei:  feliz de vocês que têm a opção de voltar para sua cidade de origem. Eu também faria o mesmo não fosse o meu Campo Formoso apenas uma metáfora boiando na memória. Gostando ou não, estou condenado a viver na Chapada. Já não tenho idade nem disposição para começar nenhum projeto de monta. Abracei-o e desejei-lhe boa sorte.

            Minhas irmãs, meus irmãos, permitam-me o desabafo: decididamente, não aprendemos nada com os erros cometidos pelos outros. Teresina segue, impávida, copiando o que há de pior nas grandes cidades brasileiras. Exemplos? Os dois rios que abraçam a cidade foram transformados em escoadouros dos efluentes que produzimos; quintais são engolidos por supermercados; casarões seculares transformam-se em estacionamentos, e os automóveis disputam cada polegada de chão com a fúria de mil demônios. Poluição, violência, medo e olhares desconfiados. Sem querer ser pessimista além da conta, fecho com o poeta: “Tenho pena dos que vão nascer”.
           

           
           

domingo, 29 de abril de 2012

Por que hoje é domingo...


Hoje é domingo, do pede cachimbo, mas com tanta lei antifumo vigorando por aí, fui obrigado a parar de fumar. Isso faz muito tempo, ainda quando se recitava essa cantilena domingueira para as crianças e os maços de cigarro não estampavam aquelas fotos horrorosas que têm hoje. Para mim, a pior delas é aquela advertência de que "fumar causa impotência sexual". Terrível! Que graça tem a vida aos olhos de um impotente? Ver a fruta e não poder sentir o sabor deve ser a pior das torturas. E não pode nem dar a desculpa da raposa na fábula da raposa e as uvas: “Estão verdes!” 

Ainda bem que deixei de fumar a tempo.

O primeiro morto que eu vi, não fumava, mas tinha algo a ver com a tal mensagem do Ministério da Saúde nos maços de cigarro. A princípio era só um morto estirado no caixão e os bochichos no velório. Menino, onde eu chegava os adultos silenciavam. Depois de muito indagar, fiquei sabendo que o defunto exposto na sala e que servia de burburinhos havia prometido se enforcar no dia que broxasse. Pelo visto, cumprira a promessa.

Fico pensando com meus botões no dia em que entrarmos num boteco, pedirmos uma cerveja, e vermos no rótulo um fígado cirrótico. Ou entrarmos todo prosa num motel e encontrarmos a cama forrada com lençol bordado de doenças venéreas e a advertência de que transar sem camisinha faz mal à saúde.  

Deus do Céu, seu moço, me dá um maço de cigarro que causa câncer de pulmão!

Mas hoje é domingo, e quando eu era criança lá no arraial do Junco, o povo recitava parlenda para as crianças:

Hoje é domingo do pede cachimbo
O cachimbo é de ouro e dá no besouro
O besouro é valente e dá no tenente
O tenente é mofino e dá no menino
E o menino é chorão e arrasta a bunda no chão!

Para variar, sobrava para o menino. E eu, menino, não sabia o que era um tenente. Lá no Junco, cidade esquecida por Deus e pelos governantes, só havia um velho soldado, conhecido como “Quarenta”. Ganhou esse apelido por causa da sua mania de chamar polenta de “quarenta”. No início ele não gostou, achou ser um desrespeito à sua autoridade, mas quando viu que teria que prender toda a população, resolveu se fazer de mouco. O tempo foi passando, ele se acostumando até o dia que incorporou de vez o apelido ao nome e passou a se apresentar como “soldado Quarenta”.

O soldado Quarenta era o terceiro homem na hierarquia social do arraial do Junco. O primeiro era o motorista do ônibus. O segundo, o cobrador do ônibus. Mas como os dois primeiros só viviam viajando, o velho soldado era o bambambã da cidade. Desfilava garbosamente com sua farda rota, exibindo uma velha pistola de dois canos, chamada de “dois tiros e uma carreira”.

Um dia o rei do cangaço resolveu tomar a cidade de assalto. Reuniu a cabroeira na entrada da cidade para traçar um plano de invasão. Antes, porém, tinha que saber quantos soldados havia à sua espera. Capturaram um morador desavisado que passava na estrada.

– Tem quantos “macacos” na cidade? – perguntou Lampião, apertando a goela do junquês.
– Tem muitos não, meu capitão! – respondeu num fio de voz – Só tem Quarenta!

Lampião resolveu contar seus homens. Dezoito! Empurrou o “informante” para o lado, pegou seu embornal, colocou a espingarda em bandoleira e ordenou:

– Vamos embora que estamos em desvantagem numérica! Também, roubar pobre é pedir esmola pra dois!

E assim, quando o “informante” entrou na cidade contando o acontecido, só não foi ovacionado porque estava borrado e mijado e o mal cheiro recendia a léguas. E o soldado Quarenta foi enterrado como herói anônimo, anos depois, porque ninguém se lembrava mais do seu nome de batismo. 


sábado, 28 de abril de 2012

Luís Pimentel - Pixinguinha, pioneiro e agregador

Um dia, para traduzir uma emoção, uma situação ou um alumbramento, Gilberto Gil cantou assim: “Parecia um prelúdio bachiano, um frevo pernambucano, um choro de Pixinguinha...”. 

 Alfredo da Rocha Vianna Jr. (1897–1973), o Pixinguinha, é em tudo e por tudo um pioneiro. Por isso que o dia do seu nascimento, 23 de abril, foi transformado em Dia Nacional do Choro. Morreu dentro de uma igreja (após participar de um batizado), num dia 17 de fevereiro (será que foi durante o carnaval?) no que pode ser considerado também um desencarne verdadeiramente original e pioneiro. 

Um dos pioneiros da música brasileira, entre os primeiros a popularizar o sopro e o choro, é chamado por alguns de “pai da música brasileira”. Flautista virtuoso, agregador de talentos, maestro soberano antes de Tom ganhar o título, arranjador que já era moderno no início do século passado e compositor genial, Pixinguinha é o nome por trás e à frente de nossas emoções mais genuínas, mais brejeiras, mais carinhosas. Soube misturar, com humildade e elegância, a modernidade de Ernesto Nazareh, Chiquinha Gonzaga e Antônio Callado com os ritmos africanos, estilos europeus e a música negra americana – num lamento batuta, que atravessa gerações. Os maiores sucessos da chamada época de ouro da música popular brasileira tem arranjos, ou acompanhamentos, ou até mesmo inspiração de Pixinguinha.

Pioneiro em tudo, foi o primeiro maestro-arranjador contratado por uma gravadora no Brasil. Puxou o cordão da profissionalização do músico brasileiro, reuniu o que havia de melhor no regional Oito Batutas e foi pioneiro em sair pelo mundo, mostrando o que a Praça Onze, o Catumbi e a Rádio Nacional tinham. 

Todo músico brasileiro sabe. Todo amante da música sabe. Pixinguinha – antes de Noel, de Cartola, de Tom e de Chico – mostrou ao mundo que no samba, no maxixe, no lundu, no jongo ou no choro também somos muito bons de bola. 


quinta-feira, 26 de abril de 2012

Das coisas que não entendo e não encontro explicação

O Museu do Descobrimento do Brasil, na cidade de Belmonte, Portugal, conforme alguns vídeos, é coisa do primeiro mundo – só tinha que ser, né? Totalmente interativo, contém um erro histórico: o índio que recebeu Cabral usa roupa de tecido industrializado e o arco e flecha é de um primoroso acabamento a torno. 

No entroncamento da AL-101 com a cidade histórica de Marechal Deodoro e a paradisíaca Praia do Francês, o prefeito resolveu erguer um painel em tamanho natural representando o dia que Marechal Deodoro tirou o chapéu e gritou “Viva a República.” O tal painel foi feito em segredo, coberto por tapumes. No dia da inauguração, o prefeito, orgulhoso e sorridente, pôs abaixo os tapumes sob aplausos e hurras. Eis que o grito de um gaiato no meio da multidão pois limão no sorriso do prefeito e dos seus puxa-sacos: 

- Mas esse aí é Dom Pedro no Grito do Ipiranga! 


Na Salvador de ACM prefeito, ele contratou os serviços profissionais do escultor Mário Cravo para fazer um monumento à mulher baiana no pé do Elevador Lacerda. No dia da inauguração Mário Cravo anunciou orgulhosamente sua obra de arte como “a sensualidade da mulher baiana” e foi muito aplaudido pelos puxa-sacos de ACM. Os que não tinham o que fazer e foram ver a inauguração, juntamente com alguns bêbados do Mercado Modelo, só conseguiam enxergar dois pares de sacos escrotais em oposição. Um gaiato resolveu quebrar o clima de beija-mão de ACM: 

- Mas isso aí tá parecendo os culhões de ACM! 

E, durante décadas, o que valeu foi o grito do gaiato. 

Não sou especialista em arte, principalmente, pintura, mas tenho por mania ser escravo da linha do tempo. A foto acima é de um quadro de um famoso pintor lá pras bandas do chão de Graciliano Ramos, afixado na antiga estação de trem de Quebrangulo onde hoje funciona um restaurante, e retrata bem a falta de compromisso do artista em ser fiel ao espaço-tempo, principalmente quando se pinta de memória. 

O trem deixou de correr nos trilhos nos anos setenta, portanto, o pintor deveria tomar essa década como referência, mas maculou sua obra de arte ao colocar a logomarca dos Correios e Telégrafos criada em 1990. E mais: pôs um orelhão de telefone público na porta da agência postal, coisa inexistente na cidade à época das locomotivas. 

É como diz o ditado: de bunda de nenê, da caneta do juiz e da cabeça do artista a gente nunca sabe o que vai sair. 


quarta-feira, 25 de abril de 2012

Ibys Maceioh com Heródoto Barbeiro no Jornal da Record News

Grande momento de Ibys Maceioh com Heródoto Barbeiro na abertura e encerramento do Jornal da Record News no dia 09 de abril de 2012. 
Para ver em tela cheia, click nas setinhas.


segunda-feira, 23 de abril de 2012

Cineas Santos - Das coisas impossíveis

         Sempre que faz referência ao Salão do Livro do Piauí, o escritor Edmílson Caminha, citando autor que desconheço, afirma: “Se os meninos soubessem que era impossível, não teriam feito”. Exagero à parte, a sentença contém muita verdade. Quando, em 2003, os professores  Wellington Soares, Luiz Romero e Nilson Ferreira me propuseram participar do que, à época, me pareceu uma  aventura errante, fui taxativo: estou fora! Eu tinha as minhas razões. Durante cinco anos, a duras penas, realizei, praticamente sozinho, cinco edições do  Seminário Língua Viva, tarefa para Hércules nenhum botar defeito. Por minha conta e risco, eu convidava grandes autores (Celso Pedro Luft, Antônio Houaiss, Evanildo Bechara, Napoleão Mendes de Almeida, Celso Cunha, entre outros), alugava espaço, contratava som e, como um camelô, saía pelos colégios de Teresina tentando convencer os diretores das escolas a liberarem (na verdade, libertarem) os professores para que pudessem participar do evento. Colecionei toneladas de nãos. Eu estava farto daquilo.

    Os três mosqueteiros voltaram à carga e, desta feita, já me trouxeram um projeto formatado, muito embora nenhum deles tivesse a menor ideia do custo de um salão e, menos ainda, de onde sairiam os recursos para bancá-lo. A bem da verdade, nenhum de nós tinha qualquer experiência na realização de grandes eventos. Não bastasse isso, éramos (somos ainda) apenas um punhado de duros. Mas o Wellington é movido a desafios e acabou me arrastando para a empreitada. Assim, na primeira semana de julho de 2003, realizamos a primeira edição do SALIPI no velho Centro de Convenções de Teresina. De todas as dificuldades, a maior foi convencer os livreiros a participar. Com a colaboração de alguns  parceiros – Governo do Estado e Prefeitura de Teresina, desde a primeira hora – realizamos o que, aos olhos de muitos, parecia impossível: um grande e belo salão. Eu não teria a menor dúvida em afirmar que o SALIPI só se viabilizou porque os teresinenses adonaram-se dele. Aspiração antiga, o público compareceu em peso, obrigando os incrédulos a prestarem atenção nele. A mídia piauiense, por seu turno, acreditou no Salão e deu-lhe a necessária visibilidade.

    Ao longo desses anos, tivemos muitas decepções e grandes alegrias. Para mim, a maior delas foi receber de uma cidadã do povo um cofrinho de barro com um punhado de moedas e o pedido de desculpas: “O senhor me desculpe, mas espero que dê para pagar o almoço de um dos convidados”. Não deu porque aquele cofrinho continua fechado: tornou-se uma espécie de amuleto. Como um objeto sagrado, é inviolável.

    Aos trancos e barrancos, chegamos à 10ª edição do SALIPI, enfrentando as mesmas dificuldades  da primeira: excesso de problemas e escassez de recursos. Ainda assim, podem apostar que faremos o melhor que pudermos. O Salão já não nos pertence, o que significa dizer: já nem podemos pensar em desistir.

    Impossível saber aonde essa aventura vai dar, mas parece que até a grande mídia já descobriu que a SALIPI existe. Para mim, que ultimamente tenho participado pouco, ver milhares de crianças da periferia da cidade chegarem ao Salão, como gralhas felizes, já me diz que valeu a pena. O Poeta tem razão: “Tudo vale a pena/ se a alma não é pequena”. A nossa é do tamanho do universo.