Poema em forma de oração
Tom Torres Aos que se foram sem direito a despedida Aos que ficaram sem poder chorar seus mortos Aos que resistem porque não podem desistir. Procuro a fagulha cósmica em ecos desfeita para acender a galáxia nos trilhos ardentes e fazer brilhar a minha estrela cadente nas noites solitárias dos poetas mortos. Da memória ecoam vozes e gritos absortos dos que vieram e se foram em trens peregrinos, deixando marcas indiscretas de não sabido destino, marcas que escorrem como água entre os dedos. São lembranças provocando os nossos medos de não mais sabê-los nem podê-los encontrar na confluência entre céu, Terra, ressaca do mar, Ou na tapeçaria do Tempo tramando nosso degredo em viagem etérea em um rasante estelar.sexta-feira, 22 de agosto de 2025
HOMENAGEM A JUDÉLIO CARMO
Faz oitenta anos que nasceu o político que colocou Alagoinhas nos trilhos: Judélio Carmo.
Lançou-se na política ainda jovem, 1955, sob influência de amigos, pincipalmente de Edgard Torres, que o convenceu a se candidatar a vereador na eleição de 1956. No ano passado, nessa mesma data, tive o prazer de lançar o livro "Judélio Carmo, o semeador de utopia", também assinado por Luiz Eudes. O livro foi idealizado por Genival Dantas e teve a colaboração voluntária de Juracy Silva, na assessoria jurídica, e de Marco Antunes, na revisão da história política de Alagoinhas. Colaboraram, também, Belmiro Deusdete e Pedro Marcelino. TRIBUTO A JUDÉLIO CARMO Tom Torres Não vim ao mundo para lustrar egos de vaidosos, Nem cultivar o nós que nos cega e divide; Vim para construir os "eus" que transformam E despertam os íntimos sonhos adormecidos, Pois nem a Quimera com seu corpo incongruente Intimida a Utopia que nos cativa e que nos une. Não serei importante diante da legião de humildes, Nem humilde ante a arrogância tóxica dos importantes. Serei o farol dos que juntos constroem sonhos, Na certeza de que só a utopia nos cativa e nos une.sábado, 16 de novembro de 2024
Desode ao Natal
Vem aí o mês mais chato do ano.
Chato, quadrado e plano
Tal qual a Terra Prometida dos bolsominions.
As cidades viram um caos dentro do Caos
De papais-noéis brigando nas calçadas
A mercadores da alma de Cristo.
Luzes piscam nas janelas de candeeiros
Sob olhares famintos e barrigas furiosas:
A fúria da fome em ebulição.
- Moço, paga um café!
- Feliz Natal, meu amigo! O Menino Jesus há de lhe favorecer.
- Cristo nasceu! - canta um galo bêbado.
Bêbado e feliz, pois quem morre é o peru.
- Onde? Vai ter meladinha?
- Sei lá! Sou apenas um galo falante
E não um GPS cantante!
Pessoas se abraçam e cantam
Temporariamente esquecidas das rixas.
- Feliz ano novo!
- Tá bêbado? Ano novo é pra semana.
- Então vou ter mais uma semana sem lhe xingar?
- Infelizmente terei que lhe abraçar por mais um tempo.
E Nosso Senhor Jesus Cristo dos Crucificados
Que veio à Terra para nos salvar
Olha suas mãos cheias de cravos
E sente a cabeça cheia de espinhos.
Vai ao Pai e ao Espírito Santo cheio de dúvidas:
- Que fui fazer lá embaixo senão procurar sarna pra me coçar?
Expulsei mercadores da fé, persegui a tirania.
Pastores me usam como moeda de troca,
Ditadores usam Teu nome santo em vão.
- Sei não, Emanuel, Tu não sabes da minha agonia.
Decerto salvaste a Terra de algum mal,
Mas com certeza não foi da hipocrisia.
sábado, 20 de julho de 2024
Raimundo e a decisão da Copa do Mundo de Futebol
Um dia, antes dos bolsominions se apoderarem da camisa da CBF, fui ver um jogo da seleção brasileira na casa do meu irmão Raimundo, quando ele morava em Alagoinhas. Era a Copa do Mundo em um ano qualquer. Aconteceu do jogo ir pros pênaltis. Na hora da cobrança, ele se trancou no banheiro e gritou para sua cara-metade, que fazia as unhas no sofá da sala:
- E aí, já cobrou?
- Já.
- Foi gol?
- Foi.
- De quem?
- Sei lá! De um time aí. Acho que foi dos japoneses.
- Que japoneses?
- Sei lá! É tudo parecido!
- E agora, foi gol?
- Não.
- Como é que tá o placar?
- Tá lá no quarto.
- O que é que tá no quarto?
- A revista.
- Que revista?
- Placar.
- Quanto tá o resultado aí?
- Só esperando o Jornal Nacional.
- Por quê?
- O jogo já acabou.
Esse vídeo acima me fez lembrar desse dia.
sexta-feira, 19 de julho de 2024
De onde vem o baião
No São João passado, arrumei as malas para ir ver a grande performance de Eddy Luem no arraial joanino de Sátiro Dias, Bahia. Ele iria se apresentar antes de Flávio Leandro, o grande forrozeiro de Petrolina, encerrando os festejos juninos.
Conheci Eddy Luem em outra ocasião, no início do século
vinte e um, em uma noite de busca-pés e rojões, na mesma cidade acima. Ele era
integrante da banda “Os Filhos da Mãe”, e, além de ser o crooner, ele, também,
foi produtor.
Era por conta de um artista desse naipe que eu iria rodar
mais de um mil quilômetros para vê-lo. Devia um mimo a ele, pois, quando estive
em São Paulo, dois anos atrás, ele foi todo solícito e, inclusive, me levou
para passar uma manhã com o padre Júlio Lancelot, o qual ele é amigo e eu um
grande admirador. O caro leitor deve estar se indagando porque, no início deste
parágrafo, eu falo no futuro do pretérito, e não, no pretérito perfeito.
Lembremos, caros amigos, nem tudo é perfeito nesta vida. Ao arrumar as malas,
Eddy me ligou, perguntando se eu já estava na estrada. Aliás, ele não, a mulher
dele. Respondi que estava me preparando para viajar. Então ela me deu a
notícia-bomba:
- Tom, se você ia só ver o Eddy, desista. Ele não vai mais.
Está afônico e tiririca de febre.
Ainda bem que desarrumar mala é mais rápido do que arrumar.
quinta-feira, 11 de julho de 2024
Leva eu, minha saudade!
Em 1963 eu morava na roça e caí da jega do meu irmão, bati o cotovelo numa pedra e o meu braço direito dobrou. Não havia médico na cidade, só Zé Botica, o botiqueiro que se fazia de farmacêutico encanador de braço das crianças que caiam de jegue.
terça-feira, 25 de junho de 2024
O FORRÓ DE MANÉ VITO
Não me avisaram que havia um rio no meio do caminho. Embora soubesse nadar com destreza, desisti do meu intento. Nenhuma festa valia molhar meu sapato novo. Meus amigos me convenceram a tirar os sapatos e atravessar caminhando. O rio era só um córrego, mal batia água no joelho.
Fui.
O risca-faca estava animado ao som da sanfona e da zabumba. O noivo e a noiva dançavam alegres e satisfeitos. O padre bebericava uma dose de milome e até parecia casamento de verdade.
- É de verdade! - me disse um convidado.
- E meu amigo Eliseu resolveu se casar numa visgueira?
- É o único lugar que se pode dançar.
Puxei minha namorada pelo braço e fomos dançar o xote. Mal ensaiamos uns passos, fomos interrompidos por um senhor de bigode a la gaúcho. Em vez de três facas, portava um facão.
- Quero a vorta!
- Hein?
- A vorta!
- Mas eu não tenho volta nenhuma! Nem lhe conheço, cara!
- Então vamos poitá!
- Tá me achando com cara de viado! Eu sou Caçarola, irmão de Tombrega! Vá buscar mais facão que um só não dá não!
O falso gaúcho saiu furibundo, xingando até a minha décima quinta geração. O meu amigo, o noivo, se aproximou e esclareceu:
- Caçarola, se acalme. A volta é dançar com a sua parceira. E você dança com a dele. É costume daqui.
- E poitá? É fazer troca-troca?
- Não. Poitá é conversar na porta.
sexta-feira, 21 de junho de 2024
A maior invenção do mundo
Quando inventaram a roda, o homem das cavernas disse:
- Essa é a maior invenção do mundo!
Quando inventou a imprensa, Gutemberg disse:
- Essa é a maior invenção do mundo!
Quando decifrou o enigma do vapor levantando a tampa da panela, James Watt disse:
- Será a maior invenção do mundo!
Quando descobriu que o cinto do meu pai doía mais no meu lombo do que as chineladas, a minha mãe gritou eufórica:
- Este cinto é a maior invenção do mundo!
Hoje, passando o dia na rede curando as cicatrizes de infância e convalescendo da velhice, pego o controle remoto, ligo a tevê, e digo entusiasmado:
- Este, sim, é que é a maior invenção do mundo!
Mas, para me contrariar, logo em seguida à minha sábia frase, um vizinho de outro bloco escreve nas redes sociais:
- O mito é o político mais honesto do mundo!
Essa fala não estava no script e sou obrigado a refazer o meu tão belo enunciado. Deixo o sossego da minha rede cearense, vou até a janela e grito:
- Esse vizinho é o maior idiota do mundo!
sexta-feira, 31 de maio de 2024
Daniel foi ao brega comigo e perdeu o avião
Houve um tempo que o doutor José Décio Guedes foi morar umas décadas no Rio de Janeiro e São Paulo e, quando ia passar as férias em Alagoinhas, me botava de castigo até cantar Elton John de cor e salteado e com os olhos fechados. "Daniel" era a sua preferida. E se eu não obedecesse, o couro comia no lombo do aluno rebelde. Não por ele, claro, que é meu irmão mais novo e eu podia lhe dar uns cascudos, mas pela minha mãe que ficava ao seu lado, chinelo na mão, falando palavras incentivadoras:
- Ou obedece ao seu irmão ou o couro come!
E não saía de perto enquanto o professor não dissesse que era hora de parar. No final das férias, ele retornava para o Rio de Janeiro ou São Paulo e eu ia gastar o meu Inglês com as meninas do Alecrim, o brega de Alagoinhas, mas me sentia o próprio João Batista pregando no deserto: elas mal falavam o Português e então eu desaprendia tudo, para desespero da minha mãe, que, de tanto ouvir "Daniel is traveling tonight on a plane", ela aprendeu no grito e me botava para cantar na base da chinela, mas não na casa da Gabriela. O couro comia, o cacete descia, os cascudos rangiam, até ficar desplaneado do juízo. Quando meu irmão retornou nas férias, achou que meus grunhidos eram Grego. Então, pegou o disco de Demis Roussos e banda Aphrodite's Child e me botou para cantar Mary Jolie.
domingo, 12 de maio de 2024
Ai de mim, Copacabana!
Porque Copacabana vai além de sua calçada e do seu mar revolto. Eu, quando ainda menino besta do interior, conheci o calçadão na capa de um livro de crônica de Rubem Braga; gemi meus ais de mim, e ai de ti se não te conhecesse logo, Copacabana! Mas, entre a cidade e a roça, existia um oceano de distância.
Das aranhas que não se deve ver
A minha mãe nasceu mais para conselheira do que para ouvidora. Quando alguma amiga dizia ter medo de aranha, ela aconselhava:
Mãe das antigas
Uns velsos malamanhados que fiz para o dia das mães e acabei esquecendo por aí.
DIA DAS MÃES VIRTUAIS
Todo mundo homenageando as mães por aqui e elas, as mães, coitadas! a maioria não sabe nem o que é Facebook, WhatsApp ou Instagran! Algumas preparam um almoço especial, chamam os filhos, e eles respondem, com a bunda pregada na cadeira do computador: