quinta-feira, 6 de novembro de 2008

DE JOÃO DA CRUZ A BARACK OBAMA


No arraial do Junco primitivo o negro foi mero figurante na geografia sócio-cultural, sem nenhuma importância no desenvolvimento econômico. Ou seja, não houve o elemento negro na preparação da terra nem movimentando as engrenagens urbanas.
Dizem que João da Cruz quando apeou no sagrado solo junquês trazia um negro escravo na garupa. Só um. Sendo ele um simples vaqueiro, é difícil de se entender para que ele queria um escravo e como o mantinha sob o seu jugo no ir e vir da inospitalidade sertaneja. Seria ele um cavaleiro e o negro o seu fiel escudeiro ou andava na contramão da história quando a escravidão negra só era possível no litoral, nas casas grandes e senzalas, principalmente?
Quem assistiu ao filme “Narradores de Javé”, viu o quanto o povo puxa a brasa para a sua sardinha na hora de narrar os fatos históricos. Javé era uma cidade do tamanho do Junco, que ia ser inundada pela barragem. Disseram que, se a cidade tivesse um fato histórico, a inundação seria barrada. E a população tratou de escrever a história da cidade, cada um enaltecendo ao seu modo os feitos heróicos do fundador de Javé. Assim como os narradores de Javé, os narradores do Junco deram um negro escravo a João da Cruz para enaltecer sua qualidade econômica à luz da História.
Quando pesquisava para o livro “arraial do Junco”, alguns depoentes se orgulhavam de sua porção nobre d’além-mar, propositadamente esquecidos de que o nosso DNA branco se esvaíra ao longo das eras, diluído nos constantes cruzamentos do caboclo com o índio. Ou melhor: com a índia. Não se sabe de nenhuma cabocla se deitando com o índio. Estas, se casavam com os primos, gente de nome e sobrenome. Principalmente sobrenome. Quando não havia primo para se casar, fugiam na garupa do cavalo do primeiro curiboca que aparecia.
A nossa mestiçagem é fruto genuíno do cruzamento do branco com o índio, mais propriamente com a índia, e quando o negro pisou o solo junquês, este já estava com sua povoação devidamente constituída em sua linhagem genética e fortemente segregacionista em suas relações sócio-culturais. O Junco que recebeu bem alguns negros remediados, foi o mesmo que desdenhou de outros renegados da sorte. Havia o “Doutor Fulano” e o outro que era apenas “Negão”. Negão tinha nome, mas ninguém sabia ao certo. Para que nome se sua sina de escravo continuava? A bajulação ao primeiro vinha da afirmação racista “preto com alma branca” enquanto que o segundo era visto como negro de senzala.
Fujo do arraial do Junco para a corrida final de Fórmula 1, em São Paulo, no último domingo, onde todo mundo aplaudiu um branco, mas teve que se curvar reverente a um jovem negro que mostrou ao mundo a igualdade da cor. No meio da semana, outro negro entrou pela porta na frente nos anais da História ao eleger-se presidente dos Estados Unidos e, por extensão, Imperador Supremo do Resto do Mundo. Meu finado avô, que era extremamente racista, só não está a afligir-se no túmulo porque não sabe da real importância de um negro governar a América. Obama chega à Casa Branca levado pela mesma utopia que colocou Lula no Planalto, aliás, usando o mesmo mote de campanha que emocionou multidões: “sem medo de ser feliz”.
Dizem que a eleição de Obama será o resgate do sonho americano. O sonho dos doze Césares: a expansão imperialista. “Veni, vidi, vici!” Na mensagem enviada ao futuro inquilino da Casa Branca, o primeiro-ministro francês disse que o mundo necessita de um grande líder. Será Obama esse “grande líder” que satisfará a ânsia francesa? Vercingetórix, o druida e herói gaulês que se insurgiu contra a ocupação romana da Gália em 53 a.C., com certeza chorou de vergonha por ter se sacrificado por um povo que mais tarde sentiria falta de um imperador.
A minha avó já dizia que canja de galinha e precaução não faz mal a ninguém. A frustração pode ser grande e geral para os que habitam fora das divisas americanas. Cogitar-se que Barack Obama será um imperialista amigo do terceiro mundo só por causa de sua cor, é presumir que um papa afro-descendente tornará a Umbanda a religião oficial do Vaticano.
Alea jacta est.



domingo, 2 de novembro de 2008

O Jegue Barroso*

Foi, deveras, o jegue mais famoso de toda a história da região. Fama adquirida pela sua sanha devassa e insaciabilidade sexual. Ele sentia o cheiro da fêmea no cio a léguas de distância e não sossegava enquanto não consumasse seu intento. Pulava cerca de macambira, se rasgava no arame farpado e atacava jega devidamente montada, colocando o montador em risco de se machucar com as investidas vigorosas e insistentes do jumento. Não adiantava gritar, ameaçar ou bater. Seu instinto animal era mais forte que a dor.

Era um verdadeiro deus-nos-acuda quando surgia uma jega no cio. Ou um espetáculo para os moleques e devassos; uma vergonha para as moças de família.

- Deus nos acuda! - gritou o padre, interrompendo o cântico.

O Junco vivia um prenúncio de estiagem. O vento nordeste soprava seu hálito quente, seco, levantando redemoinho de poeira que vinha da Rua da Bomba até a Praça do Tamarindeiro. A água do Tanque Velho há muito que secara e o Tanque do Município, também chamado de Tanque Novo, fornecia suas últimas gotas. A seca rondava o sertão e os roceiros, apreensivos e angustiados, andavam em procissão, chapéu na mão, pedindo proteção ao Senhor. O padre puxava os cânticos, acompanhado por centenas de vozes graves e agudas. 

Avééé, avéé; avemariiiaa! – cantavam em louvor a Nossa Senhora do Amparo, já chegando próximo à escadaria da igreja, quando se ouviu um relincho, dois relinchos, três relinchos, tropel de jegue a galope descendo a Rua Maria Gouveia, e eis que surge uma jega em desabalada carreira em direção do povo, seguida do jegue Barroso, que tentava montá-la em desespero de causa, ocasionando um verdadeiro alvoroço entre os devotos. O padre, após pronunciar o apelo já citado acima, segurou a barra da batina e subiu as escadas em desespero, se enrolando no cordão batinal, se estatelando no chão. O povo, em pânico, se espremia na porta da igreja, cada um querendo a preferência e não entrando ninguém. O padre, recomposto da queda, excomungou o jegue e todos os seus ascendentes e descendentes. De quebra, amaldiçoou também o seu dono.

Uma hora depois os milicianos conseguiram demover o jegue Barroso de suas intenções libidinosas, afastando sua pretendente para bem longe. O dono do inditoso teve que arcar com o prejuízo de uma multa imposta pelo delegado e por uma penitência de cem pais-nossos e trezentas ave-marias. 

*Crônica baseada no cordel “O Jegue Barroso”, de José Pedreira da Cruz.
(Extraído do livro "Arraial do Junco: Crônica de Sua Existência)

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Por Um Pé de Feijão

Abrindo alas para o mestre.

Antônio Torres


Nunca mais haverá no mundo um ano tão bom. Pode até haver anos melhores, mas jamais será a mesma coisa. Parecia que a terra (á nossa terra, feinha, cheia de altos e baixos, esconsos, areia, pedregulho e massapê) estava explodindo em beleza. E nós todos acordávamos cantando, muito antes do sol raiar, passávamos o dia trabalhando e cantando e logo depois do pôr-do-sol desmaiávamos em qualquer canto e adormecíamos, contentes da vida.

Até me esqueci da escola, a coisa que mais gostava. Todos se esqueceram de tudo. Agora dava gosto trabalhar.

Os pés de milho
cresciam desembestados, lançavam pendões e espigas imensas. Os pés de feijão explodiam as vagens do nosso sustento, num abrir e fechar de olhos. Toda a plantação parecia nos compreender, parecia compartilhar de um destino comum, uma festa comum, feito gente. O mundo era verde. Que mais podíamos desejar?

E assim foi até a hora de arrancar o feijão e empilhá-lo numa seva tão grande que nós, os meninos, pensávamos que ia tocar nas nuvens. Nossos braços seriam bastantes para bater todo aquele feijão? Papai disse que só íamos ter trabalho daí a uma semana e aí é que ia ser o grande pagode. Era quando a gente ia bater o feijão e iria medi-lo, para saber o resultado exato de toda aquela bonança. Não faltou quem fizesse suas apostas: uns diziam que ia dar trinta sacos, outros achavam que era cinqüenta, outros falavam em oitenta.

No dia seguinte voltei para a escola
. Pelo caminho também fazia os meus cálculos. Para mim, todos estavam enganados. Ia ser cem sacos. Daí para mais. Era só o que eu pensava, enquanto explicava à professora por que havia faltado tanto tempo. Ela disse que assim eu ia perder o ano e eu lhe disse que foi assim que ganhei um ano. E quando deu meio-dia e a professora disse que podíamos ir, saí correndo. Corri até ficar com as tripas saindo pela boca, a língua parecendo que ia se arrastar pelo chão. Para quem vem da rua, há uma ladeira muito comprida e só no fim começa a cerca que separa o nosso pasto da estrada. E foi logo ali, bem no comecinho da cerca, que eu vi a maior desgraça do mundo: o feijão havia desaparecido. Em seu lugar, o que havia era uma nuvem preta, subindo do chão para o céu, como um arroto de Satanás na cara de Deus. Dentro da fumaça, uma língua de fogo devorava todo o nosso feijão.

Durante uma eternidade, só se falou nisso: que Deus põe e o diabo dispõe.

E eu vi os olhos da minha mãe ficarem muito esquisitos, vi minha mãe arrancando os cabelos com a mesma força com que antes havia arrancado os pés de feijão:

- Quem será que foi o desgraçado que fez uma coisa dessas? Que infeliz pode ter sido?

E vi os meninos conversarem só com os pensamentos e vi o sofrimento se enrugar na cara chamuscada do meu pai, ele que não dizia nada e de vez em quando levantava o chapéu e coçava a cabeça. E vi a cara de boi capado dos trabalhadores e minha mãe falando, falando, falando e eu achando que era melhor se ela calasse a boca.

À tardinha os meninos saíram para o terreiro e ficaram por ali mesmo, jogados, como uns pintos molhados. A voz da minha mãe continuava balançando as telhas do avarandado. Sentado em seu banco de sempre, meu pai era um mudo. Isso nos atormentava um bocado.

Fui o primeiro a ter coragem de ir até lá. Como a gente podia ver lá de cima, da porta da casa, não havia sobrado nada. Um vento leve soprava as cinzas e era tudo. Quando voltei, papai estava falando.

- Ainda temos um feijãozinho-de-corda no quintal das bananeiras, não temos? Ainda temos o quintal das bananeiras, não temos? Ainda temos o milho para quebrar, despalhar, bater e encher o paiol, não temos? Como se diz, Deus tira os anéis, mas deixa os dedos.

E disse mais:

- Agora não se pensa mais nisso, não se fala mais nisso. Acabou. Então eu pensei: O velho está certo.

Eu já sabia que quando as chuvas voltassem, lá estaria ele, plantando um novo pé de feijão.



domingo, 26 de outubro de 2008

J. GODOY, O RÁDIO-APRESENTADOR



J. Godoy é um conterrâneo, assim como muitos de nós, exilado de sua terra, sem a mínima perspectiva de retorno.
Fincou sua bandeira profissional em Ribeira do Pombal, cidade co-irmã do arraial do Junco, às margens da BR – 110, a um passo do Raso da Catarina, região muito utilizada por Lampião e seus cabras que encontraram na caatinga abrigo seguro para suas vidas fugidias. Foi perto de Pombal, na cidade de Santa Brígida, que Maria Bonita arrumou sua trouxa para seguir ao lado do maior cangaceiro da história.

Fui apresentado a ele pelo “hermano” Herval, outro junquês perdido nas lides soteropolitanas, em pleno bate-papo virtual. J. Godoy é apresentador de um programa romântico e podemos encontrá-lo quebrando o silêncio e a solidão noturna via ondas hertzianas ou cibernéticas, pelo site da Rádio Pombal FM. A tecnologia dos últimos tempos nos permite ouvir em tempo real as emissoras de rádio instaladas nos confins. E Pombal saiu à frente das outras rádios interioranas levando sua programação para todo o mundo. Graças a esse recurso tecnológico, passo as noites ouvindo a boa programação do nosso conterrâneo, como também, interagindo, ao solicitar pelo MSN as músicas que quero ouvir enquanto trabalho no meu micro. Ele, sempre solícito, além de colocar as músicas, ainda me saúda no ar, falando o local onde estou.

Não me lembro do nome do programa, mas vai ao ar de segunda à sexta-feira das 21 horas a uma da manhã. Pode-se ouvir pelo site http://www.pombalfm.com.br e interagir pelo MSN do nosso amigo, que deixarei aqui e sei que o mesmo não vai se opor, vez que, sendo ele um homem que trabalha com o público, vai se sentir honrado em tê-lo como ouvinte e, principalmente, participar da sua grade programática. Eis seu MSN: jgodoyfm@hotmail.com

Aproveite o programa do Godoy para enviar mensagens rápidas para seus amigos naquelas plagas ou em outras. Ou então combinem se encontrar no ar e compartilhar da programação, que, diga-se de passagem, é uma das melhores e o nosso amigo e conterrâneo está de parabéns pelo bom gosto.

Temos outro radialista da terra perdido na deselegância discreta de Sampa: Eddy Luem, também compositor e músico. Não sei qual a rádio que ele trabalha, nem horário, e pediria até que ele enviasse o endereço eletrônico caso a mesma tenha programação on line. Seu trabalho como artista da música pode ser visto no seu blog http://eddyluemshow.blogspot.com


Como a otimização e redução de custo das empresas de radiodifusão estão acabando com a profissão do apresentador, principalmente nas freqüências moduladas onde chamam de “adequação ao modernismo tecnológico”, poder ouvir a voz de um locutor ao vivo é viajar a um passado não longínquo onde interagir ao vivo via telefone, ou então enviar mensagens através de cartas, era muito mais que participar: era sentir-se prestigiado pelo apresentador.



sábado, 25 de outubro de 2008

PEQUENA CRÔNICA A AIMÊE

Aymêe não é coisa de Dona Deusinha. Quando ela veio ao mundo, a mãe disse a seu Totó para registrar “Aimée”, palavra francesa cujo significado refletia sua condição de caçula: amada. Vira esse nome no Almanaque e assim deveria ser, pois o leite estava escasseando e poria um ponto final nas estripulias do marido. Seria ela a caçula, a mais amada, a mais endeusada, a mais paparicada e querida pelas tias e ponto final. Mas seu Totó era um caboclo simples, não entendia dessas coisas de mãe, e pouca importância deu quando Maricas Coxeba grafou “Aymêe”, numa invencionice que nem Emília seria capaz de praticar no sítio de seu Lobato. Seu Totó ensaiou uma reclamação, mas Maricas Coxeba o convenceu de que com um ipisilone no meio ficava mais chique. Maricas Coxeba falando, quem haveria de contestar?
 
Dona Deusinha era amante das letras estrangeiras e isso obrigava o povo do Junco a falar Inglês, embora a contragosto, pela dificuldade natural em se lidar com letras aborígenes. Nada de Tonho, de Zé, de Mané. Muito menos Mundinha ou Zefa, tão fácil de se falar e escrever. Uma vez o jornalista Marcelo Torres escreveu sobre o culto ao estrangeirismo no arraial do Junco, porém fincou sua enxada vernacular apenas nos amigos, deixando de lado Dona Deusinha, a precursora do anglicismo e do galicismo. Talvez, por ser ele à época um menino ainda moço, ignorava as benesses de se ser um Wilton onde só existia Zé; uma Aymêe onde as mulheres atendiam por Maria.
 
Quando Dona Deusinha engravidava, havia uma expectativa sobre o nome. Ao cumprimentar o pai, a pergunta era inevitável:

– Que palavra inglesa haveremos de aprender a pronunciar dessa vez, compadre Totó?!
– Não vai ser inglesa não. Segundo Deusinha, dessa vez é francesa: Aydée.

Na precariedade educacional daqueles tempos, havia o caráter didático, o desafio ao desconhecido, o trava-língua. A professora Serafina só aprovava o aluno quando ele soletrava corretamente o nome de um, o mais difícil. Chamava o infeliz no canto e tascava:

– Soletre o nome do filho de compadre Totó! – ordenava, batendo levemente a palmatória na mão. Quando ela pegava naquele pedaço de madeira, respondesse certo ou então saísse de baixo.

– Ú-il-tê-ó-tó: Uilto! – disse o aluno, apavorado.
– Esse não... o outro!
– Ú-il-si-ó-só, Uilso!
– Tá me enrolando, seu moleque! O outro, o que mora fora!
– Aaaaahhhhhhhhhhhh! – exclamou triunfal o garoto – Tamém a sinhora num isprica. Esse é fáci: Vê-a-si-vá... agá-in -nê... gê-tê-ó-nê-ton... Uosto!



APENAS UM SIMPLES PRESENTE


Em uma de suas viagens a São Paulo, o meu primo-amigo, mais amigo do que primo, Luiz Eudes, me presenteou com três CD’s da mais fina nata do cancioneiro caipira: os imortais Tonico e Tinoco.

Ressoaram as trombetas da emoção ao ouvir essa afinadíssima dupla. “Casinha de palha / lá no ribeirão (...)” Nessa época, ou seja, no início dos anos sessenta do século passado, eu não sabia o que era um ribeirão. Lá em casa tinha um riacho. E Nininho, meu irmão mais velho, me disse:

– Ribeirão é um riacho grande, muito maior do que esse que a gente se banha todos os dias”.

Fiquei assustado em saber que existia um riacho maior do que o nosso. Não imaginava haver vida além da Ladeira Grande, onde o horizonte impunha limites à nossa visão.

Nos primórdios de minha infância fui bombardeado pelo dueto caipira em ondas de rádio captadas nas antenas da casa da roça. Os dois dominavam as ondas hertzianas do Brasil caboclo, alentando a alma do sertanejo em sua lida nas primeiras horas matinais. No virar da década sessentista, os meios de comunicação no arraial do Junco eram precaríssimos, quase inexistindo. Havia apenas um rádio valvulado, do finado Enoque, cujo funcionamento ficava à mercê de Zé Grosso, o destemido operador do motor de luz. Das 18 horas, quando era ligado o gerador, às 22, quando Zé Grosso dava o primeiro sinal de que a cidade iria mergulhar nas trevas, podíamos ouvir o som do rádio de Enoque, acalentando a nossa alma de música e de notícia das terras civilizadas. No primeiro acesso de loucura de Lindemberg, filho mais velho de Enoque, tocava no rádio a música “O que você foi / fazer no mato / Maria Chiquinha”. Ele se revoltou contra a traição de Maria Chiquinha, jogou o rádio no chão e saiu xingando todo mundo, em direção do bar de Chiquito. Aquilo estava errado, o Junco estava errado, o mundo estava errado, as mulheres (e o rádio de Enoque) não tinham conserto! No bar, mais um prejuízo: quebrou os tacos na mesa de sinuca e saiu correndo pelo meio da rua. Foi preciso mais de dez cabras fortes para dominá-lo, colocá-lo no Jeep da Prefeitura e levá-lo para tratamento médico especializado em Alagoinhas. Depois desse episódio, as noites do arraial do Junco ficaram silenciosas, até que um dia inventaram o transistor e o chamado rádio portátil. Ou de pilha.

Nilton era um rádio-técnico de muita competência na cidade de Serrinha. Foi ele o responsável pela introdução do rádio de pilha no Junco, principalmente nas roças. Rádio fabricado por ele mesmo. O ruim era o consumo excessivo de pilha, também chamada de “carga”, e nem todo mundo dispunha de capital para trocar as pilhas duas a três vezes na semana.

     Nininho, meu irmão, vendeu uma vaquinha para poder comprar um rádio de ondas médias e curtas ao técnico de Serrinha. O restante do dinheiro ele investiu em estoque de pilhas e em uma roupa nova para a festa da Padroeira. Comprou também uma brilhantina Glostora, que deixava o cabelo sempre úmido e brilhante. Forçou o penteado tipo maracanã, deixando a testa livre. Quando o cabelo fixou o penteado, a moda acabou. E Nininho nunca mais conseguiu o penteado original.

Tempos depois o meu tio Durval também comprou um rádio. ABC, a Voz de Ouro, dizia a propaganda. Ficava exposto na prateleira da sala da casa da roça e era exibido com orgulho pelo meu tio. Só ele podia mexer. Padrinho Adelino, meu avô, ganhou um de presente, trazido de Alagoinhas por um dos seus filhos, comerciante naquela cidade. Tonho de Maria de Lolô demorou, mas entrou na onda. Oleiro do meu tio Durval, pediu adiantamento de salário e comprou um, a Nilton, de Serrinha. Meu avô Lolô protestou contra o desperdício de dinheiro do seu genro. Contemporâneo de Antonio Conselheiro, ele achava que o rádio era invenção de Satanás.

Aconteceu uma coisa engraçada no pico da temperatura da febre de rádios transistorizados pelo povo da roça: um cidadão, no dia seguinte à compra, não conteve a curiosidade e partiu o rádio ao meio num só golpe de machado. Queria ver quem era o homem que cabia dentro daquela caixinha e falava com um corno, se explicou depois, envergonhado.

A rádio que mais se ouvia era a Rádio Emissora de Feira de Santana; o programa de maior audiência era o de Jota Luna, na parte da tarde, cujo prefixo musical era “Petite Fleur”, de Sidney Bechet, executada pelo delicioso sax de Chris Barber’s Jazz Band. No Ângelus, as mulheres rezavam “o terço” ao som da Ave Maria, de Gounot, tocada na Rádio Tupy de São Paulo. Infelizmente, para elas, as novelas só eram transmitidas pelas rádios de Salvador, cujas ondas médias não chegavam lá. Somente a Rádio Cultura de Feira de Santana transmitia em ondas curtas.

O meu irmão Nininho, embora nosso pai acordasse a gente muito cedo, só dormia depois das dez horas da noite, após sintonizar a Rádio Nacional de São Paulo e ouvir Tonico e Tinoco cantar. Às quatro da manhã, depois de rezar a Ladainha de Nossa Senhora, ele corria para o rádio, sintonizava a Rádio Tupy de São Paulo para ouvir... Tonico e Tinoco. De vez em quando outros apareciam para cantar, mas a tônica eram os dois irmãos. Quem viveu aquela época e não se emocionou com os sucessos “Tristeza do Jeca”, “Brasil Caboclo”, “Chico Mineiro” e “Gondoleiro do Amor”, música em arranjo de valsa sobre poema de Castro Alves.

"Teus olhos são negros, negros
Como a noite sem luar
São ardentes, são profundos
Como o negrume do mar
Sobre o amargor dos amores
Da vida boiando a flor
Moram teus olhos na fronte
Do gondoleiro do amor.”

     Retorno ao tempo presente. Apenas três minúsculos disquinhos tiveram o poder de aguçar as minhas emoções e aflorar as lembranças adormecidas na grande distância física, geográfica e temporal. Um simples presente de um amigo teve o dom de me fazer mergulhar no passado e recuperar uma história relegada à amnésia do Tempo. Isso me fez evocar os neurônios e descobrir que somos uma geração sem memória e sem história. Não preservamos nada do nosso passado e nossos descendentes terão apenas uma interrogação como elo de ligação entre eles e seus precursores. Que história nossos filhos terão para contar aos seus filhos? Que monumento ou memorial mostrarão aos seus netos? Nem escombros eles terão para soterrar suas amarguras e chorar sua dor de terem sido gerados in vitro. Sem passado, o ser humano é herdeiro apenas de uma proveta. Seria ótimo se os nossos políticos colocassem em seus planos de governo a intenção de resgatar e de preservar a nossa história. E a executassem em sua integralidade.

A História agradeceria.

Publicado no jornal “Gazeta Voz Ativa”


sexta-feira, 24 de outubro de 2008

- Vai Ter Rebu no Mangue



Ao indeferir a liminar que pedia a anulação das eleições indiretas no arraial do Junco, o juiz de Olindina jogou um caminhão de água gelada na relação incestuosa da Prefeitura com os fornecedores durante o período eleitoral, onde se escancarou acintosamente a corrupção e o apadrinhamento político.

Zé Martins deverá ter noites e noites de insônia. E pesadelos, quando conseguir abraçar Morfeu. Como vai se safar dessa? deve se indagar incessantemente. Muita gente vendeu no crediário confiando na vitória de Antonio ou que a Prefeitura fosse honrar a dívida, ainda que escusa, nos poucos meses que faltam para o término do exercício atual. Muitos também fizeram “pindura” achando que continuariam a receber da viúva sem dar um prego na barra de sabão. Outros se candidataram, se comprometeram, (ou melhor: comprometeram o dinheiro da viúva) e agora estão com a corda no pescoço. Essa liminar era a última esperança que agora morre deixando centenas de órfãos em rios de lágrimas.

A população do arraial do Junco é composta, em sua maioria, de gente decente e por isso somente os filhotinhos de marajás estão a reclamar. Ou aqueles que, de uma forma ou de outra, se locupletavam com o manequim de prefeito. Até entrar na Justiça os comissionados comem quietos entraram, pensando legitimar a ilegalidade praticada no apagar das luzes do governo Martins. Quebraram a cara. Cara de pau, diga-se de passagem. Ganhavam sem trabalhar e ainda queriam continuar mamando.

Mas a imoralidade não pára por aí. Os concursados da Prefeitura, eleitores declarados de Antonio, recebiam gratificação para fazer extra com politicagem ou ameaçar os contrários. Diziam-se os salvadores da pátria enquanto metiam a mão na cumbuca. Mas, de uma canetada só, Givaldo acabou a farra das gratificações, algumas até poderiam ser justas e merecidas, mas, estranhamente, só as tinha quem votava no candidato do prefeito. E agora o que não falta é gente chorando pelos cantos, blasfemando contra a democracia e maldizendo os eleitores do velho e sofrido arraial do Junco que votaram contra esse estado de coisa.

Não havendo mais como sangrar os cofres públicos, com certeza hoje vai ter rebu no mangue.




E Agora, José?

E agora, José? A festa acabou, seus amigos estão abandonando o barco feito ratos de porão e só vão deixar a sujeira pra você se lambuzar. Seu prazo de defesa no TCM está se expirando e com você fora da Prefeitura alguém vai ter interesse em livrar seu pescoço? Acho que não, José, porque é longa a fila daqueles que lhe abraçavam e hoje pedem guarida a Joaquim. Gente que você confiou, José, e até caiu no ridículo por causa de alguns, estão bebendo no cálice do Judas.

Tenho pena de você, José, pois acredito na sua honestidade. Um pacato cidadão simples, vindo da roça, se meteu como um besta na alcatéia servindo de Chapeuzinho Vermelho. Todas as fábulas de lobos e cordeiros, José, são poucas diante do seu drama. Confiou demais e não viu que estava sendo o boi de piranha, o inocente útil da vez, o amigo com prazo de validade. Colocaram-no como prefeito, José, porque sabiam que era fácil lhe embromar. E dominar. E você, José, tão inocente e besta, acreditou na sinceridade humana e não viu quantos Judas lhe beijavam.

Aprenda, José, que triste dos sabidos se não fossem os otários. Pessoas que acordam e dormem calculando o quanto de lucro podem tirar de uma amizade. E o seu drama está só começando, José. Outros processos virão e os verdadeiros culpados dirão em alto e bom som: "Não tenho nada com isso!" Foi assim que fizeram com Joaquim. Foi assim que fizeram com Márcio. E é assim que vão fazer com você, José. Só que Márcio e Joaquim são velhas raposas também e nunca perderam o controle da situação. Eles traziam seus auxiliares em rédea curta. Por isso se safaram, José. Joaquim, que foi acusado de ladrão pelo seu grupo, vai sair desse processo mais honesto do que o Papa. No máximo, uma multa por atraso de documento. Mas você não, José. Os ratos fizeram a festa e tentam embromar o TCM com redação "confusa", conforme o próprio Tribunal.

Você está perdido, José. Sem poder, sem amigos, sem o devido saber, futuramente virará notícia de jornal com o gosto de sangue que os jornalistas têm em denunciar os condenados por desvio de verba pública. Ficará famoso, José, embora nada honroso com a matéria.

Acredite, José. Seu inferno astral está só começando. Afora a família, ninguém mais lhe dará guarida, pois o poder é efêmero. Sabe aquela história de “rei morto, rei posto”? Pois vai ser assim com você, José. Sem cargo, sem vereança, todos lhe virarão as costas quando passar e os próprios corruptos que lhe colocaram nessa sinuca de bico serão os primeiros a lhe apontar o dedo acusatório. Foi assim que fizeram com Joaquim, José. Só que, Joaquim, foi eleito pelo povo e conservou aliados políticos. Você não. Você caiu de pára-quedas para servir aos interesses de alguns. Só isso.

Portanto, José, afora eu que, com minha alma de poeta acredito na inocência dos humildes, ninguém mais irá mover um dedo em sua defesa. Acredite, assim como dois e dois são quatro.

Boa sorte, José.
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Respondendo a Jânio Sobre o Apartheid

Jânio escreveu na comunidade “Sátiro Dias Sem Censura”, do Orkut:

“Durante o processo de colonização da África do Sul,as autoridades inglesas adotaram uma política de isolamento,socialmente conhecido pelo nome de "APARTHEID".O Apartheid previa uma série de leis que visavam impedir que os indivíduos considerados NEGROS tivessem algum tipo de contato com qualquer pessoa de tendência européia.Será que existe o Apartheid em Sátiro, de forma diferente?(STATUS SOCIAL)”

O arraial do Junco, como todo o interior brasileiro, não teve a presença do negro escravo como elemento determinante na sua povoação. Os que existiam no interior, eram escravos fujões dos senhores de engenho ou foragidos da Justiça.
Quando João da Cruz apeou na Fazenda Junco de Fora, viera mais como empregado dos de Inhambupe do que propriamente como um senhor de escravos. Depois, cooptado pela política, seu patrão abandonou o interior e assentou residência em Salvador, vendendo a preço de banana seu latifúndio, que também não lhe custara nada, por ter sido presente do Visconde da Torre, em agradecimento pela oposição que os de Inhambupe faziam ao ilustre primo Barão de Geremoabo (as terras do arraial do Junco eram sesmarias dos Garcia d’Ávila, também responsáveis pela fundação de Inhambupe – o coronel Guilherme d’Ávila, por volta da invasão holandesa).

Quando começou a povoação, a escravidão definhava e mesmo assim não havia o negro que merecesse registro como fator de miscigenação racial ou até mesmo estabelecesse um padrão de comportamento sócio-cultural que merecesse destaque no Junco primitivo. Sendo uma cidade genuinamente de pequenos agricultores ou pequenos comerciantes, todos ligados por laços consangüíneos, sem qualquer referência de lixo ou de luxo social, viviam a irmandade comum aos pioneiros até que um dia Deus disse:

– Faça-se a política!

Ioiô Cardoso e Piroca Reis, primos e cunhados, marcharam juntos empunhando a bandeira libertária do jugo de Inhambupe e essa harmonia durou até a segunda eleição, quando Piroca Reis resolveu testar sua popularidade como candidato a prefeito e até hoje o pequeno arraial do Junco vive dividido entre os santos e os pecadores. Em pleno século 21 o padre ainda dá pitacos e arma conchavos a favor ou contra, a depender dos acordos de sacristia ou de quanto pese a cestinha de óbolos durante a gestão, gerando o apartheid religioso, onde a preferência política é a questão primordial para definir quem vai queimar no fogo do Inferno ou quem vai desfrutar de um lugar no Paraíso.

Na festa de dois de fevereiro dos meus tempos havia o apartheid econômico, mais uma vez promovido pelo padre, que cercava de galhos de pindoba e coqueiro um pedaço da Praça e cobrava caro a entrada de quem quisesse participar dos leilões, quermesses e outras atrações naquele espaço chamado de “feira-chic”. Havendo dinheiro para se pagar a entrada, lá dentro a convivência era harmônica, sem entraves sociais, a não ser uma ou outra desocupada que ficava olhando a roupa das pessoas. Nesse caso não se pode dizer que havia segregação social nem racial, pois, uma vez lá dentro, todo mundo era azul.

A estrela da festa era a soprano Maria de Venâncio, que deixava todos embasbacados com a maviosidade aguda da sua voz. Sendo Maria de Venâncio uma negra e convivendo socialmente com todos durante todo o ano, além da admiração que impunha, não se pode dizer que havia segregação racial.

Apartheid é uma palavra muito forte, por se tratar de uma questão de Estado racista, talvez inadequada para expressar a intolerância nossa de cada dia. Claro que, com o rompimento da barreira arcaica, o arraial do Junco construiu sua pirâmide social com todas as mazelas de uma sociedade capitalista, principalmente a concentração de renda. E, onde há dinheiro, há a segregação social, por mais que se queira provar o contrário.



UMA (JUSTA) HOMENAGEM AOS ESQUECIDOS

Lindenberg, antes de ficar doido, era um cidadão importante e nunca faltaram elogios aos seus conhecimentos. Se bem que, naquela época, o Junco dormia à luz de candeeiro e acordava com a buzina do ônibus de Zé do Padre chamando o povo para uma viagem além da Ladeira Grande. Lindenberg era, por assim dizer, um mata-mosquito da SUCAM, em Alagoinhas, e todos os fins de semana gastava o talco da sinuca de Chiquito, contando as novidades das civilizações.

Dedê, embora ninguém desconfiasse, era um cidadão importante em outras plagas. Se bem que, naquela época, o Junco mantinha encasulado os seus ilustres cronistas, escritores, poetas e artistas. Dedê era um free lance do jornalismo, um dublê de don juan – se não o próprio. Era um bon vivant, um especialista em belas mulheres.

Humberto Vieira era famoso, muito embora, naquele tempo, o Junco não desfrutasse de antenas de tevê para ver os créditos de um junquês no jornalismo da Globo. Foi longe e morreu perto, sem que ninguém lhe rendesse uma última homenagem na capela do Campo Santo.

Jaldas foi um herói. Embora ninguém soubesse, salvou muitas vidas, levando o povo para atendimento médico em Alagoinhas e Salvador. Naquele tempo o Junco não conhecia sequer um atendente de enfermagem e os doentes se serviam da velha Rural Wyllis da Prefeitura, que era improvisada como ambulância. E Jaldas, chovesse ou fizesse sol, de dia ou de noite, nunca fez cara feia para enfrentar o cascalho em caso de necessidade. O mesmo digo de Wilson, nos tempos em que ele era motorista da prefeitura.

Lindenberg, Dedê, Humberto, Jaldas, Wilson, famosos anônimos e mais uma miríade de heróis desconhecidos, sem que o Junco de hoje nada seria sem a humilde e decisiva participação deles. Cito alguns, como os sermões do padre Edson que decidiam eleições, a voz de barítono de Maria de Venâncio que emoldurava as missas solenes, o querosene da venda de Nelo, o qual sem ele as noites não teriam luz; o “pindura” na venda de Luiz de Roxinho, que era pago de safra em safra e o pão gostoso da padaria de Josias Cardoso. Quem se lembra da picareta de Negão cavando valetas debaixo de um sol escaldante para levar água encanada às casas das boas famílias? Negão era tão útil e ao mesmo tempo tão anônimo que ninguém sabia o seu nome. Era, simplesmente, “Negão”.

Que roceiro sobreviveria sem os préstimos do fole de Ozinho e de Bidô? E Zé da Perninha, conhecido também como Zé da Butica, uma mistura charlatânica de farmacéutico, enfermeiro, parteiro e médico. Quem haverá de negá-lo?

Cultuemos, pois, nossos heróis de hoje, sem, no entanto, esquecermos dos nossos heróis de outrora. No presente caso, não vale parodiar a máxima: “Herói morto, herói posto”. O presente estará sempre fincado sobre os alicerces do passado. E ninguém poderá mudar tal ordem.
Publicado no jornal “Gazeta Voz Ativa”.



1 NOSSA CRUZ DE TODO DIA


I

De braços abertos eu te protejo

E te abraço em férreos braços...

Purifico-te em banhos de cheiro.

Cheiro de alecrim, cheiro de açucena,

E afasto o perigo com o espinho do calumbi.

Estarei sempre alerta a te proteger

Como a mãe protege o seu rebento;

E lúcido para te guiar pelos labirintos do mundo

Como se fosse a mão de Deus

Conduzindo invisível Seus filhos desgarrados.


Quando te sentires forte o suficiente

Para guiar teus próprios passos

Por este mudo errante,

Uma vez partido e decidido teu destino,

Peço-te que não radicalizes

Como o Tempo que anda sem olhar para trás

E sem esperar por ninguém...

Não tenhas mágoas do teu passado,

Pois ele será sempre o teu presente

E estará presente aonde quer que vás.


E se um dia,

A solidão diáfana te abraçar

E não mais saberes por onde seguir,

Peço-te que voltes, mesmo trôpego,

Trazendo na mala uma medida do Bonfim

E amarre-a no meu corpo para ti desnudado,

Antes de te ajoelhar e de te benzer,

Antes mesmo de depositar os teus presentes

No meu carcomido pé;

Depois me abrace, me afague,

Possua-me como se eu fosse tua última amante

Ao qual darias o teu último beijo.


Talvez assim

A minha solidão contundente

Não mais me ferirá

Como te feriu um dia

O espinho do calumbi.